Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente
correto.
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Lembras-te dos “Vampiros” de Zeca Afonso? Rezava assim: “No céu cinzento sob o astro mudo, batendo as asas pela noite calada, vêm em bandos, com pés veludo, chupar o sangue fresco da manada. Eles comem tudo, eles comem tudo… eles comem tudo e não deixam nada… eles comem tudo, eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada. Se alguém se engana, com seu ar sisudo, e lhes franqueia as portas à chegada, eles comem tudo, eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada… eles comem tudo, eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada…”
A letra continua, minha querida amiga, mas o sentido, até ao final, não muda, apenas se agrava. É o que eu sinto com algumas das nossas instituições e com certas empresas de prestação de serviços e bens essenciais. Vêm, “com pés de veludo” prometendo defender o consumidor final, os utentes que deveriam servir e ajudar, mas é tudo uma grande farsa, pois, podendo, “eles comem tudo, eles comem tudo… eles comem tudo e não deixam nada”.
A imprensa escrita avançou ontem que a EDP foi condenada a pagar três milhões de euros a cinco câmaras, pelo uso dos postes de eletricidade, utilizados para permitir a passagem de cabos de comunicações, cuja propriedade é autárquica. Assim sendo, de acordo com os contratos, a EDP está obrigada a obter autorização das autarquias.
Ainda de acordo com esta contratação entre o poder autárquico e a EDP, esta é obrigada a negociar repartição de receitas, quando as infraestruturas são usadas para outros fins que não os da concessão inicial, ou seja, a distribuição de eletricidade em baixa tensão.
O que está em causa é a concessão de infraestruturas camarárias, com os tribunais a reconhecerem a obrigação da EDP repartir receitas provenientes do uso de postes de eletricidade, para passagem de cabos, por terceiros. Até porque, diga-se em boa verdade, a EDP cobra-se bem pela permissão do uso dos postes por parte das empresas de comunicações.
Desde dois mil e quinze já houve cinco condenações, com decisões de indeminizações ás Câmaras de Santo Tirso, Alcácer do Sal, Oliveira de Azeméis e Santa Maria da Feira e Gaia. Contudo, o número tende a aumentar substancialmente e os pagamentos poderão, com relativa facilidade, ultrapassar os cinquenta milhões de euros, numa primeira fase.
Porém, a EDP tem vindo a recorrer e a perder os casos, confirmando-se as condenações proferidas. Plena de “chico-espertismo” a elétrica argumenta que é obrigada, por lei, a ceder as infraestruturas às empresas de telecomunicações e que as receitas arrecadadas se destinam a compensá-la pela construção e manutenção dos equipamentos, como se (coitadinha da EDP) ela não tivesse sempre de o fazer.
A incompreendida fornecedora de energia elétrica defende ainda que os valores são abatidos aos custos de exploração das redes e que os benefícios revertem a favor dos consumidores. Uma ação tão benemérita que eu te pergunto, querida Berta, quantas vezes viste tu o teu custo da mensalidade de eletricidade baixar por força do altruísmo da EDP?
Em resumo, a EDP aluga, às escondidas e sem negociar com as autarquias, conforme a lei obriga, a passagem dos cabos ás empresas de comunicação pelos postes das câmaras, de uma forma totalmente ilegal, roubando o poder autárquico e depois vai para tribunal armar-se em vítima de injustiça, arrastando as decisões com todos os recursos que os gabinetes jurídicos, ao seu serviço, lhe conseguem arranjar, sem a mínima preocupação de honra, deontologia ou brio profissional próprios de uma empresa séria.
Esta atitude era igual a eu arrendar um casarão enorme para minha habitação, esquecer que o contrato com o senhorio me obriga a avisá-lo de qualquer outro fim que eu dê ao imóvel, e alugar ao dia, quarto a quarto, a turistas, todos os quartos e salas da habitação, ocultando os factos, não pedindo autorização e, ainda por cima, não pagando qualquer montante por isso ao verdadeiro proprietário. Porém, ao ser descoberto, em vez de reconhecer o erro, argumentar que a limpeza da mansão me fica muito cara e que a vítima sou eu, coitadinho de mim…
Haja paciência. Não restam dúvidas, minha querida Berta, que a justiça tem de arranjar um procedimento mais célere e sumário na resolução deste tipo de esquemas. Antigamente nós tomávamos este tipo de companhias e grandes empresas como gente de bem. Ora isso é, cada vez mais, algo que pertence ao passado. No caso da EDP, aqui em foco, a única parte a quem hoje se exige que seja “de bem” é ao consumidor final.
Não fosse a EDP ter o poder de me cortar o fornecimento de energia, dava vontade de gritar, como naquela velha canção da banda dos “Trabalhadores do Comércio”: “Chamem a polícia, que eu não pago!” Por hoje é tudo querida Berta, recebe um grande abraço e um beijo de despedida, deste teu velho amigo,
Sei que ainda esta manhã te escrevi uma carta, minha querida amiga, mas o que li hoje nas notícias, nos jornais online, não podia ficar por comentar. É deveras deprimente viver num país onde o tratamento de um assunto tão sério ainda não tem a devida atenção, por parte das autoridades nacionais e, principalmente, do lado dos poderes legislativos e judiciais.
Desta vez, pela trigésima sexta, em 2019, foi um pai de 68 anos que, alegadamente, matou por negligência doméstica, uma filha de 43 anos e feriu o genro, enquanto limpava uma caçadeira.
Estava o ano quase a terminar e o patriarca queria celebrar a entrada do novo ano a tiros de arma de caça. A negligência, verdadeira ou não, causando uma morte e um ferido, não deixa de ser violência doméstica. Afinal, esta situação não pode ser tratada, certamente, como uma comemoração familiar, lá porque a arma iria, supostamente, servir para festejar a chegada do ano novo.
Ainda por cima porque, a ser verdade que a arma se disparou por descuido, não faz sentido que o homem se tivesse posto em fuga, tendo no seu encalço a GNR local e depois a polícia judiciária. Todavia, mesmo que essa tese, defendida por outros familiares, prove ser a que realmente aconteceu, o descuido não foge do âmbito violento, ocorrido em casa.
O que me leva a concluir que os factos nunca deixarão de ser, por isso, um crime de homicídio doméstico, seja ele negligente ou não.
No meu entender, embora não seja um especialista da matéria, o trigésimo sexto de violência doméstica que provocou a morte de um familiar, em 2019, neste caso em sede de um acampamento permanente onde toda a família residia.
A morte ocorreu na zona de Ovar, a poucas horas da mudança de ano e pintou de negro a tragédia de um ano em que 3 vezes por mês, alguém é morto no seio do lar por um familiar. Ora, quando a grande maioria das vítimas são mulheres, é caso para nos levar a pensar que soluções urgentes e imediatas devem ser tomadas, porque é preciso pôr termo a esta carnificina sem sentido algum.
Se em 2016 os homicídios registados no âmbito familiar foram 4, mais um que os registados em 2015 e 2014, em 2017 esses números dispararam, passando para 20, em 2018 chegaram aos 28 e por fim em 2019, os homicídios por violência fecharam o ano nos 36, ou seja, 9 vezes mais do que há 3 anos atrás.
Quando uma taxa qualquer sobe 900 por cento em apenas 3 anos, seja ela que taxa for, algo não vai bem no reino ou na república. Mais grave ainda é quando essa percentagem refere a subida de um crime perfeitamente identificado.
Será que sou só eu que considera um absurdo a subida de 1200 por cento dos crimes de homicídio, no âmbito da violência doméstica, em 5 anos? É que saltar de 3 mortes, neste setor, em 2014 e 2015 para 36 em 2019 é precisamente o que aconteceu. Uma vergonha sem nomenclatura digna para a descrever.
Nos últimos 29 anos foram registados em Portugal quase 400 mil crimes de violência doméstica, com um crescimento anual médio superior a 19 por cento ao ano. Um facto, de tal forma assustador, que ameaça tornar este país, dito de brandos costumes, numa verdadeira casa (ou república, melhor dizendo) de horrores. Basta pensar que se estes casos fossem pessoas, e se essas pessoas constituíssem um partido, que fossem a votos nas legislativas portuguesas, ganhariam 10 lugares no atual parlamento.
No cerne de toda esta problemática estão, sem qualquer margem para dúvidas, digo eu que alegadamente me acho cheio de razão, minha querida, as sentenças amigáveis e permissivas dos juízes deste país. Quanto a mim, o conhecimento por parte da população deste tipo de julgamentos, das respetivas penas e do péssimo tratamento dos juízes perante as vítimas, gerou uma espécie de república das bananas, no que ao aparente desculpar dos culpados diz respeito, ou seja, toda o mundo tem a sensação de que existe uma impunidade generalizada no setor. É como se o próprio Estado estivesse de acordo com este status quo.
Ora, amiga Berta, isto é de todo inadmissível. Se eu tivesse 16 anos e Greta fosse o meu nome, formava um movimento contra o femicídio. Sim, porque para além das 31 mulheres mortas (dos 36 homicídios de violência doméstica), este ano que passou, houve outras tantas que escaparam a este fim, tendo os presumíveis culpados sido acusados de tentativa de homicídio.
Espero sinceramente que este 2020 seja o ano da mudança. É preciso parar, estancar e acabar de vez com este flagelo que assombra a nossa sociedade.
Despeço-me saudoso com mais um beijo de esperança, deste teu amigo de todos os dias,
Não sei se tens acompanhado as últimas notícias e alertas da Quercus, lançadas através da plataforma SOS Amianto, que esta ONG (Organização Não Governamental) lançou. A última é datada de ontem. Se te passou ao lado não me espanto, eu também só dei dela por mero acaso. Como sabes sou jornalista e assino algumas “newsletters” que considero importantes para a minha atividade. Numa delas vinha, com algum destaque, uma notícia que, mais que uma informação, é um alerta.
É assim, 14 anos depois da proibição na União Europeia, e consequentemente em Portugal, da utilização de materiais contendo amianto, seja na construção civil, seja noutro qualquer tipo de produtos, o nosso país continua a importar amianto, sendo que nos últimos 4 anos deve ter importado qualquer coisa como 150 mil toneladas, embora apenas sejam oficiais as 53,3 mil toneladas, relativas aos anos de 2016 e 2017, mas basta extrapolar os números para os anos seguintes para lá chegarmos.
Podes estar curiosa e querer saber porque é que fazemos essa importação, se depois não podemos usar o produto. Ora, o português, como sabes, é muito inventivo. Assim, como não pode dar uso ao amianto, estamos a ser pagos para receber resíduos altamente contaminados, à tonelada, contendo essa bosta. Vai tudo para aterros, contaminando solos, lençóis freáticos, terrenos vizinhos, muito dos quais agrícolas. Para não falar que o amianto contido em resíduos se liberta facilmente na atmosfera e, conforme os ventos, pode contaminar áreas até mil vezes superiores à dos próprios aterros.
Fiquei igualmente a saber que, no nosso país à beira mar plantado, morrem de cancro provocado única e exclusivamente pelo amianto 40 pessoas por mês, ou seja, mais de uma pessoa por dia, 365 dias por ano. Número que pode ser 4 ou 5 vezes superior se lhe somarmos as mortes, nas quais não houve investigação sobre a origem do cancro ou essa origem não foi apensa aos óbitos. Ora, se assim for, morreram, alegadamente, 4 ou 5 pessoas, por dia, devido a esta causa ou até o dobro disso, o que significa que o amianto deve matar, em média, em Portugal, mais do que o tabaco e, que o álcool a cada ano que passa, embora o Estado não o apresente como número oficial, porque, tal como todos nós, o desconhece.
A somar à gravidade das doenças e mortes provocadas pelo amianto há ainda que referir os sintomas. Algo de dantesco acontece com as vítimas, principalmente nas contaminações cancerígenas da pleura e pulmão. Cada ato de respirar assemelha-se a uma facada dada a cada par de segundos e os órgãos vão ficando como que petríficados sendo cada vez mais difícil respirar. O horror das dores é tão mau que só vendo dá para acreditar. Contudo, o que eu considero mais injusto é que pode levar até 40 anos a manifestação de um cancro provocado por contaminação de amianto. Um tempo em que ligar a doença e a morte à origem da sua causa se torna dificílimo, amortizando os números de óbitos atribuídos a este produto, escondendo a horrorosa realidade.
Para além de tudo isso, é grave a quantidade de edifícios públicos que possuem coberturas de amianto. O número ultrapassava, nos primeiros estudos de levantamento da situação, em muito, os 4 mil, nem chegando ainda aos mil os que já foram intervencionados. Aqui se incluem escolas, hospitais, tribunais, e outros ais de todos os tipos de serviços do Estado. Quanto à quantidade de edificação privada, que possui coberturas de amianto, o valor multiplica-se por várias vezes e o seu cálculo está por efetuar.
Porém, não foi somente nas coberturas que o produto foi usado, sendo que, na construção civil, pode ser encontrado ainda em canalizações, pavimentos, tetos falsos, impermeabilizações, divisões pré-fabricadas, portas de coretes e portas corta-fogo, isolamentos térmicos e acústicos, enchimentos e em inúmeros revestimentos aplicados.
Na dimensão industrial, ainda o encontramos em tintas, cabelagem, nos fornos de tijolo refratário, nas caldeiras, filtros de ar, gás e líquidos, isolamentos especiais e térmicos, calços e pastilhas de travões, fatos corta-fogo e discos de embraiagem. A sua aplicação estendeu-se, durante décadas, à construção naval, do revestimento de embarcações e canalizações dos barcos, passando por mais uma imensidade de assessórios.
Para terminar, nesta pequena amostragem de utilizações mais comuns, não escapa sequer o uso doméstico do amianto em toalhas de mesa, aventais, revestimento das antigas tábuas de passar a ferro e certos produtos fabricados para o lar antes de 2005, onde se destacam as torradeiras, os fogões, os aquecedores, os secadores de cabelo, os termoacumuladores, para além de depósitos e variadíssimos tipos de têxteis.
A situação é dramática e podemos ainda só estar a ver a pequeníssima ponta de um imenso icebergue. Chega, talvez, recordar que, durante décadas, o amianto era considerado um produto puro, limpo, excelente para o uso em impermeabilizações, uso de proteção térmica e mais uns milhares de aplicações diversificadas. Basta imaginar aquilo que ainda é utilizado hoje e que foi produzido ou fabricado antes de 2005.
Apesar de tudo, a Organização Mundial de Saúde esclareceu, já há algum tempo, que enquanto os produtos que contiverem amianto não se degradarem os mesmos podem ser considerados seguros. O único problema é que o tempo passa, 2005 já lá vai há 14 anos e estamos a falar de utilizações que se iniciaram com o inicio da revolução industrial do século IXX e que, só para considerar o caso português, se incentivaram imenso a partir dos anos 60 do século 20, tendo atingido produções de topo nos anos 80 e 90 no final do milénio.
Voltando mais uma vez aos cancros de pulmão e pleura, só para referir os principais, provocados diretamente pelo amianto, que se propaga pelo ar, derivado de produtos que o incluem e que se começam a degradar, não consigo entender como é que o Estado ainda não proibiu a importação de resíduos destinados a aterros contendo este tipo de fibras. Só o que foi alegadamente importado entre 2016 e 2019, são mais de 67,5 mil metros cúbicos de material altamente contaminado, mais de um hectare de resíduos tóxicos, excedendo 1,3 quilómetros quadrados de toxidade, algo que dava para forrar 120 estádios de futebol ou qualquer coisa como uma área onde caberiam 35 terreiros iguais ao Terreiro do Paço lisboeta. Uma barbaridade que continua a ser permitida por uma legislação que não zela pela saúde pública, embora o aparente fazer.
Volto-te a perguntar Berta, porque achas tu que o Governo Português permite tal monstruosidade? Porque é que Portugal virou o caixote do lixo tóxico do mundo ocidental e não reage à situação proibindo a importação de tais resíduos? A mim cheira-me a corrupção, da grande, da antiga e da grave, porque isto não é de agora, nem começou só em 2014, mas, por falta de matéria factual e provas sólidas, apenas poderemos dizer que alegadamente têm de haver corrompidos e corruptores neste processo todo.
A Quercus que criou o SOS Amianto, que eu acho muito bem, porque raio é que não lança uma petição nacional para que sejam imediatamente proibidas importações de resíduos com amianto, para que os aterros que já o incluem sejam devidamente isolados e tratados, o quanto antes, e para que o Estado crie um departamento de levantamento nacional de toda esta situação? Isso sim. Isso era intervenção, coragem e determinação.
Dá trabalho? Certamente, mas pode ser fundamental para conter esta praga no país, dar emprego a alguns milhares de pessoas e proteger as gerações presentes e futuras de uma contaminação feita por mais de um século, sem o conhecimento científico que permitisse travar o seu alastramento. Contudo, já o sabemos há 14 anos e continuamos a tratar o tema como quem assobia, olha para o lado e depois segue em frente. Uma vergonha.
Para mim tudo isto é mais grave do que saber se o Sócrates tem ou não apenas um grande amigo perdulário. A temática do amianto deveria ocupar mais tempo de antena do que o dito, e não devia sair da agenda mediática enquanto não começássemos a agir metódica, consistente e coerentemente sobre o assunto.
Com esta mágoa na alma me despeço, minha querida amiga, recebe um beijo de saudade deste que nunca te esquece,