Carta à Berta: "Os Outros - Tragédia em 4 atos" Parte I - "Ocupação"
Olá Berta,
Pediste-me para te enviar o poema que escrevi sobre o Menino de Kobane, aquela coisa horrível que nos despertou de vez, abrindo-nos os olhos e a mente, para o problema dos migrantes em setembro de 2015, já lá vão 4 anos e 3 meses. Sei que tiveste conhecimento que fui um dos jornalistas a fazer um levantamento exaustivo de toda a história. Não te a quis contar vista por mim, na altura, mas é tempo de a poderes ler. Contudo, como tem um final pouco feliz, e estamos no último dia do ano, vou-te enviar apenas a primeira parte de uma tragédia em 4 atos. Espero que entendas, afinal não te quero ver deprimida no último dia do ano. Todavia, para mim, promessa é dívida. Aqui vai:
"OS OUTROS - TRAGÉDIA EM QUATRO ATOS"
ATO I
"OCUPAÇÃO"
No planeta imaginado
Por trinta milhões de seres humanos,
Algures, numa estreita margem do Mediterrâneo,
Começou, há dois mil e seiscentos anos,
Um país chamado Curdistão
Ou, talvez, quem sabe, deveria ter começado.
Madrasta foi a História deste povo,
Ocupado por impérios e tiranos.
Avaros os vizinhos sempre o cobiçaram
E a terra que nunca foi país,
Acabou por ver-se repartida…
Nas margens da Europa,
Pelo raiar da Ásia,
Ele se ergueria sob a égide de Alá,
A Norte a Turquia Otomana,
Com desejos de poder,
A Oeste a Arménia e o Azerbaijão,
Famintos de território,
A Sul o Irão,
Fanático no crer e no crescer,
A Este o Iraque e a Síria,
Com sede de recursos…
Como pode esta gente ter direito à existência, ao território?
O que pensam os judeus deste direito?
E a América e o imperador careca, esse Putin?
A culpa nunca é de ninguém, são sempre "OS OUTROS"…
Depois chegou o ISIS, o DAESH, o Estado Islâmico,
Não interessa o nome,
Apenas importa que rima com terror,
Ocupando o ocupado,
Terras queimadas para um grande Califado,
Vidas ceifadas pelo fanatismo enlouquecido
E, sem qualquer pudor,
Publicitadas na imprensa,
Na net e nas televisões,
Qual algodão que não engana
Porque a saga garante o verdadeiro horror…
Hoje, fico-me por aqui. Despeço-me, com um enorme beijo, e com o desejo de que tenhas uma excelente entrada em 2020, espero que este ano, em que vamos entrar, te traga toda a felicidade do mundo. Este teu amigo para todo o sempre,
Gil Saraiva