Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

Carta à Berta n.º 605: Portugal - Brasil - A Viagem de um Coração

Berta 605.jpg

 Olá Berta,

Numa altura em que o Brasil festeja os seus dois séculos de independência, esta carta, minha querida, chega a ti a propósito do circo montado em torno da viagem do horrível coração de D. Pedro IV de Portugal e, simultaneamente, D. Pedro I do Brasil, enfiado num frasco de formol, que atravessa o Oceano Atlântico, que separa Portugal do Brasil, para ser exposto, bizarramente, durante uns dias no nosso país irmão.

Só o facto de terem enfiado o coração do ex-monarca em formol, transformando-o numa relíquia, já é, por si só, um facto arrepiante e de um mau gosto atroz (embora fosse uma vontade expressa do monarca). Depois, minha amiga, o facto de duas repúblicas se prestarem a este ritual ainda torna tudo mais gótico, desconcertante e macabro.

Conforme tu sabes, Bertinha, eu nunca fui um fervoroso adepto de Lula da Silva, mas, e isso importa, perante a presidência de Jair Bolsonaro, faria a minha escolha eleitoral facilmente à esquerda, se fosse brasileiro.

Podes pensar, minha querida, que eu não gosto de Bolsonaro por ele ser um tipo de direita, na linha de Trump, Ventura, Orbán, Putin, entre outros, mas é mais do que isso, muito mais. Bolsonaro tem tiques de ditador e mistura religião e política de um modo que considero abjeto e intolerável. A somar a isso as suas atitudes no poder demonstram uma cultura racista e xenófoba inaceitáveis neste século XXI.

Como já te contei, por variadíssimas vezes, eu tive casa no Brasil durante vários anos. Aliás, foram duas, primeiro, uma fazenda em Eusébio, perto de Fortaleza e, depois, um apartamento em Natal. Não fosse a degradação do nível de vida em Portugal e, minha doce amiga, eu ainda teria ambas. Porquê? Porque adoro o Brasil enquanto país e os brasileiros e brasileiras enquanto pessoas e enquanto povo. Só não consigo gostar de fanáticos religiosos e de radicais de direita ou de esquerda, sejam eles de que país forem.

Tenho amigos no Brasil há mais de 37 anos, minha querida. Gosto da alegria de um povo, que consegue rir sempre, mesmo quando sofre na pele a violação constante da amazónia, a falta de cuidados de saúde para uma grande fatia da sua população e o abuso dos poderosos. Contudo, tenho orgulho de termos dado a independência ao território numa época em que ainda nem se falava de independência de colónias em lugar algum do mundo.

Porém, Berta, não alinho em espetáculos deploráveis, como o envio do coração de um monarca, enfiado em formol, como se fosse algum relicário religioso e sagrado. Só o facto, por si mesmo, é capaz de gerar, observações deploráveis de governantes, como as de Bolsonaro que, ao receber a relíquia no Palácio do Planalto, em Brasília, proferiu, logo após o hino, a frase fascista gasta por Salazar: “Dois países, unidos pela história, ligados pelo coração. Duzentos anos de Independência. Pela frente, uma eternidade em liberdade. Deus, pátria, família! Viva Portugal, viva o Brasil!”, uma formulação a lembrar o antigo regime português.

Este salazarento “Deus, pátria, família…” é que envenena todo o discurso de Bolsonaro e revela intensões históricas de tirania, intolerância, racismo e xenofobia. Ora isso, Bertinha, é mesmo inaceitável. A celebração da Independência do Brasil, devia ser uma festa de inclusão, liberdade, tolerância, direitos humanos e de esperança dos dois povos no futuro e jamais servir como um difusor distorcido de más práticas do passado e de ideias bolorentas que se desejam arquivadas nos anais da história. Aqui fica o meu protesto, contra esta trasladação gótica, assustadora e macabra de gosto muito duvidoso, recebe um beijo deste teu amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta n.º 595: Campo de Ourique - Xenofobia, Racismo e Homofobia

Berta 595.jpg Olá Berta,

Um dia destes, ao publicar no Facebook um cartoon da “Miga, a Formiga”, um membro do grupo de Campo de Ourique, o senhor António Lebre, sugeriu com algum humor que eu devia era falar do racismo e da xenofobia que grassam em Campo de Ourique, principalmente, referia ele, entre os residentes de idade mais avançada que, inversamente aos mais novos, demonstram ainda um elevado grau de intolerância. Chegando a afirmar, querida amiga, que a xenofobia estava bastante enraizada, nas pessoas da velha guarda, contra indianos, retornados, chineses, espanhóis, angolanos, franceses, etc..

Até o Presidente da República afirmou recentemente que: "Não vale a pena negar que há, infelizmente, setores racistas e xenófobos entre nós". É claro que o presidente, amiga Berta, não se referiu nomeadamente a Campo de Ourique como obviamente o fez o simpático senhor António Lebre, mas tornou-se óbvio que este tema estava na ordem do dia e que por isso mesmo era a melhor altura para se malhar em ferro quente.

Faço aqui um aparte para relembrar-te, cara Berta, que a tradição das apelidadas tias, em Portugal, está intimamente ligada a Cascais. Afinal, era por lá que viviam, em maior quantidade, há muitos anos, pessoas ligadas à nobreza e realeza, bem como os, na altura, novos e bem instalados burgueses da pós-revolução industrial. Juntando-se a esta nata um clero em óbvio compadrio com o antigo regime. Desta mescla nasceram as tias, a simbolizar uma população desligada da dura realidade do país em que viviam. Porém, dando vital importância a coisas supérfluas e de relevância duvidosa.

Ora, Campo de Ourique, minha amiga de há tanto tempo, com os seus 141 anos de história, não tendo herdado esta nata cascalense, decidiu, já lá vão umas boas dezenas de anos, adotar um estilo parecido, devido ao bem-estar económico de uma boa parte dos seus novos residentes nessa época. Foi assim que nasceram as tias (e tios) de Campo de Ourique que, não podendo plagiar a designação cascalense, se contentaram pela designação de Damas e Cavalheiros de Campo D’Ourique, para parecerem mais finos e requintados.

Todavia, paralelamente, muitos dos indivíduos que ergueram o bairro com o seu esforço e suor e os serviçais destas damas e cavalheiros, também se instalaram com as respetivas famílias, pela periferia do bairro que foi, paulatinamente, alargando as suas fronteiras. Estava criada a poção perfeita para a implantação de valores como refere António Lebre, querida amiga, ou seja, para o aparecimento de racismo e xenofobia contra indianos, retornados, chineses, espanhóis, angolanos, franceses, etc.. Um conceito que foi sendo adaptado e alargado consoante as décadas e a fixação destas pessoas no bairro.

É claro que nas referências de António Lebre, minha querida, faltaram ainda os judeus, os ciganos, os descendentes da mistura de, pelo menos, duas raças ou etnias, os negros em geral e não apenas os angolanos, os pobres e deficientes, os drogados do Casal Ventoso e da Meia Laranja, os pedintes e mais todos aqueles que, por um ou outro motivo, não correspondiam aos elevados padrões destas damas e cavalheiros, mas ele apenas estava a exemplificar e não a querer mostrar uma lista completa dos descriminados em Campo de Ourique.

O grave nesta situação toda, Berta, não é a evolução histórica destas vastas formas de xenofobia, racismo e até homofobia, o grande problema é que a consciência dos povos mudou muito neste século vinte e um e que o que era tolerável e normal no passado, devido às mentalidades da época e do contexto, é, aos olhos de hoje, inaceitável e uma verdadeira afronta aos atuais direitos humanos.

Em conclusão, está na hora das Damas e dos Cavalheiros de Campo de Ourique se adaptarem aos tempos modernos, porque hoje em dia somos todos diferentes entre iguais. Ninguém está num patamar superior por ser branco ou rico ou simplesmente idiota. Com isso me despeço, minha querida, recebe um beijo deste teu amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 537: Nasceu o Jornal Online "Setenta e Quatro" - Cai o Medo

Ilustração Cai o Medo.jpg

Olá Berta,

Muito recentemente o jornal online Setenta e Quatro (www.setentaequatro.pt), lançou o seu primeiro número com muitas rúbricas dedicadas a uma análise da extrema direita em Portugal e no mundo. Para além disso, publicou ainda outros artigos e crónicas sobre fascismo, descriminação, racismo, homofobia entre outros fenómenos característicos desse extremo político.

Estou a tentar ver se a minha colaboração pode ser do interesse de ambas as partes ou não e, para isso, já enviei um cartoon a propósito da temática da investigação do primeiro número. Hoje resolvi incluir esta carta como hipotética participação, se disso houver interesse por parte dos editores.

Contudo, pelo que já foi dito no Setenta e Quatro, pareceu-me excessivo mandar mais uma crónica de opinião a bater na extrema direita. Em vez disso, e totalmente enquadrado no tema, decidi incluir nesta carta, minha querida Berta, um poema que faz parte do livro “O Próximo Homem” publicado lançado à estampa pela editora “Poesia Fã Clube” em junho de 2021, de minha autoria. Aqui vai:

"CAI O MEDO"

Cai o medo na cidade

E chamam-lhe noite.

 

Porém,

O Sol sorri ao Povo intimidado,

Mas para os que tremem

No calor

O eclipse aparente não existe

Pois, pura e simplesmente

Já estão cegos...

 

E para todos eles

As Trevas são reais...

 

Cegos de medo,

Sedentos de conforto e segurança,

Amantes do estável e do firme

Porque nada mais há de tão hipnótico...

 

Eles:

Cegos, sedentos e amantes,

São os condutores

Da noite eterna...

 

"- O Sol só queima o corpo,

Eu nunca o vi brilhar

Na minha alma..."

 

Parecem dizer as bocas mudas,

Fechadas na noite,

Cariadas de vontade própria...

 

Cai o medo na cidade

E chamam-lhe silêncio...

 

Ninguém ouve, ali, agora,

Os gritos dos amordaçados,

Calados pelo estômago,

Apagados no marasmo da noite

E do silêncio...

 

Cai o medo na cidade

Mas ninguém, ninguém,

Mesmo ninguém

O parece sentir...

 

No fundo

Todos somos autistas,

Na noite e no silêncio,

Do vil quotidiano...

 

O medo não vem no dicionário

É mero gene transmitido...

 

"- Antes sobreviver do que viver..."

Pensamos todos nós

Sem repararmos

Que o nosso pensamento é viciado...

 

Somos filhos da noite

E do silêncio...

 

Cai silenciosa a noite na cidade

E ninguém,

Mesmo ninguém repara

Pois só caiu de noite

E em silêncio...

 

Gil Saraiva

 

Espero, querida Berta, que o poema te tenha agradado. Voltarei certamente às nossas cartas brevemente, recebe um beijo saudoso deste teu eterno amigo de todos os dias,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 469: Os Candidatos às Eleições Presidenciais de 24 de Janeiro - André Ventura

Berta 448.jpg

Olá Berta,

André Ventura é o sétimo e último candidato às Eleições para Presidente da República de que te vou falar. Como tenho feito até aqui, nestas cartas que te escrevo, aquilo a que refiro nada mais é do que o que eu penso sobre cada candidato.

Eu vou tendo em conta o que deles li e ouvi na comunicação social, seja pelas entrevistas a cada candidato, seja pelo que deles foi dito pelos diferentes comentadores ou, ainda, o que retiro das notícias sobre eles publicadas, escritas na imprensa, faladas na rádio ou transmitidas pela televisão, seja qual for o canal.

Digo isto porque, pessoalmente, abomino André Ventura e tudo aquilo que ele representa. Gosto, quando assim é, de deixar claro o que me vai na alma, antes de me pôr a falar da pessoa em causa. O facto de apresentar a minha opinião não faz dela uma realidade de facto, embora seja baseada em factos do domínio público.

Por isso é que tudo o que te escrevo nestas cartas pertence ao campo restrito do alegadamente, pela forma como as coisas são narradas pelo meu próprio processo interpretativo. Se apresento este preambulo é porque com este menino… nunca fiando, e mais vale prevenir do que remediar.

André Ventura vem dos subúrbios de Lisboa, nomeadamente da Freguesia de Algueirão/Mem Martins, do Concelho de Sintra, onde nasceu há 38 anos atrás. Vem de um perímetro   repleto de migrantes que, por não se poderem instalar diretamente na capital foram, a pouco e pouco, povoando e sobrelotando a periferia e arrabaldes de Lisboa.

O negócio do pai, uma loja de bicicletas, e o trabalho de empregada de escritório da mãe, foram suficientes para conseguir pagar-lhe os estudos até ao secundário e, mais tarde, a universidade.

Para fugir à influência do berço, já com 14 anos de idade cumpridos, tornou-se católico, batizou-se, fez o crisma e ingressou no “Seminário de Penafirme” no Concelho de Torres Vedras para seguir uma suposta vocação religiosa que seria rapidamente interrompida porque, segundo alega, se apaixonou no entretanto.

Fez o curso de direito na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, onde se formou com 19 valores (prova de que de burro nada tem o mestre André). E, mais tarde defendeu, já em 2013, a tese de doutoramento em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade de Cork, na Irlanda, financiada pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, na qual criticou o "populismo penal" e "estigmatização de minorias", revelando preocupação com a "expansão dos poderes policiais”.

Poderás pensar, amiga Berta, que estou a inventar, mas não. O André Ventura de há oito anos atrás tinha sérias preocupações com as minorias marginalizadas e com o aumento notório do poder policial. Todavia, tal como o amor o fez desistir de ser padre, também a ambição lhe toldou as ideias e os ideais.

Na sua passagem pelo ensino superior acabaria por lecionar na Universidade Autónoma de Lisboa, de 2013 até 2019, e na Universidade Nova de Lisboa, de 2016 até 2018. Foi comentador desportivo na CMTV entre 2013 e 2019, até ser dispensado da função pela administração da Cofina. Durante 2018 e 2019 foi ainda consultor de uma sociedade de advogados e depois da empresa Finpartner, entre 2019 e 2020.

No campo partidário militou uns anos pelo PSD e foi candidato, pelo partido, à Presidência da Câmara de Loures contra o então Presidente, o comunista Bernardino Soares, em 2017.

Foi a partir daqui que André Ventura descobriu a sua vocação de troca-tintas ao manifestar algumas das suas ideias sobre aquilo a que apelidou de “povos ciganos”. No entanto, já no ano anterior, também gerara alguma polémica no seio do PSD ao defender publicamente "a redução drástica da presença islâmica na União Europeia”.

Em abril de 2019 fundou o CHEGA e com ele, pelo círculo de Lisboa, conseguiu ser eleito Deputado da Assembleia da República. Na época dizia que o seu partido defendia ideias "liberais economicamente, nacionalistas culturalmente e conservadoras em questões de costumes”. Aliás, não teve qualquer problema em ir adaptando a filosofia programática do seu partido de forma a congregar descontentes.

Descontentes e, acrescente-se, gente da direita radical, muita dela órfã de uma ditadura finda há quase meio século, e que lhe poderiam permitir criar um nicho político com elevado potencial de crescimento, bem à medida das suas ambições.

Muitas foram as polémicas a envolver André Ventura. Os setores foram variando entre a islamofobia, o preconceito étnico, a homofobia escondida em valores conservadores, o machismo, a xenofobia e o racismo, conforme ia dando jeito à angariação de simpatizantes e militantes do seu partido heterógeno, neofascista e disfuncional.

No meu entender, André Ventura, não acredita em nada do que defende ou diz defender. Ele ruma ao sabor da maré na busca fácil do populismo e do protagonismo político. O narcisismo e o egoísmo são as suas verdadeiras convicções.

 A tarimba de comentador desenvolveu-lhe um diálogo fácil de quem, sem responder ao que lhe é perguntado contra-ataca com afirmações ou questões que têm por objetivo único irritar e tirar discernimento aos adversários.

Esperto, inteligente, ambicioso e sem princípios morais que não lhe advenham do umbigo. É assim que eu vejo este Ventura que, um dia, fruto destas mesmas “qualidades” poderá, por fim, cair em desventura, desde que os adversários nunca o menosprezem.

Por hoje é tudo, amiga Berta, vou beber uns sais de fruto, pois que escrever sobre este individuo me dá uma tremenda azia. Despede-se este teu amigo com um beijo de até amanhã,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 451: Um olhar sobre o CHEGA e André Ventura - Parte III/III

Berta 430.jpg

Olá Berta,

Termino hoje esta minha análise sobre o CHEGA. Antes de mais agradeço que tenhas deixado os teus comentários para o final desta carta. Com efeito, um partido como este, que reúne em seu torno uma quantidade de apoiantes tão diferentes e até divergentes entre si é, por si só, um verdadeiro fenómeno.

Mas não é um partido unido e consistente se lhe retirarmos o líder. Um bom exemplo disso foi o próprio congresso do CHEGA que, sob a ameaça de saída do seu comandante supremo, correu a aprovar as listas por este propostas que tinham sido anteriormente rejeitadas consecutivamente. Estamos, portanto, perante um saco de gatos, com um cão de guarda na porta de saída.

A queda de André Ventura, só por si, acabará por gerar o estilhaçar deste partido numa parafernália de pequenos movimentos, em que cada um puxa o saco para o seu lado. Sem o chefe, os bandos dividem-se nas suas partes e esquecem o benefício do todo que os constituía.

Até este momento o partido Chega é André Ventura e André Ventura é o partido Chega. Isto, mesmo assim, poderia ser e constituir algo de perigoso se a inteligência, o conhecimento, o discernimento e a cultura geral e política do líder fossem algo fora dos padrões aceites como comuns e extravasassem para as margens da genialidade.

Contudo, e para meu alívio, Ventura é apenas um oportunista sem ideias, que navega à vista e que não apresenta qualquer evidência de vir a ter o tão desejado rasgo de génio. Porém, dirão muitos, já reúne 10% das intenções de voto numas eleições legislativas. Com efeito essa é a realidade. Mas achas, amiga Berta, que sabermos que temos 10% de gente desta neste país é verdadeiramente preocupante?

O Partido Comunista Português nem quando tinha 15% dos eleitores portugueses, nas suas hostes, conseguiu implantar uma ditadura do proletariado e isto nos idos tempos do PREC (Processo Revolucionário em Curso), com uma inteligência invulgar como a de Álvaro Cunhal à cabeça e com o apoio da antiga URSS. Ora, nem Ventura é Cunhal, nem os apoios de ventura se comparam à URSS. Por isso, minha querida, deixemos o partido CHEGA implodir, naturalmente, por si mesmo, um destes dias ou quando perder o líder. Tal como aconteceu com o PRD, partido de Ramalho Eanes, quando se viu sem o seu líder.

Por agora basta de um CHEGA que não chega a lugar algum, onde coabitam aqueles que nos interessa saber quantos são e onde estão. Despede-se este teu amigo que muito se lembra de ti, minha querida Berta, com um beijinho, saudosamente,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 450: Um olhar sobre o CHEGA e André Ventura - Parte II/III

Berta 429.jpg

(discurso de Passos Coelho sobre o candidato do PSD à Câmara de Loures, nomeadamente o Sr. Dr. André Ventura)

Olá Berta,

Continuando a minha narrativa sobre o suposto perigo do crescimento do partido de André Ventura, que devo encerrar amanhã, espero deixar clara a ideia que tenho sobre ele. Com efeito, não consigo ver onde está o perigo. Dizem uns que em seu redor se reúnem os racistas, muitos fascistas, os xenófobos e os homofóbicos, entre outras categorias de gente de valores e princípios intoleráveis neste fim do primeiro quartel do século XXI.

Não duvido minimamente da possível veracidade destas afirmações, contudo, e isso é importante, elas não fazem parte do perfil ideológico que consta no programa partidário em causa. Essa ideia advém, principalmente, das posições concretas que vamos vendo Ventura a tomar sobre situações específicas da atualidade política.

Com efeito, basta analisar a evolução, nestes curtos dois anos de existência, do programa do partido, para termos a certeza que este se desenvolve e expande mais pelas oportunidades e oportunismos, do que por ideias próprias bem alicerçadas e cimentadas.

O CHEGA congrega e arrebanha descontentes, em todas as áreas. Venham eles de que partido ou tendência vierem são todos bem-vindos ao polvo aglutinador. Sejam eles os militaristas, os defensores da segurança como um valor que se sobrepõe à liberdade e dos gangues organizados de gente sem caráter, mas também dos tais saudosos do fascismo, dos preconceituosos relativamente a algo, onde encaixam os racistas, os xenófobos e os homofóbicos, entre outros, como os que acreditam que o lugar da mulher é entre a cozinha e a cama e que a igualdade de género é uma história mais fantasiosa do que a da própria Carochinha.

Com efeito, antes de me despedir até amanhã, espero sinceramente, minha querida amiga Berta, que estejas a acompanhar o meu raciocínio e que não julgues o que digo antes de eu terminar a próxima carta. Despede-se saudoso, este amigo sincero, com um abração muito virtual,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 449: Um olhar sobre o CHEGA e André Ventura - Parte I/III

Berta 428.jpg

Olá Berta,

Ao contrário de muitos daqueles que comandam a nossa vida política, daqueles que aspiram ao poder, dos comentadores e analistas políticos e de muitos cronistas, eu, que gosto muito de pensar por mim, não considero que um partido como o CHEGA seja perigoso. Nem sequer acho que constitua uma ameaça à nossa forma de estar, de ser e de viver ou ainda que o mesmo possa estar ferido de qualquer inconstitucionalidade.

Com efeito, no meu modesto entender, o CHEGA é um partido de direita (uma direita muito à direita) que defende, bem no âmago dos seus militantes e apoiantes, um regresso a uma espécie de Salazarismo requentado, sem o brilhantismo político e estratégico de Salazar.

Se o antigo ditador estivesse na génese deste partido seria coerente dizer que o elefante pariu, tardiamente, um hámster, já dentro da rodinha e a exercitar as patitas enquanto a mesma gira e volta a girar. É mesmo assim que vejo este grupo de gente que se aglomerou à volta de André Ventura.

Também não me admiro muito de ver o PSD, de Rui Rio, a ver com bons olhos possíveis alianças à sua direita, afinal muitos dos antigos Barões dos Sociais Democratas e alguns dos Monárquicos do PS, que tentaram, e ainda tentam a todo o custo, que os filhos lhes sucedam nos lugares antes ocupados pelos seus monárquicos assentos, só não mudam para lá por terem vergonha de assumir a sua verdadeira matriz familiar e dinástica.

Fosse André Ventura um líder com os tomates de Pedro Passos Coelho e tivesse ele o nível cultural e intelectual de Diogo Freitas do Amaral e a história seria contada de forma bem diferente daquela que leremos daqui a uns anos sobre o CHEGA.

Amanhã continuarei esta minha análise, todavia, por hoje, este teu amigo despede-se com um beijinho carinhoso, sempre ao teu dispor, caso necessites de ajuda ou de um ombro amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 364: Imigrantes - Parte II - E Agora É Assim...

Berta 342 (1).jpg Olá Berta,

Bem-vinda a “Imigrantes - parte II – E agora é assim...”. Esta carta atualizada da que te escrevi em 2020 e que não te pude enviar por estares incomunicável nos idos da pandemia, a 2 de outubro, continua a falar de migrantes, todavia, caríssima, se a primeira falou de emigrantes portugueses no estrangeiro deste os anos 60 do século passado, esta fala dos imigrantes, logicamente estrangeiros, em Portugal.

Antes de mais aproveito para te relembrar, doce confidente, que no início da década de 70, já lá vão 44 anos, o número de imigrantes no país era considerado nulo, devido a números muito pouco relevantes no país. É claro que sempre existiram estrangeiros a viver em Portugal, por exemplo, os Franceses têm uma escola em Lisboa desde finais do século XIX e o Liceu Francês Charles Lepierre existe na atual morada desde 1952, sob a alçada direta do Ministério dos Negócios Estrangeiros francês.

Porém, foi depois do 25 de Abril de 1974 que as coisas se alteraram significativamente. Primeiro instalaram-se uma imensidão de consulados e embaixadas em Portugal, depois foi o regresso de meio milhão de retornados portugueses vindos das ex-colónias, muitos com uma mão atrás e outra à frente e, hoje em dia, amiguinha, no final do primeiro quartel do século XXI, já no próximo ano, deverão estar perto de chegar aos 2,5 milhões.

Em resumo, e para pôr as coisas em termos simples, estamos à beira de 2 em cada 10 residentes no país serem estrangeiros. Podemos dizer, minha querida, que o padrão se inverteu. Na verdade, a sua presença é já tão importante que, sem eles, a nossa Segurança Social já tinha implodido sem qualquer forma de salvação.

Contudo, não temos apenas um único tipo de imigrantes. Os atuais fluxos têm 4 origens distintas. Em primeiro lugar, minha amiga, temos os imigrantes originários da CPLP, ou seja, da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, em que o Brasil lidera. Cerca de metade destes emigrantes são pessoas de raça negra ou mestiços, tendo muitos destes um nível de instrução bastante limitada. A maioria vive junto das grandes cidades e dedica-se a trabalhos ligados à mão-de-obra indiferenciada.

Seguem-se, menina, os imigrantes vindos das ondas migratórias da atualidade, a que se juntam refugiados, exilados políticos e trabalhadores indiferenciados recrutados no estrangeiro como mão-de-obra barata. É gente de várias raças e etnias, ainda pouco adaptada à realidade em Portugal, com muito poucas condições de subsistência e de habitação. A exceção aqui são os ucranianos e mais alguns imigrantes de Leste, que possuem geralmente bons níveis técnicos ou mesmo universitários, e os brasileiros, das últimas levas de migração, o que pertencem à classe média ou alta.

Depois, caríssima, temos os comerciantes, muitos deles chineses, indianos e de outras proveniências, que se dedicam a serviços técnicos ou tecnológicos e ao comércio de bens e serviços, muitos deles importados através dos seus países de origem.

Por fim, Bertinha, temos os ricos e o pessoal qualificado, sendo que os primeiros vieram para Portugal por intermédio dos vistos Gold, e os outros se instalaram porque muitas grandes empresas internacionais abriram sucursais no nosso país, que neste momento é atrativo porque, mesmo os quadros de topo, são pagos abaixo das tabelas reais da Alemanha, do Reino Unido e de muitos outros países desenvolvidos, pelo que compensa trabalharem a partir de Portugal. Ainda neste grupo temos os que veem para Portugal estudar ao abrigo de programas de permuta internacional como o Erasmus.

A divisão que faço destes imigrantes em 4 grupos não é totalmente correta porque há outros motivos, origens e proveniências, ainda mais complexas e se que entrecruzam muitas vezes. Basta pensar que o Algarve, por exemplo, tem uma grande comunidade de estrangeiros reformados, que aqui residem de forma permanente, principalmente ingleses, porque o custo de vida por cá, lhes potencializa as pensões e reformas. Para além disso, amiga, é preciso não esquecer que, em comparação com o resto da Europa e outras partes do mundo, o clima ameno do país e a paz lusa ajudam muito.

De um momento para o outro, em Portugal, passámos de um país onde quase só viviam lusitanos para um país onde as culturas de mais de 130 países se misturam de uma forma já bem notória e acentuada. Na verdade, Berta, se a tudo isto juntarmos o turismo, e o seu crescimento astronómico, com a abertura de milhentos hotéis e alojamentos locais, etc., somos capazes de ter regularmente em terras lusas mais de 3 milhões de estrangeiros, ou seja, 3 em cada 10 habitantes, e isso nota-se imenso.

Ora, atualmente no seio do povo luso, cara companheira de desabafos, 2 em cada 3 portugueses é gente com mais de 60 anos. Tendo em conta esta realidade como é possível pedir aos lusitanos que se adaptem a uma mudança de hábitos e vizinhança tão rápida e radical? Não é de espantar que a população envelhecida se sinta invadida na privacidade e hábitos do seu quotidiano. Numa alteração tão abrupta do dia-a-dia os fenómenos do racismo, da xenofobia, da discriminação e muitos outros pululam e alastram como fogo em seara seca.

Seremos nós más pessoas porque nos tem custado, e muito nalguns casos, a fazer esta transição? Não, não somos. Também não somos mais racistas e xenófobos, ou seja lá o que for, do que o resto dos povos do planeta. Gente parva ou exagerada nos preconceitos existe em todo o mundo. Todavia, Berta, se derem tempo à população lusitana esta terá mais facilidade em se acostumar do que a maioria dos povos. Neste mundo global em que vivemos, o povo lusitano é dos mais tolerantes e adaptável. Deixem passar mais 20 anos e tudo terá voltado à normalidade. A única coisa que precisamos é de tempo e este não se vai acabar já amanhã. Por hoje é tudo, fica com um beijo amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 363: Emigrantes - Parte I - Antigamente era assim...

Berta 341.jpg Olá Berta,

A um e dois de outubro de 2020, ainda durante o tempo em que estiveste incomunicável, minha querida, escrevi-te duas cartas seguidas, parte um e dois sobre imigração e emigração, temas que hoje em dia voltam a estar na moda. Essas cartas nunca chegaram até ti, por isso agora volto a enviar-tas, com a devida atualização, todavia, mantendo a ordem cronológica em que foram originariamente escritas, tentando manter-me fiel ao que já tinha escrito.

Portugal, durante grande parte da segunda metade do século XX foi um país de emigrantes. Era difícil viver condignamente, doce amiga, numa ditadura que se esforçava por manter o povo inculto, pobre, iletrado, sem grandes condições de saúde, com um muito limitado sistema de saneamento básico, num país onde as mulheres eram propriedade masculina, não podiam votar, nem podiam viajar sem autorização escrita dos pais ou dos maridos.

Na verdade, minha cara, nem sequer podiam ter opinião ou voto em matéria de propriedade, nem mesmo podiam votar, pese embora o facto de as eleições serem uma farsa até abril de 1974.

Lutando para sobreviver, no seio de um regime fascista o povo optou por emigrar. Em 1961, quando eu nasci, residiam em Portugal 9 milhões de pessoas. Dessas, Bertinha, 3 milhões não tinham a quarta classe.

Em apenas 9 anos, 500 mil portugueses emigraram. Ao chegarmos à década de 70, amiguinha, eramos apenas 8,5 milhões de residentes. Muita gente mudou de ares para o Brasil, Venezuela, Angola, Moçambique, Estados Unidos da América, e, em geral, para toda a Europa, com grande relevância da França, Suíça, Alemanha, Holanda e Luxemburgo, como destinos de eleição.

Os emigrantes a residir em Portugal rondavam os 27 mil estrangeiros e em 1970 eram já tão poucos que desapareceram das estatísticas. Uma vez no estrangeiro, os nossos emigrantes ocuparam-se, maioritariamente, dos trabalhos não qualificados, dos serviços menores ou da agricultura. O preconceito estrangeiro para com os portugueses era dominante e eramos considerados um povo de segunda categoria, minha querida.

A falta de cultura era deveras gritante e apenas 250 mil pessoas tinham o curso dos liceus completo e somente umas 50 mil possuíam uma licenciatura. Existiam 2,7 milhões de habitações, mas apenas 32% delas tinham banheira ou duche. Hoje existem quase 6 milhões e apenas 115 mil têm falta dessas condições, sendo a maioria habitações ilegais e improvisadas. A vida era dura no nosso país para os portugueses, minha cara confidente.

Hoje, amiga, calcula-se que Portugal ultrapasse os 3 milhões de emigrantes. Embora atualmente Portugal exporte, contrariamente ao passado, uma população qualificada.

A explicação para serem tantos emigrantes é simples. Quem saiu instalou-se e criou raízes lá fora, poucos decidiram voltar porque ganham lá fora quase o dobro, e nalguns casos mais, pelo mesmo serviço, do que aqui. Ora, é fácil de entender, minha querida, porque se dizia que o povo português não era racista, nem xenófobo, nem nada dessas coisas agora tão em voga. Eramos nós quem vivia na mó de baixo e afinal, nem tínhamos imigração que nos incomodasse fosse porque razão fosse.

A primeira vez em que o povo português se sentiu seriamente invadido e em que o preconceito pareceu existir como um facto problemático foi, amiguinha, quando, após a independência das nossas ex-colónias, recebemos, em poucos anos, meio milhão de retornados.

A vida em Portugal melhorou muito nos últimos 50 anos. Mas o povo tem memória curta. Bastam meia dúzia de anos para darem como direito absoluto o que levaram décadas a conquistar. A educação e um outro nível de vida também os ajudou a ver a realidade de outra maneira e a exigirem mais. É normal. Todavia, agora, a história é outra porque a vida é assim... falarei sobre ela já na próxima carta, na segunda parte deste tema. Por hoje, Berta, recebe um beijo de despedida deste teu eterno amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº, 246: O Renascer do Racismo com o Populismo de Direita

Berta 224.jpg

Olá Berta,

O tema da violência policial, aqui há uns anos abordado em Portugal, por causa do espancamento abusivo e injustificado de um adepto de futebol, que pacificamente transitava na rua, perto de uma zona onde tinham acabado de acontecer diversos distúrbios sociais ligados a um jogo, já fez correr alguma tinta no país. Porém a coisa agrava-se quando juntamos a isto a palavra racismo.

O Renascer do Racismo com o Populismo de Direita

A ascensão de André Ventura nos meandros da política pode tornar este afastado e quase esquecido episódio numa prática, assustadoramente corrente, num abrir e fechar de olhos.

Com efeito, amiga Berta, os discursos de Ventura apontam para o desejo de transformação das nossas forças de segurança e não só, numa polícia de intocáveis, ameaçando a população civil com prisão, se ousarem, quiçá, insultar polícias ou magistrados.

O rastilho foi recentemente aceso com o caso do homem de raça negra que clemente dizia: “não consigo respirar”. Um homem que morreu pelo joelho de um polícia, que não abrandou, por mais de 8 minutos a pressão intencional, que exercia sobre o pescoço da vítima. Foi assim que morreu George Floyd, um óbito registado por telemóvel para o mundo ver, se poder indignar e, finalmente, condenar publicamente. A situação decorreu nos Estados Unidos da América, o país da alegada liberdade, e tem gerado protestos de revolta à escala mundial.

Para acicatar ainda mais os ânimos o Presidente Americano, um tal de Donald Trump, ordena à polícia que desmobilize uma manifestação pacífica perto da Casa Branca, a fim de atravessar a rua e, usando uma igreja como fachada, vir mostrar a bíblia, enquanto promete retaliação repressiva aos manifestantes revoltosos que considera terroristas.

Uns graus de latitude mais abaixo, a situação piora quando, também neste passado mês de maio, se descobre o macabro caso de um jovem de 30 anos, abatido pela polícia mexicana por resistir, imagine-se, ao uso de máscara na via pública. O facto foi ocultado por uns dias graças a uma tentativa de suborno, com pagamento de cerca de 8 mil euros à família, sem recursos, da vítima, mas acabou por ser denunciado e exposto na praça pública.

O infeliz sujeito chamava-se Giovanni López, a sua detenção foi filmada pelo irmão da vítima, que só o voltaria a ver, já morto, no hospital da cidade onde foi declarado o óbito. A tentativa de suborno foi imaginada e conduzida pelo perfeito da cidade que agora se encontra a ser, também ele, investigado. A indignação disparou com o galardoado, com o Óscar de melhor realização de 2018, Guillermo del Toro, a demonstrar publicamente a revolta perante o sucedido na sua terra natal. Estes acontecimentos obrigaram o Governador do Estado de Jalisco a vir a público prometer que os culpados serão punidos, a meu ver, minha amiga, tarde de mais, uma vez que a indignação já invadiu as ruas.

A tempestade perfeita parece formar-se quando, mais uns graus de latitude abaixo do México, mas precisamente na mesma altura, no maior país da América Latina, o Presidente da República do Brasil, que responde pelo inconcebível nome de Jair Bolsonaro, vem afirmar publicamente, e perante a televisão, que os grupos de populares que se manifestam contra ele, e contra o seu Governo, são não apenas marginais como também terroristas. Tudo a acontecer num país onde 9 em cada 10 dos mortos causados pela polícia brasileira no Rio de Janeiro são negros ou mestiços.

Numa altura em que muitos observadores internacionais apontam para a possibilidade crescente de o Brasil descambar numa guerra civil, entre os apoiantes do Presidente e os que o condenam, tudo parece cozinhado para uma monstruosa crise, sem precedentes, no admirável novo mundo.

Por enquanto, os reflexos desta violência irracional em Portugal, não nos remetem nem para a gravidade dos acontecimentos vindos das Américas, nem apontam ainda qualquer possibilidade de que isso possa transpirar para esta terra de costumes pacíficos, onde apenas o ex-comentador benfiquista da CmTV, o alegadamente mentecapto André Ventura, tenta gerar alguma exaltação de ânimos. Mesmo assim, seria interessante tentar saber se, após este último empate do Benfica em casa, frente ao Tondela, a posterior vandalização das casas de Bruno Lages, Pizzi e Rafa têm ou não a ver com o papel inflamatório do ex-comentador televisivo e atual deputado do Chega. Contudo, importa relembrar que, desde que este fulano apareceu a divulgar as suas ideias e baboseiras na praça pública, pelo menos a partir do verão de 2018, os relatos têm vindo a ganhar gravidade e frequência. Coincidência ou não, o inflamador não se livra da sombra que a ele se colou.

Quem é que já se esqueceu do raid levado a cabo pela polícia de Alfragide à Cova da Moura, que terminou com a detenção de um grupo de indivíduos de raça negra, que foram posteriormente sovados no interior da dita esquadra, e cujo caso ainda continua aberto e em julgamento? Ou da senhora também de raça negra que, por causa de um bilhete de autocarro, se viu terrivelmente maltratada e sovada pela polícia na Amadora, cujas notícias fizeram furor no início deste ano?

Ainda há também o vídeo de outro jovem de raça negra, maniatado pela polícia e a ser obrigado a respirar o fumo de escape de um automóvel ou o outro individuo da mesma raça, no final de janeiro, filmado por duas turistas a ser detido, enquanto um polícia proferia “tens um ar suspeito”, à noite na baixa de Lisboa, perante a suplica do fulano alegando nada ter feito. No entanto, não escapou a uma revista pública efetuada abusivamente por 4 polícias, que depois o levaram preso, sem nada ter sido aparentemente encontrado.

Uma coisa é certa, eu, querida Berta, sou dos que não acredita em coincidências. Não é difícil gerar descontentamento à boleia da pandemia, do aumento do desemprego e da chegada anunciada da pior recessão das últimas décadas a Portugal. Se queremos manter o equilíbrio pacífico e ponderado que nos carateriza maioritariamente enquanto povo temos, urgentemente, de pôr um ponto final nas carreiras públicas daqueles que, usando de um populismo demagogo, tentam criar o conflito e o confronto. Basta olhar as sondagens para ver que a mediocridade medra facilmente e isso é realmente uma grande merda.

Será mera coincidência que, com tanta ocorrência, nos últimos 10 anos, não exista um único caso de condenação policial por atitudes racistas, pese embora as variadíssimas queixas da Amnistia Internacional e do SOS Racismo sobre os vários e frequentes casos em Portugal?

Já me sinto melhor depois de desabafar. Este teu amigo despede-se com um beijo de saudades,

Gil Saraiva

 

 

Mais sobre mim

foto do autor

Sigam-me

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Em destaque no SAPO Blogs
pub