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Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

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Carta à Berta nº. 162: Série "Os Segredos de Baco" - IX - Contornos Específicos e Especiais

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Olá Berta,

Poucos temas existirão que tenham o condão e a capacidade de nos ajudar a distrair dessa coisa terrível chamada coronavírus. Porém, não é saudável ficarmos absorvidos apenas por essa temática, como em qualquer outra doença, precisamos de pontos de fuga que nos possam auxiliar a desanuviar um pouco.

É essa a razão para eu voltar, hoje, ao tema de “Os Segredos de Baco”. Esta abordagem visa esclarecer e explicar coisas que nunca vi colocadas por escrito e devidamente sistematizadas, mesmo assim, isso não quer dizer que não existam, mas, apenas, que eu não as encontrei.

Um importante segredo de Baco é a criação de laços de confiança e empatia entre o vinho e o seu consumidor. Trata-se de um jogo subtil, com contornos suaves, sem imposição, gerado quase que instintivamente, na senda de nos fazer acreditar que estamos perante um produto ímpar, merecedor do nosso foco e atenção.

III) O Vocabulário da Terminologia usada nos Vinhos Nacionais e alguns Porquês…

A) Os Contornos do Prazer associado ao Conforto e ao Bem-Estar.

Secção II) Contornos Específicos e Especiais: Portugal, Raízes, Eixos, Avaliadores e Terminologia.

1) O Caso de Portugal:

Julgo que em enquanto nação fomos dos povos mais influenciados por certos valores da antiguidade. Não só falamos uma língua latina, embora com imensa influência grega, principalmente no vocabulário, como, sendo nós periféricos, marítimos, descobridores e aventureiros, usufruindo das benesses do clima mediterrânico, somos um país com quase um milénio de existência, muito mais próximos do que outros povos das influências clássicas. Porém não somos exclusivos, mas fazemos parte de um grupo muito restrito.

2) As Raízes:

Não é de espantar que muitas destas tradições e práticas da antiguidade se tenham infiltrado na forma como lidamos com o vinho, com o tipo de marketing que para ele escolhemos e que exista uma real influência de terminologia e vocabulário que ficaram. Afinal, graças às caraterísticas do nosso território, e aos diferentes climas e microclimas, tivemos a possibilidade de gerar uma variedade imensa de vinhos específicos e adaptados a cada local, com peculiares detalhes próprios de cada região. Os produtores, levados pelo método da experiência e erro, foram inovando, testando e moldando as verdadeiras raízes que, mais tarde, serviriam para caraterizar cada zona vitivinícola e, por fim, cada região demarcada. Portugal, no seu pequeno território, é um exemplo único, no que diz respeito, à diversidade.

3) Os Eixos:

a) Entre o Mar e a Serra, o Sul e o Norte na busca daquilo que nos relaxa: Não poderia ser de outra forma. Por um lado, o consumo do vinho apela por si só ao relaxe, à paz e à descontração. Sem estes eixos seria impossível podermos produzir de forma tão diferenciada, os diferentes tipos de vinho. O segredo encontra-se na adaptação das vinhas e da produção a cada região. Foi isso mesmo que nos tornou singulares no universo de Baco. Por outro lado, os nomes das garrafas procuraram, na sua grande maioria, ajudar a manter essa ideia ou, se possível, fazê-la atingir patamares mais elevados na procura de ligar um bom nome de um vinho a um momento muito bem passado, a uma região demarcada, a uma história e a uma tradição.

b) A harmonia das ideias e da alma convergem, se forem ajudadas por lembretes felizes, na rotulagem das garrafas de vinho. Se num carro gostamos de sentir potência e emoção, adrenalina e perigo, num vinho procuramos o gosto pelas coisas simples da vida, de uma forma quase pura. Importa saber realçar a relação entre o prazer de existir e o deleite de beber, como elementos complementares de uma convergência que tem de nos parecer natural. A criação da necessidade deverá parecer emergir da nossa vontade. É por isso que aqueles que combatem os problemas causados pelo vinho apenas têm um sucesso relativo. O vício não vem do vinho, mas das pessoas, o que é uma mensagem sublime.

4) O Papel dos Avaliadores:

a) Sejam eles provenientes dos Enólogos, dos Escanções, Enófilos e Críticos de Vinhos, Jornalistas e de todos Os Especialistas no Universo da Vitivinicultura:

Todos já lemos as descrições que os peritos deste imenso mundo fazem ao apreciarem um vinho. É pura poesia, numa literatura de palavras em que estas constituem maravilhosas descrições influenciadas pelo vastíssimo horizonte do palato e do olfato, sem nunca esquecer a cor, o brilho do néctar e a própria apresentação da garrafa comentada.

b) O uso de um vocabulário requintado:

Procura-se transmitir ao consumidor a mesma serenidade e prazer que os produtores e as gentes do marketing põem nas garrafas. Eles poetizam sobre como o vinho ganha volume com o tempo na garrafa, se é refrescante ou acolhedor consoante a época do ano. Comentam sobre a existência no néctar de um alinhamento no diapasão da fruta madura. Divagam sobre a comida que os pode acompanhar nessa senda pelo estar muito bem dentro do bem-estar. A recomendação atual de que se deve beber com moderação visa, em última análise, desresponsabilizar o produto de quaisquer culpas sobre os seus malefícios. O malefício é o uso desmedido ou exagerado que certos indivíduos dele fazem, ou seja, a culpa não é nem do produto, nem do produtor. Quem bebe é que deve saber beber.

  1. c) O conjunto das apreciações tem um objetivo bem determinado:

Divulgam fragrâncias, sabores ocultos, vivacidade e brilho. Insistem que tem um terminar longo e profundo, injetando mistério e volúpia. Enfim poetizam para nos cativar. Para nos encaminhar na aventura de todos nós tentarmos decifrar e descobrir quais são, na realidade, “Os Segredos de Baco”.

5) As Escolhas na Terminologia:

Ao prazer e ao conforto juntam-se outras valências intrinsecamente relacionadas.

a) A tradição vinda da antiguidade, o valor da religião, da família, da propriedade e dos locais, a afirmação do nome, a importância da realeza e da nobreza:

Tudo na busca do poder, num ambiente sensorial original, que cheira a terra e a mistério, que nos coloca de novo em contacto com a natureza, com a fauna e com a flora, nessa luta firme pela pesquisa perfeita pelo maior dos regalos. A importância da subtileza dessas abordagens encontra-se no detalhe das descrições, naquilo que, à primeira vista, nos parece somente uma mera descrição de um vinho, uma adega ou uma vinha.

b) Tudo somado gera uma galáxia de palavras e opções na terminologia:

Afinal, importa deixar claro o destaque e o valor deste hidromel da nossa atualidade. Palavras há que se encaixam nos diferentes apelos e, por isso mesmo, o seu uso ainda se torna mais aliciante. Em síntese, a mensagem subtil do vinho aparece retratada de forma indelével, nos diferentes apelos criados para que, subconscientemente, a consigamos assimilar com naturalidade, quase sem disso termos a noção, ou seja, converter sem convencer. Algo brilhante que apenas no vinho tem esse nível perfeito de sofisticação e habilidade absoluta e perfeita.

Espero ter conseguido passar-te a mensagem deste intricado método de induzir a necessidade aos apreciadores sem que dela se fale. Despeço-me, certo de que, amiga Berta, por certo, irás querer saber mais sobre os apelos, que constituem esta última faceta sobre a terminologia do vinho. Contudo, terás de aguardar pelas próximas cartas, para os conheceres de forma clara, em vez daquela que, até ao momento, é meramente intuitiva. Recebe um beijo saudoso deste teu amigo de todos os dias,

Gil Saraiva

 

Carta à Berta nº. 159: Série "Os Segredos de Baco" - VIII - O Vocabulário e os Porquês: Contornos Primários

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Olá Berta,

Gostei de saber que achaste graça à expressão de que “os olhos também bebem” da minha última carta. Como sabes todos os nichos sociais têm termos e uma linguagem própria que os carateriza. O mesmo acontece nos universos da uva e do vinho, aliás, em toda a cultura do setor. Não é, portanto, motivo de espanto que me vejas dedicar alguns capítulos de “Os Segredos de Baco” a essa temática, começando já neste oitavo capítulo.

Contudo, é certamente algo que nunca deves ter lido em nenhuma outra publicação ligada ao mundo do vinho e se te questionares sobre os porquês eu respondo-te de forma simples e sem grandes revelações. Quando estamos perante uma coisa rotineira e evidente raramente nos passa pela cabeça sistematizá-la ou até mesmo escrever seja o que for sobre ela.

Como exemplo, quando se fala de futebol ninguém pensa em discutir ou apresentar as razões da forma da bola do jogo ser redonda, esférica, e não ter uma outra forma qualquer. Trata-se de um dado assumido que não carece de muito mais explicação. Mas se isto é verídico para uma situação desta simplicidade a situação é ligeiramente mais complexa no que ao vinho diz respeito. Os termos usados no mundo vitivinícola podiam muito bem ser todos de caráter técnico ou profissional, porém, visam também transmitir prazer.

Aliás, num setor que envolve problemas no que concerne ao setor da saúde, devido a quem faz um uso excessivo da ingestão de vinho e de outras bebidas com diferentes teores alcoólicos ou até de quem, devido ao seu quadro clínico não devia beber de todo, importa ser proativo na demonstração da confiança, tradição e qualidade do produto.

Não nos podemos esquecer que morrem, só em Portugal, 13 mil e 500 pessoas, por ano, devido a este hábito de se beber, por conjugação com os problemas de saúde dos indivíduos e pelos excessos fáceis de atingir, muitas vezes causados pelo desejo de uma euforia de momento, ou até, por problemas de viciação.

Não sendo o vinho o único responsável isolado deste problema, para além dos problemas individuais de cada um, no que respeita à sua tolerância ao álcool, há ainda a ter em conta que o setor é acompanhado pelo das cervejas e o das bebidas destiladas, que têm iguais responsabilidades.

Porém, quando se analisa toda esta problemática, que pode exigir controlo ou abstinência, os produtores do vinho e toda a industria em seu redor, têm a preocupação acrescida não apenas de transmitir a confiança, a qualidade e a tradição do setor, mas envolver cada consumidor numa comunidade unida em torno da apreciação e apreço por uma cultura dos vinhos associada ao prazer e ao  prestígio, ao sucesso e à degustação refinada, envolta em valores de classe e de charme, que as marcas tentam passar e promover.

É no seio desta realidade, que se tenta desenvolver a política do bem-estar, induzindo todos os envolvidos num universo subtil, quase divino, que o vocabulário e a terminologia ganham relevo, forma e importância. Continuando pelo caso português, que não difere muito daquilo que se passa nos outros países produtores, importa explicar certos porquês no que concerne à envolvente linguagem do vinho.

III) O Vocabulário da Terminologia usada nos Vinhos Nacionais e alguns Porquês…

A) Os Contornos do Prazer associado ao Conforto e ao Bem-Estar.

Secção I): Contornos Primários: Pensamento, Ideia, Antecedentes, Prazer, Conforto e Bem-Estar.

1) O Pensamento Comum:

Há quem pense que as coisas acontecem por acaso, que são fruto de coincidências normais e aparentemente sem uma intensão nas ações, sem uma finalidade pré-definida à partida. Ainda existem aqueles que consideram que certos fenómenos são gerados pelas necessidades do marketing. Realmente pode ser verdade. Admito que as coisas se possam passar de uma ou de outra maneira. em qualquer parte do mundo aliás.

2) A Ideia Diferente:

Mas, ao olhar para todo o universo que rodeia o vinho, acho que existe uma lógica e sou levado a pensar de forma diversa. Não faz sentido no atual contexto, abordar o fenómeno em termos globais, pelo que, neste trabalho, apenas me vou debruçar sobre o caso português embora possa usar, aqui ou ali, uma imagem que fuja dos contornos nacionais.

3) Os Antecedentes:

Para não ir mais longe, e focando-me apenas na civilização ocidental, podemos reparar que desde a antiguidade grega e romana o vinho tem um papel central na vida das pessoas. Os antigos até tinham um deus para o álcool, Baco para os gregos ou Dionísio no caso dos romanos. Ele era o deus do vinho, mas também da ebriedade e dos excessos, especialmente os sexuais sendo igualmente o deus da natureza, aquela que não inclui mão humana.

a) O Prazer, o Conforto e o Bem-Estar:

É de notar que as festas organizadas em honra de Baco eram denominadas bacanais, com tudo o que isso implica de excessos quer no vinho quer nos prazeres remanescentes. Celebrar o deus implicava a existência de prazer, de vivencias sensoriais, era um apelo à natureza e à terra, à religião, à aventura e ao mistério, na senda de sentimentos plenos de conforto e de bem-estar.

b) Influências e Marcas:

Estas celebrações religiosas, porque dedicadas a um deus, a que me referi no ponto anterior, eram organizadas por quem tinha nome, família e propriedade, por quem era, logicamente dono e senhor de um ou vários locais, e, sem exceção, eram regadas com vinho, muito vinho. Coisas que influenciaram toda uma civilização, atravessando, com o correr dos tempos, todos os estratos sociais. principalmente a nobreza e realeza europeias muito ligadas aos fenómenos da antiguidade. Foram elas que, aos poucos, marcaram assim, de forma evidente, tradições geradas nesse passado que transmitia ao vinho um simbolismo de protagonismo e poder.

Deixo a segunda secção para a carta de amanhã. Por hoje despeço-me grato por ter tão paciente leitora, recebe um beijo de despedida deste teu amigo, com um curto adeus e um até às próximas linhas.

Gil Saraiva

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