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Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

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Carta à Berta nº. 281: Livro - O diário Secreto do Senhor da Bruma - II - Abordagens Sobre a Burrice (continuação - II - 6)

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Olá Berta,

Este capítulo sobre a burrice do Diário Secreto do Senhor da Bruma era, pensava eu, para ser algo mais curto do que o capítulo anterior, contudo, perante a realidade, começa é a ser difícil descrever tanta burrice que, entretanto, encontro por todo o lado. Só frases, expressões, ditados e outras verborreias sobre burros e burrices são às paletes. De longe, sem qualquer dúvida, muito mais do que aquilo que eu imaginava. Finalmente, quando penso que estou a terminar, lá aparece mais uma, depois outra e mais outra, enfim…

Todavia, não pretendo esgotar o tema, nem acho que mesmo que quisesse o conseguiria fazer. Porém, já que comecei, pelo menos as expressões mais usadas no nosso falar quotidiano pretendo deixar aqui registadas. Pode ser que tu, minha amiga te lembres de mais, não tem mal, por esta amostra já fica uma ideia. Mas vamos ao assunto, que se faz tarde:

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II

Abordagens sobre a Burrice (continuação - II - 6)

Março, dia 8:

Mais uma vez este burro figurativo, que aqui representa quem trabalha, vem em defesa dos direitos dos trabalhadores dedicados, erradamente apelidados pelo patronato de burros. O próprio provérbio é disso prova. O povo pode estar calado, mas tem a perfeita noção da sonegação dos seus legítimos direitos. A necessidade de ter de trabalhar, consoante os conhecimentos e as profissões que se conseguem, não confere a quem o faz o estatuto de burro. Pelo menos não o deveria conferir. Classificá-lo como tal é não apenas um ato de puro xenofobismo laboral, como um comportamento fascista perante o trabalho de um patronato sem valores.

Março, dia 9:

Os trabalhadores podem ser apelidados de jumentos, mas a verdadeira “jumentude” encontra-se nas classes superiores sempre preocupadas em esmifrar os animais, quer isto lhes agrade quer não. Por exemplo o tal de Ventura que já aqui referi, diz que pretende uma polícia forte para proteger e dar segurança ao povo, mas, se alguém tiver o azar de olhar para debaixo do tapete são os dólares e os euros dos mandantes quem realmente esfrega as mãos de satisfação. Todavia, às vezes, tramam-se porque o povo junta umas ortigas ao capital.

Março, dia 10:

Aprendizagem, inteligência e sabedoria nos provérbios sobre o equídeo:

No ditado “quando um burro fala (ou zurra, dependendo da versão), os outros abaixam as orelhas” embora o entendimento seja imediato quanto ao sentido, depois, ao olharmos cuidadosamente para as palavras, a coisa fica mais confusa. Não é burrice os burros que escutam baixarem as orelhas? Não as deviam empinar para escutarem o homónimo? Será que eu sempre entendi o dito inversamente ao seu sentido? Afinal, o que um burro diz não deve ser escutado?

Março, dia 11:

Fica a reflexão, pois não me parece que exista uma solução fácil para tão profundo paradoxo. Alguns comentadores entendem que provavelmente o cavalicoque (outro sinónimo de asno que, entretanto, descobri) profere apenas asneiras o que obriga as outras pilecas (mais um sinónimo desencantado) a baixar as orelhas para evitar escutarem. É do conhecimento corrente que o último asno que tentou tapar as orelhas com os cascos posteriores acabou por terra com o monumental tombo que, por via do exercício, quase lhe foi fatal.

Março, dia 12:

No entanto, provavelmente, se quando um burro fala os outros baixam as orelhas, também pode ser por incredulidade dos outros jericos, afinal o burro costuma apenas pensar e não é muito dado a falatório, basta lembrar o provérbio “a pensar morreu um burro” (ou “a julgar”, segundo algumas fontes). O que pode não indicar que asno que é asno não pensa e se pensa demora tanto tempo a fazê-lo que, entretanto, morre. Ainda existe a possibilidade do quadrupede ficar a pensar sobre o que há de pensar, sem que nenhum pensamento lhe ocorra, enquanto pensa nisso, nunca se sabe…

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Hoje, quando vi nas notícias que o Tribunal da Relação confirmou a condenação de João Rendeiro, o ex-presidente bancário do ex-BPP, com 5 anos e 8 meses de prisão efetiva, dei comigo a pensar que posso muito bem ser mais burro do que julgava.

João Rendeiro, um ano antes de ter sido acusado, foi capa das principais revistas e jornais nacionais, nelas aparecia como sendo o homem do ano, um dos melhores banqueiros de sempre na banca portuguesa. Ora eu, como tantos outros papalvos deste país, engoli as excelências e respetivas competências do homem como sendo verdadeiras. As publicações ligadas às finanças, aos negócios e ao capital não podiam estar todas enganadas. Contudo, afinal, estavam mesmo. Redondamente enganadas.

É claro que Rendeiro deve recorrer mais uma vez para o Supremo Tribunal. Ao fim ao cabo, enquanto o pau vai e vem, folgam as costas… e o burro que o confirme. Entretanto, se alguma vez a condenação chegar, naquela altura em que não há mais para onde recorrer, pode ser que o referido acusado já se tenha posto ao fresco, para um qualquer sonhado paraíso onde continuará a rir dos asnos que logrou vezes sem conta. É que o acusado não está sujeito a nenhuma medida coerciva que o impeça de se pôr a milhas se, quando a coisa estiver para acontecer, achar que vai mesmo ser condenado.

Enfim, querida Berta, burros somos nós que vivemos na pacatez da nossa vida de remediados. Despeço-me de ti com um beijo virtualmente saudoso, até amanhã e, já sabes, se precisares o teu amigo está sempre ao dispor.

Gil Saraiva

 

 

 

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