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Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

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Carta à Berta: Campo de Ourique - Uma Voz Amiga, Solidária

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Olá Berta,

Já me encontro confinado há mais de um ano, pois, como te lembras, estive doente, sem conseguir sair de casa desde dezembro de 2019 até ao meu internamento hospitalar de 15 dias em abril de 2020 e, daí para a frente até hoje, continuei em isolamento social devido à pandemia.

Tendo em conta que continuo a aguardar uma operação urgente, sucessivamente adiada, que deveria ter ocorrido em abril do ano passado e que, devido a ser pessoa de risco, nunca larguei o confinamento, lembrei-me, no meio deste isolamento todo que, como eu, deve existir gente, no bairro, com o mesmo problema de isolamento.

Não imagino se serão poucos ou muitos, mas julgo que esse número poderá ser considerável. Ora, pessoas isoladas, a viver sozinhas, ou mesmo que não vivam sós, a precisar de conversar com alguém que as escute com atenção, de um modo franco e solidário, merecem atenção, solidariedade e têm direito a poder dialogar ou desabafar com alguém que as escute e com quem possam interagir.

Contudo, esclareço que sou jornalista, escritor e blogueiro, não tenho formação em psiquiatria ou psicologia clínica, não sou padre, nem sacristão, nem professo nenhuma religião e não pertenço a nenhum culto ou sociedade secreta, tipo maçonaria ou qualquer outra, também não me considero vendedor de banha da cobra ou seja do que for.

Foi a pensar nelas que decidi criar o movimento “Campo de Ourique – Uma Voz Amiga, Solidária”. Pelas iniciais do objetivo cheguei à sigla UVAS, de momento, e enquanto não aparecem outros voluntários para este movimento, eu serei as UVAS de Campo de Ourique, um bago representando todo o cacho, mas penso que mais gente se juntará a este cacho, pode ser que um dia sejamos uma videira e, mais tarde uma vinha unida na solidariedade de quem precisa de UVAS, ou seja, uma voz amiga, solidária.

Todavia, para que isso aconteça a necessidade tem de ser real e existir. Será que há quem viva em Campo de Ourique e que tenha necessidade de ouvir uma voz amiga, solidária? Gente a viver sozinha, confinada, isolada ou a precisar de “Uma Voz Amiga, Solidária”. Isto é: gente pronta a conversar, porque disso sente a falta? Haverá, como eu, pessoas assim no nosso bairro?

Pois é isso mesmo que pretendo descobrir, embora, para já, o meu campo de ação limita-se a quem vive ou trabalha em Campo de Ourique e sente necessidade de falar com alguém, mesmo que essa pessoa seja um desconhecido como eu. Aliás, de momento tem de ser gente que tenha Facebook e que leia esta mensagem porque, para me contactarem, terão de me enviar uma mensagem pelo Facebook ou um email para saraiva.gil@gmail.com.

Não precisam de me pedir amizade, não é necessário aderirem ao meu grupo no Facebook, não têm de pagar seja o que for. O movimento UVAS, que para já sou só eu, pretende ser algo solidário, social, de combate ao isolamento ou ao confinamento e à solidão.

O facto de estar confinado, com um rendimento muito limitado, isolado e, por isso mesmo, com pouco contacto social, faz de mim aquilo que sou: um bom ouvinte e um dialogante simpático. Para começarmos a conversar basta enviar-me uma mensagem pelo Facebook ou um email (saraiva.gil@gmail.com) referindo os dias e horas em que lhe dá jeito conversar e mandando o seu número de telefone. Não tem de fazer mais nada ou dar outras explicações, eu ligarei assim que possível para o número que me enviou dentro dos limites do horário proposto. Não tem que me dar sequer, nas conversas que depois tivermos, mais informações do que as que queira fornecer, ou contar algo que não queira abordar. Não importa se é homem ou mulher e pode ter 18 ou 118 anos que isso é indiferente.

O movimento UVAS é para toda a gente que dele precise, independentemente de raça, etnia, sexo, idade, religião ou pensamento político. Sendo eu ateu, não tenho tabus contra ou a favor seja de que credo for. A solidariedade que aqui proponho, para já, apenas tem como limite a outra pessoa que me pede apoio viver ou trabalhar no bairro de Campo de Ourique. As primeiras conversas estarão limitadas a 15 minutos, apenas porque desconheço o tipo de adesão que o movimento terá.

Então, amiga Berta, o que achas tu da minha ideia? Achas que vou ter contactos de pessoas sós ou com sentimento de solidão, que precisam de uma voz amiga, solidária e pronta a conversar? Haverá gente a precisar deste tipo de apoio no bairro? Esclareço que ninguém tem de me dar a sua morada, eu não preciso de saber isso, apenas que são do bairro ou que cá trabalham, se na conversa quiserem dizer em que rua moram tudo bem, mas isso é com cada um e por sua opção. Relembro-te que para eu poder contactar a pessoa, ele ou ela tem de ter Facebook (ou de ter alguém que me contacte em seu nome), achas que a situação pega? Eu sinceramente não faço ideia, mas tentar não me custa nada e tempo não me falta. Despeço-me com um beijo solidário,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta: Porque É Tão Difícil Confinar Agora?

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Olá Berta,

2.103.000 era, há 15 minutos atrás, o número de óbitos, por Covid, registados oficialmente no mundo. Dois milhões cento e três mil, este é o número de mortos oficiais por Covid, o que é muita gente e isto num universo em que, talvez já no próximo domingo, o globo atingirá os cem milhões de infetados. Então, perguntarás tu, minha querida Berta, porque é que não andamos todos em pânico?

Porque nos adaptamos, esta é a verdadeira resposta. O nosso cérebro tem a maravilhosa capacidade de se adaptar a todas as circunstâncias para conseguir sobreviver. Quando a notícia que aparece repentinamente, tem mostras de tragédia e é chocante, nós reagimos de imediato. Temos medo, pavor, pânico e insegurança nos instantes seguintes, todavia, a repetição continuada no tempo, de forma cíclica, de um mesmo tipo de desastre faz disparar os nossos mecanismos de defesa. Passamos a assimilar essas notícias como parte da rotina e o susto inicial é substituído por uma espécie de enfado triste até que um dia, sem sabermos porquê, passamos a achar normal tudo o que anteriormente nos horrorizou.

Não admira, portanto, embora a pandemia esteja bem mais grave agora do que no início, que a coisa nos pareça mais normal, menos preocupante, o que justifica que não entremos em pânico com a facilidade anterior.

Não passámos a ser mais insensíveis, nada disso, nós entrámos, isso sim, em modo de defesa cognitiva. Como consequência disso temos todos a tendência de sermos impelidos a voltar às velhas rotinas da pré pandemia, como se esta fosse algo que, embora existindo e sendo uma realidade, não nos diz diretamente respeito.

Aqui ou ali, um detalhe, um acontecimento sobre o tema, ou uma qualquer relação de proximidade, pode fazer regressar o medo, o pavor ou o pânico, contudo, tem de ser por um motivo específico, porque a generalidade do assunto se tornou corriqueira e banal.

Essa é a razão que explica porque fomos tão ordeiros e obedientes no primeiro confinamento de março do ano passado e porque procuramos, com a mesma naturalidade, as exceções ao isolamento desta vez.

Apesar disso ser naturalmente assim, há coisas que não aceitamos. Por exemplo, porque não perdemos a capacidade de pensar, é-nos difícil aceitar que as eleições de domingo para a Presidência da República não tenham sido atempadamente adiadas. Aliás, foi com sentimento de revolta que já reagimos à votação antecipada, marcada por filas e esperas sem sentido, do passado domingo.

Psicólogos, psiquiatras, analistas especializados, cientistas do comportamento, médicos, terapeutas e mais uma gigantesca parafernália de entendidos sabem bem o que nos acontece e porque agimos da forma como agimos e porque acabamos por nos comportar como nos comportamos.

Se os grandes senhores das gigantes tecnológicas usam os estudos do comportamento humano para nos fazerem consumir quase que por instinto, porque raio não há de o Estado usar os mesmos mecanismos para nos explicar o que estamos a fazer intuitivamente de errado?

A pergunta fica no ar, minha querida Berta, por hoje despede-se saudoso este teu amigo do coração, recebe um beijo de despedida deste que não te esquece,

Gil Saraiva

 

 

 

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