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Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

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Carta à Berta nº. 663: Os Novos 4 Cavaleiros do Apocalipse - Epílogo - VI/VI

Berta 663.jpg Olá Berta,

Está quase a fazer 4 anos que te escrevi sobre os 4 novos Cavaleiros do Apocalipse. Ainda há pouco tempo te reenviei essas cartas para que as recordasses, cara confidente. Porquê? Porque nelas te tinha prometido um epílogo que demorou a chegar. Aparece hoje, finalmente, porque me parece a altura certa. Entre setembro de 2020 e maio de 2024 muita água correu debaixo da ponte e foi longa a caminhada dos 4 Cavaleiros do Apocalipse.

Há quase 4 anos, amiguinha, já a pandemia, a famigerada Covid-19, infetava que nem peste num mundo doente, ceifando vidas a torto e a direito. Contudo, se os dados oficiais apontam hoje para mais de 7 milhões de pessoas que tombaram perante a avalanche, dizem os especialistas que, os dados reais e não declarados, devem ter levado mais de 30 milhões de almas, não parece muito se comparado à população mundial, todavia, daria para encher de gente, por 3 vezes, um país como Portugal.

Há ainda, minha querida, que falar dos infetados que, a acreditar nos especialistas, não foram apenas os 700 milhões referidos nos dados da Organização Mundial de Saúde, mas sim, quase 3.000 milhões, ou seja, mais de um terço da população do globo. Sem a descoberta das vacinas, diz-se num dos últimos estudos publicados, teríamos perdido mais de um quarto da população mundial.

Mesmo que se possa pensar que os números são exagerados, na realidade, pouco importa, porque foram sempre gigantescos. As movimentações do sinistro Cavaleiro da Peste, Bertinha, foram gigantescas e ele nos últimos tempos, muito ativo em todo o planeta.

O imenso Cavaleiro da Fome, então, parece ter tomado proporções ciclópicas e devastadoras. Entre as suas tropas e vassalos, existem atualmente uma parafernália de fenómenos, entre eles, genericamente, em primeiro plano, as alterações climáticas. Na verdade, cara amiga, a subida da temperatura das águas nos oceanos, cujo grau de acidez aumenta a um ritmo assustador, junta-se à desertificação avassaladora de milhões de quilómetros quadrados por todo o globo, ao desaparecimento de lagos e lagoas, ao degelo dos glaciares e à consequente elevação do nível das águas nos oceanos.

Estes novos paladinos da Fome, minha querida, são agora apoiados por hordas de humanos negacionistas, que negam os factos científicos, associados aos fanáticos hooligans das teorias da conspiração e aos destrutivos radicais de direita apostados na instalação do caos.

Ciumento e conflituoso, o imprevisível Cavaleiro da Guerra, caríssima, aproveita-se de toda a situação para germinar um caminho seguro para o Apocalipse. Com efeito, a sua entrada em força no final do primeiro quartel do século XXI, não beneficia, de modo algum, a paz e a harmonia.

Com o seu apoio o Cavaleiro da Fome propaga-se de África para todo o mundo. A seu lado, amiga, está a seca extrema, em certas áreas do planeta, ladeada pelas chuvas devastadoras, por inundações e por cheias sem precedentes nos últimos séculos. Os povos tentam migrar fugindo à desgraça, que nunca vem só, criando mais conflitos, aumentando devastadoramente os fenómenos da xenofobia, do racismo, da homofobia, entre outros, proporcionando o aumento de ódios e o crescimento exacerbado do populismo fácil, destinado a aumentar o caos.

O Cavaleiro da Guerra rebenta com a pacífica Europa, com Médio Oriente, e, mais disfarçadamente, minha cara, com quase todo o mundo. A China sedenta por Taiwan, a Rússia pelo regresso do Imperio Soviético, Israel disposto a extinguir o povo palestiniano, como se um ataque que ceifou um milhar de israelitas pudesse justificar o genocídio. Já não bastavam o crescendo número de focos terroristas por toda a parte, agora, a guerra contra a Ucrânia chama-se Operação Especial e ser procurado pelo Tribunal Penal Internacional aparenta ser um estatuto de prestígio dos novos “democráticos” líderes mundiais.

O Cavaleiro da Morte, autoproclama-se de Imperador do Mundo e nesta calma aparente em que a comunicação social tudo relativiza, Berta, os cães ladram e a caravana passa. O que tiver de ser… será… e assim me despeço, com um beijo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta: O Colecionador de Beijos - Introdução - Parte III - V/VII

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Olá Berta,

Termino aqui a apresentação inicial do livro “O Colecionador de Beijos”. Depois desta carta apenas ficam a faltar mais duas outras referentes à conclusão do ensaio sobre o beijo e respetiva bibliografia. Assim sendo aqui vai a terceira e última parte da introdução.

 

“Introdução

 

Na Igreja Católica, o beijo pode ser um sinal de reverência, ao se beijar, por exemplo, o anel do Papa ou de membros da alta hierarquia eclesiástica. Já os romanos da Antiguidade tinham 3 palavras para beijo, “basium”, “osculum” e “suavium”, se o primeiro se dava entre conhecidos, o segundo era apenas partilhado entre os amigos íntimos e o terceiro destinava-se em exclusivo para os amantes. Aliás, o beijo tinha um papel nas lides do poder romano, com efeito, somente os nobres mais distintos podiam beijar o imperador nos lábios, os restantes tinham de se contentar com um beijo nas mãos e os súbditos apenas tinham direito a beijar o seu soberano nos pés. Efetivamente a partilha de beijos entre guerreiros, quer na Grécia, terra onde o beijo tinha um papel fundamental, quer em Roma, era comum no regresso das campanhas. Consta, também, que na Suméria, a antiga Mesopotâmia, os beijos serviam como prendas aos deuses.

Já na Rússia Czarina o beijo era uma verdadeira demonstração de poder porque, um beijo do Czar, traduzia uma das mais prestigiadas honras imperiais. O beijo era tão importante que, por exemplo, em França, no decorrer do século XV, os nobres tinham o privilégio de poderem beijar todas as mulheres que quisessem. Porém, na Itália medieval, um homem cavalheiro que beijasse uma dama em público era imediatamente obrigado a contrair o matrimónio, o assunto era tão sério que o costume se espalhou a uma grande parte do povo. Porém, na Escócia medieval era costume o padre beijar os lábios da noiva no final da cerimónia de casamento para haver felicidade conjugal.

Durante o copo de água, e ainda em prole da felicidade, a noiva devia beijar na boca todos os homens presentes, trocando cada beijo por uma quantia em dinheiro.

No caso português, e já no Brasil, D. João VI introduziu a cerimônia do beija-mão. Assim, em determinados dias, o acesso ao Paço Real era conferido a todos os que desejassem apresentar alguma demanda. Nessa ocasião, em sinal de respeito, tanto os nobres, como o povo, e até os escravos, tinham que lhe beijar a mão direita antes de fazerem o seu pedido. Esse costume foi mantido por D. Pedro I e por D. Pedro II. Porém, a troca de beijos entre portugueses e índias, no Brasil, era mal visto por estas, que achavam o ato nojento, quer por estarem habituadas a cheirar o corpo do parceiro, em busca das feromonas do sexo oposto, em vez de usarem os beijos, quer porque contraíam uma parafernália de maleitas vindas do continente europeu por via dessa troca.

Podemos encontrar o beijo representado e apresentado nas diferentes formas de arte, seja na pintura onde o génio da pintura Gustav Klimt deu cartas, como escultura, com Rodin, na literatura com imensos autores de diferentes épocas, na sétima arte e nas redes sociais. Pelo que investiguei o beijo propaga-se cada vez mais pelo mundo e até já tem um dia próprio. O Dia Internacional do Beijo a 13 de abril de cada ano. O ato de beijar em público é generalizado no mundo ocidental e nos territórios ocidentalizados dos diferentes continentes, mas cerca de dez por cento da humanidade simplesmente não usa o beijo e cerca de vinte e cinco por cento só o faz na esfera privada e íntima. O oriente é a zona do globo onde a prática pública do beijo apenas se encontra nas grandes urbes e mesmo aí, vê-se quase exclusivamente entre casais jovens ou em grupos onde a presença de pessoas de mais idade não se verifica.

Porém, o mais comum, hoje em dia, na cultura ocidental é o beijo ser considerado um gesto de afeição. Entre amigos, é utilizado como cumprimento ou despedida e entre amantes e apaixonados beija-se como prova da paixão, de agrado ou de dedicação. Resta-me desejar uma boa leitura deste ensaio jornalístico e literário, onde se apresentam, numa visão possivelmente esclarecedora, 435 beijos, esperando que este livro possa contribuir para um melhor entendimento cultural e sociológico e uma mais apurada compreensão das afinidades e das consequências desse fenómeno espetacular a que chamamos beijo. Mas passemos ao conteúdo...”

Assim chega ao fim esta introdução e com ela, sempre saudoso, me despeço uma vez mais, este teu amigo do dia-a-dia,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta: O Colecionador de Beijos - Introdução - Parte II - IV/VII

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Olá Berta,

Nestas sete crónicas sobre a parte do livro “O Colecionador de Beijos” que não descreve propriamente os beijos em si, espero que fiques com a visão global da razão porque me meti nesta verdadeira aventura de compilar tanto beijo e de os descrever o melhor que consegui. Segue-se a segunda parte da introdução:

 

“Introdução

 

Também não descuro os anos de aprendizagem, na área das Artes Plásticas, passados com o grande Mestre da Pintura, conhecido como o pai do Neorrealismo em Portugal, Isolino Vaz e com a Pintora Susana Olga e os conhecimentos de Português, Latim e Grego adquiridos desde a infância, com a minha mãe, a Professora Maria José Gil Alexandre. Tudo ajuda na formação das ideias, na produção da criatividade e na elaboração de contos, romances, poemas, ensaios e fábulas. Até na criação de um simples quadro a óleo existe um distinto olhar sobre o mundo e uma perspetiva diferente de o observar.

Mas porque refiro eu, nesta introdução, este tipo de historial pessoal? Apenas é só porque o tempo acumulado no exercício da profissão de jornalista e investigador, a longa viagem de estudos académicos e universitários, a convivência com mestres, criativos e gente das letras e a consequente aprendizagem adquirida, permitiram, por fim, a deteção da falta de sistematização ensaística do beijo, enquadrado enquanto ato sociológico relevante, nas diferentes civilizações da história e da atualidade. É este olhar diferente que me proponho a deixar aqui registado. Porém, conforme já deixei subentendido, nem o tema acaba com as conclusões deste ensaio, nem o beijo se esgota numas dezenas de páginas sobre ele. Mas é um início, um instrumento de trabalho, um princípio, enfim. Depois dos pressupostos apresentados, que por si só justificam a presente escolha, importa sublinhar alguns aspetos relevantes sobre o beijo. Para além de se tratar, por um lado, de um laço do foro privado, entre duas pessoas, ele é, por outro, uma manifestação de cariz público, se bem que com uma relevância absolutamente diferente do anterior. Assim sendo o beijo acontece quer se cumprimente alguém ao chegar a um determinado lugar, quer nas despedidas, quer ainda nos atos de afeto, simpatia, carinho e, como não podia deixar de ser, de amor.

Poderíamos apelidar o beijo de ser o reóstato perfeito do relacionamento humano. Assim, a sua falta assinala com frequência um estado deteriorado de uma relação específica, no caso dos amantes, um historial clínico depressivo, na convivência social ou o estado de uma relação afetiva dependendo da intensidade deste. A deteção destes factos pode ajudar os envolvidos a efetuarem reavaliações e a procurarem corrigir essa falta procedendo ao seu resgate. No plano íntimo ele funciona como uma dança, quando mais se pratica, melhor é a execução e o prazer que dele se extrai.

Porém, nem tudo é positivo, uma pessoa doente pode transmitir através de um beijo, constipações, gripes, sarampo, rubéola, mononucleose e herpes, embora esses problemas não sejam culpa diretamente do beijo, mas sim, do estado clínico de um dos seus participantes.

No que se refere à sua origem, o beijo tem um passado algo obscuro. Não há certezas quando começou a ser praticado, porque se iniciou esta prática, nem mesmo onde é que esta possa ter a sua origem. Os primeiros registos encontrados, onde se faz prova do seu uso têm, porém, cerca de quatro milénios e meio. Com efeito, são de 2.550 a.C. os primeiros registos de beijos, talhados na pedra, pelas paredes dos templos de Khajuraho, na Índia.”

É com uma despedida oriental, à moda indiana, que termino esta carta. Porém, ciente das minhas limitações relativas a estes rituais fica omissa a respetiva descrição. Recebe também mais um beijo e um até amanhã do teu amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta: O Colecionador de Beijos - Introdução - Parte I - III/VII

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Olá Berta,

Continuando na saga de “O Colecionador de Beijos” segue a primeira parte da introdução ao livro. A minha decisão de te enviar a introdução em três partes prende-se com o facto da mesma ser um pouco extensa e de eu não querer abusar da tua paciência. Assim, cá vai: introdução -Parte I.

 

“Introdução

 

O Colecionador de Beijos, ensaio jornalístico e literário, de matriz sociológica, do ato de bem beijar, procura a vertente sociológica e cultural, não perdendo as raízes históricas e a composição literária e humanista do beijo. Não é, porém, um ensaio académico de base científica porque, objetivamente, nunca o poderia ser. Por mais que se tente não se consegue sintetizar ou analisar, o beijo, nem mesmo o ato de beijar, isoladamente, sem ter em conta toda a imensidão de afetos, respostas sensitivas e sensoriais que o rodeiam e influenciam.

O beijo é um produto composto e, embora se apresente com uma identidade singular, muita tinta precisa de correr para que ele se realize numa das suas tão variadas formas e feitios. Diferente seria se estivesse a escrever um ensaio sobre a introdução sociológica do papel higiénico na sociedade portuguesa. Aí sim, teríamos à mão um produto final que poderia ser analisado de um modo bem mais académico, sistematizado cientificamente e enquadrado com razoáveis limites de precisão em termos históricos, sociológicos e culturais, fosse ou não a analise ensaísta literária e jornalística.

Mas não é esse o caso aqui. Nem poderia ser, derivado da imensa complexidade que o mais simples beijo exige. Por isso, este ensaio, é declaradamente um ensaio jornalístico e literário de análise sociológica, humanista e cultural. Pode-se até incluir uma lufada sistematizada de psicologia e inteligência emocional, mas não há, no meu entender, maneira de ir mais longe num ensaio que verse esta temática, usando esta abordagem.

A pergunta que esta introdução deixa no ar é a seguinte: É ou não relevante o beijo no contexto do comportamento humano em sociedade? Proponho-me a demonstrar que a resposta é afirmativa sem qualquer margem para erro, mesmo nas sociedades onde o beijo só é praticado na privacidade do lar ou do leito conjugal. Se analisarmos, por exemplo, o Japão tradicional e conservador vamos descobrir que o beijo, não sendo um ato público, continuou determinante portas dentro, no seu papel aglutinador de um determinado par ou no seio de uma família. Só agora, ainda a título de exemplo, é que, no país do Sol Nascente, já 28% dos jovens urbanos se beijam em público e, mesmo assim, só se não se encontram sob o olhar atento dos progenitores. Mas se este é um comportamento fruto da globalização, dos filmes e das redes sociais, está ainda a léguas de se tornar efetivamente uma conduta tipicamente japonesa.

Tendo iniciado a minha atividade jornalística em 1981, há trinta e oito anos atrás, e tendo conseguido a carteira profissional em 1996, exatamente quinze anos depois do início, conforme a lei da altura o previa e regulamentava, julgo poder afirmar, com segurança, que a realização deste ensaio tem, na experiência acumulada, base suficiente para poder vingar. Ainda para mais que, muitos desses anos, foram passados no âmbito da investigação jornalística, para jornais locais onde o apuramento da verdade dos factos ou dos feitos é muito mais importante do que nos grandes títulos nacionais. Como a minha atividade académica, a nível universitário, se pautou por cerca de 18 anos de estudo interessado, fosse no Curso de Direito em Coimbra, nos Estudos Portugueses, Cultura e Expansão em Faro, na Filosofia no Porto ou na Psicologia Clínica no Polo Universitário de Loulé, julgo poder afirmar ter garantido uma plataforma estrutural suficiente para, conjuntamente com a experiência jornalística, conseguir desenvolver este projeto de forma cabal e conseguida. Porém, a minha convicção não deixa de ser apenas e somente uma mera opinião sobre um tema que me é caro.”

Despeço-me até amanhã com o costumeiro beijo da praxe, com muito carinho, o teu eterno amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 339: Os Novos 4 Cavaleiros do Apocalipse - Morte - V/VI

Berta 339.jpg Olá Berta,

Esta é a quinta carta que te escrevo sobre os 4 Cavaleiros do Apocalipse. Desta vez para te falar do cavaleiro do cavalo preto, o último dos 4, cuja força reside na forte união que partilha com os outros 3, a Morte. Não é comum, nos dias que correm ouvirmos a palavra. Com efeito, cara confidente, a comunicação social, tem vindo a aprimorar a forma gentil como fala de Morte, principalmente da Morte de seres humanos.

Em situação de Guerra não nos comunicam o número de Mortos, nada disso, falam do número de Baixas, no caso da Fome escutamos a palavra Óbitos, para a Peste, por seu turno, a escolha recair sobre o termo Vítimas. E mesmo quando falam especificamente dos Mortos a palavra é substituída por Falecimentos ou Falecidos. O ridículo, amiguinha, é quando substituem a frase “aqueles que já morreram” pela simpática expressão “aqueles que nos deixaram”.

Os sinónimos são tantos que nos parecem realidades paralelas que nos fazem esquecer a Morte. Falam de Desaparecidos, de Massacrados, de Abatidos, de Trucidados, de Chacinados, de Sacrificados, de Extintos, de Fuzilados, de Finados, de fatalmente Atingidos e Alvejados ou, ainda os Baleados. Relatam os Assassinados, os Martirizados, os Cadáveres e os Corpos, mas, minha cara, evitam os Mortos.

Quando o Rei faz anos, e quando já não dá mesmo para esconder, lá aparece a Morte, os Mortos e a Mortandade, mas é raro, muito raro. Todos os termos são bons para transformar a Morte em algo que parece menos grave do que a verdadeira realidade. Efetivamente, minha querida, é mais fácil ouvir falar em velar o Defunto do que o Morto, como se este pudesse ficar ofendido pelo uso do termo e, quiçá, virar Alma Penada.

A realidade, cara amiga, não precisa de tantos floreados, todos sabemos, desde muito cedo, que o avô não Partiu, mas que Morreu. Para Morrer, aliás, já diz o povo, basta estar vivo. É algo que faz parte da condição humana, das especificidades de todos os seres vivos.

É conhecida a lenda da fonte da juventude, o desejo profundo de enganar a Morte, ficando para sempre jovem e saudável, mas mesmo que a fábula, como por milagre, se tornasse realidade, Bertinha, mesmo assim, a Morte podia acontecer acidentalmente, por muito que fossemos jovens e saudáveis.

Não há como enganar o Derradeiro Destino, chamado Morte. Ele vai vir, vai chegar e vai acontecer, quer queiramos quer não. Pode estar na moda tentar disfarçar a dureza dos factos e da vida, podem existir mil termos para não falar de Morte, mas não é por isso que ela deixa de existir. Por hoje é tudo, Berta, voltarei, para o epílogo final um destes dias. Beijo deste teu amigo de sempre,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 338: Os Novos 4 Cavaleiros do Apocalipse - Peste - IV/VI

Berta 338.jpg Olá Berta,

Nesta quarta das 6 cartas sobre os regressados 4 Cavaleiros do Apocalipse, o assunto deriva para a Peste, um mal que nunca vem só. Hoje em dia, minha amiga, com a evolução da medicina, já não se fala desse termo arcaico e em desuso que dava pelo nome de Peste. Nos nossos dias a Peste chama-se Pandemia e é mais mundial do que nunca, no entanto, continua a ter os seus efeitos mais devastadores nas classes mais baixas da sociedade.

Seja por falta de informação, seja por falta de espaço para confinamentos, seja por dificuldades de isolamento dos infetados nos estratos mais baixos seja porque, nestas coisas o mexilhão é sempre quem mais se lixa, cara confidente. A Covid-19 é apenas a última forma pomposa de se falar em Peste.

Este flagelo, que ceifa a vida de milhões em todo o mundo, nem se sabe bem como surgiu. Os adeptos das teorias da conspiração, ainda sem estudos que o comprovem, afirmam ter a Covid-19 sido criada, em laboratório, pelos chineses, que podem ter espalhado deliberadamente a fatídica maleita. Outros afirmam, Bertinha, que os culpados continuam a ser os chineses, mas por comerem animais infetados como morcegos, como se os hábitos alimentares de um país ou de um povo pudessem, por si só, ser justificativos de uma Pandemia global.

Há até governantes responsáveis no mundo ocidental a declarar, com a maior das latas, que a pandemia é uma invenção conspirativa, que visa confinar e controlar as pessoas. Exemplos como Donald Trump, nos Estados Unidos da América, ou Jair Bolsonaro, no Brasil, caríssima, estão no pote dos casos mais evidentes.

À custa deles, e das seitas que os seguem, perdem-se milhões de vidas humanas por falta de medidas preventivas. Os Negacionistas são outra Peste igualmente perigosa nos dias de hoje. Apenas existe neste tipo de gente uma preocupação: a manutenção do poder do líder a qualquer custo. Na verdade, minha querida, os exemplos são, infelizmente, mais do que muitos.

Depois temos, por outro lado, os oportunistas. Uma quantidade de negócios que exploram as fraquezas humanas para prosperarem no seio da desgraça. É o caso das empresas farmacêuticas, cara amiga, que enchem os cofres à custa da Peste, sem grande preocupação em fazer dos povos cobaias, na procura interesseira de uma solução, que lhes dê o esperado rendimento.

Esta gente arranjará por certo, uma, duas, dez soluções, mas, infelizmente, nenhuma delas será altruísta. Os países que podem pagar, principalmente os mais desenvolvidos, estarão sempre na linha da frente, amiguinha, enquanto os outros terão de aguardar pelas migalhas, enquanto o seu sistema de saúde putrifica nas bases.

Não será a Covid-19, a última Peste do século XXI, enquanto o lucro e o poder forem os únicos valores dos ricos e poderosos, continuaremos a assistir ao aparecimento de outra Peste qualquer, seguida de outra e de mais outra. O imperialismo e o capitalismo desregulados até já inventaram uma nova forma de serem servidos disfarçadamente aos povos. Agora, Berta, são chamados pelo termo pomposo e fofinho de Liberalismo. Amanhã entro na quinta carta, contudo, por hoje fico-me por aqui, recebe um beijo saudoso, deste amigo do coração,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 337: Os Novos 4 Cavaleiros do Apocalipse - Fome - III/VI

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Olá Berta,

Nesta terceira das 6 cartas sobre os regressados 4 Cavaleiros do Apocalipse, vou falar-te da Fome, um flagelo cada vez mais agressivo que é proporcional ao aumento acelerado e progressivo das desigualdades sociais no mundo inteiro, minha amiga. Com efeito, a frase popular: “os ricos que paguem a crise”, devia, neste momento, já ter força de lei na maioria dos países. A miséria alastra nas classes mais baixas da sociedade, sugando, à sua passagem, os estratos mais baixos da antiga classe média.

No final do século passado, cara confidente, quando se ouvia a comunicação social falar de Fome eramos normalmente conduzidos a imagens de África, onde crianças subnutridas enchiam os televisores, com um ar miserável e os corpos esqueléticos cobertos de moscas, contrastando com as habituais barrigas imensas próprias da carência alimentar.

Porém, Bertinha, passadas 2 décadas depois de se entrar no século XXI a Fome está por todo o lado. Mesmo uma grande fatia das populações dos apelidados países desenvolvidos tem, atualmente, uma faixa de população urbana e trabalhadora que não consegue, com o que recebe de salário, mensalmente, pagar habitação e ter uma alimentação condigna com a sua própria condição de ser humano produtivo. A Fome alastra, escondida e envergonhada não apenas em África, mas em todo o mundo.

Mas, minha querida, com a globalização do fenómeno, os meios de comunicação deixaram de nos falar de Fome, isso parece muito dramático e trágico para países europeus, ocidentais e evoluídos. O eufemismo utilizado, com que agora se referem à Fome é: Crise.

Crise serve para tudo. Serve, caríssima, para esconder que os ricos estão cada vez mais ricos à custa da crise, serve para sobrecarregar de taxas e impostos a população que depende de um salário ao final de cada mês, serve para justificar a subida dos combustíveis, serve até para nos tratarem como se fossemos todos muito estúpidos e não fossemos capazes de analisar que 3 quartos da crise é artificial e visa enriquecer mais ainda uma pequena minoria.

Pior ainda, a palavra crise, minha amiga, serve para esconder a Fome. Como é preciso comer, quem tem o dinheiro contado, acaba por recorrer à comida barata, cheia de gorduras, de corantes e conservantes e coisas mais enervantes, cheias de emulsionantes, que provocam colesterol, problemas digestivos, cardíacos, obesidade e até cancro.

Depois, amiguinha, do alto da sua sabedoria, somos informados cinicamente, pelas empresas dos ricos que devíamos ter uma alimentação saudável e “oferecem-nos”, a pagar, uma série de soluções que passam por ginásios, veganismo, nutricionistas e especialistas em retirar mais a quem já nada tem. Porquê?

Porque é sempre possível esmifrar mais um pouco. Afinal, é tudo para o nosso bem. Em Portugal, por exemplo, ainda nos insultam a dizer que somos pouco produtivos. Quem tem Fome ou, usando o vocabulário atual, sente a Crise todos os dias no bolso e no estomago, tem de ser mais produtivo porque assim mandam os ricos e poderosos. Estou, Berta, farto de tanta hipocrisia. Por hoje, fico-me por aqui. Deixo um beijo de até amanha, este teu eterno amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 336: Os Novos 4 Cavaleiros do Apocalipse - Guerra - II/VI

Berta 336.jpg Olá Berta,

Nesta segunda de 6 cartas sobre os renovados 4 Cavaleiros do Apocalipse, vou falar-te da Guerra, que se tem vindo a desenvolver usando outros nomes mais imaginativos, pseudónimos que tentam esconder ao que vem, para que não se dê conta, cedo demais, do seu verdadeiro objetivo, minha amiga.

Às portas da terceira década do primeiro século do terceiro milénio d.C., a famígera usa agora, minha cara, nomes diferentes como, por exemplo, cibercrime, terrorismo (um termo que tem vindo a ganhar valoração própria desde o quarto quartel do século XX), nova ordem, “fakenews”, distorção histórica e sensibilidade hipócrita. Há mais, mas estes são apenas padrões entre outros.

Voltemos, amiguinha, à guerra, deste novo século. Desde 2000 que a Bielorrússia e a Rússia assinaram um tratado de cooperação, indicando uma possível formação de uma União Estatal. Esta foi a forma dissimulada com que Putin, com o conluio de Alexander Lukashenko, se tornou dono e senhor da denominada Rússia Branca (tradução de Bielorrússia), mantendo um fantoche no poder.

Foi neste formato, minha querida, num golpe de estado apelidado de tratado, que um país recentemente separado da antiga União Soviética, e a prosperar em democracia, se viu novamente sob o jugo do poder do novo Czar russo, Vladimir Putin. Também sob o jugo russo ficou a Venezuela, graças à forjada reeleição de Nicolás Maduro, em 2018, que se tornou assim um falso democrata. Um ditador que transformou um país próspero numa terra de corrupção (um outro nome da nova Guerra), enfim, numa nação à beira da miséria.

Com Bin Laden, em setembro de 2011, a palavra terrorismo ganhou folego para traduzir mais um aspeto assumido da nova Guerra. Com efeito, doce confidente, por toda a Europa se seguiram atentados, atos terroristas e tentativas de instalar o caos. Culpando o todo pela parte, o Ocidente ganhava uma nova aversão aos árabes, aos muçulmanos e a Guerra, Bertinha, rapidamente adotou os conceitos de racismo, xenofobia, supremacia branca, com rancor pela igualdade de género ou pela liberdade sexual dos indivíduos que tão justamente vinha em crescendo.

Um vento de direita, impulsionado pela revolta (nome oculto da Guerra) fazia renascer o machismo, gerava conflitos religiosos entre católicos, protestantes, evangelistas, muçulmanos, só para citar alguns. Por outro lado, ajudava a conflitos contra o Irão, contra a Rússia, que entretanto ocupou a Crimeia, gerando por toda a parte o aparecimento de líderes sem espinha vertebral, capazes das maiores mentiras e teorias da conspiração, como se tudo fosse, cara amiga, tão normal como beber água. As ideias de direita ajudavam à Guerra e ao conflito.

Subitamente ascenderam ao poder pessoas como Viktor Orbán, na Hungria, Erdogan na Turquia, Donald Trump, nos Estados Unidos, Jair Bolsonaro no Brasil, Benjamin Netanyahu em Israel, e os exemplos não vão parar de crescer, minha querida. Não importa que se prometa, mentido, o paraíso aos carneiros, o sentimento de frustração e abandono dos mais desfavorecidos, dos ignorantes e a ascensão dos oportunistas, vai ajudar a fazer crescer a direita, novamente, como se de uma coisa normal se tratasse, conduzindo a manada que, entretanto, cegou.

A ideia, Berta, é banalizar conceitos antidemocráticos como sendo estes os verdadeiros representantes da nova verdade. Centralizar o poder e voltar a valores arcaicos e feudais de modo a que se possam voltar a instalar ditaduras como se de democracias se tratassem. A guerra agora é outra, mas poucos se dão conta do caminho que está a ser encetado paulatinamente. Enfim, amanhã falarei da fome. Recebe um beijo deste teu amigo do peito,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 335: Os Novos 4 Cavaleiros do Apocalipse - Introdução - I/VI

Berta 335.jpg Olá Berta,

Ao entrarmos na terceira década, do primeiro século do terceiro milénio d.C., pairam no ar notícias de 4 renovados Cavaleiros do Apocalipse. Na verdade, minha cara, embora aparentem ser novos cavaleiros apenas a roupagem é diferente e simplesmente muda a forma e o feitio do embrulho com que nos são presenteados.

Nesta carta e nas próximas 5 seguintes, vou tentar dar-te a conhecer, o melhor que posso e sei, aquilo a que me refiro. Serão, portanto, um total de 6 cartas sobre estes obstinados personagens que nos invadem o quotidiano. Esta é, Bertinha, a carta introdutória de apresentação dos cavalgantes. Antigamente eles eram perfeitamente identificáveis, o primeiro era a Guerra, sempre montada num cavalo malhado de cor indefinida entre o cinza e castanho. 

O segundo era a fome, que galopava embalado pelo primeiro, num garanhão creme, de crina ruiva, quase vermelha, determinado a levar a melhor sobre as gentes que encontrava no seu caminho. Sem se importar minimamente se ao passar devastava ou não, amiguinha, uma população amedrontada que tentava, a todo o custo, sobreviver. Unicamente focado em servir a causa dos 4 emissários.

O terceiro era a peste, que ajudava os 2 primeiros a manter o foco da missão, transportado pelo seu alazão branco, de meias negras, que sem piedade pisava e destruía a saúde daqueles que com ele se deparavam à sua passagem. Tudo porque, doce confidente, o seu objetivo era mesmo o de massacrar seres humanos. Sendo, como todos os outros, absolutamente insensível ao padecimento das suas vítimas, fossem elas homens, mulheres ou crianças.

O quarto era a morte, que trotava uma besta negra reluzente, enorme e possante, suportado pelo apoio dos outros 3 cuja missão era, minha querida, apenas e só ceifar vidas. Um verdadeiro colecionador de almas, corações, corpos e seres. Temido por não poupar nada, nem ninguém, na sua rota devastadora com destino ao abismo dos mortais, relegados à cova escura dos estros sem saudade ou esperança.

O facto de todos eles terem nomes femininos, Berta, era apenas mais um logro. Afinal, guerra, fome, peste e morte eram uma maneira, pouco subtil, de dizerem ao que vinham, sacudindo a água dos seus próprios capotes. Desprovidos de piedade e consciência, toda a vida, escudados nos seus contos e mentiras.

Amanhã, falo-te de como o primeiro destes cavalgantes iniciou o seu adaptado trotar neste princípio do terceiro milénio. Não mudou de nome, apenas adotou mais uns pseudónimos, para tentar passar despercebido no início da sua viagem pelos dias que correm. Deixo-te um beijo de despedida, alma gémea, com carinho, deste teu amigo de sempre,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta: Ensaio Sobre O Beijo - O Colecionador de Beijos (Chiado Books) - Introdução - II/II

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Olá Berta,

Termino hoje, conforme prometido o preâmbulo do “Ensaio Sobre o Beijo – O Colecionador de Beijos”, editado pela Chiado Books, seguindo a última parte da Introdução para que possas concluir a leitura. Só assim se consegue entender a noção completa do tipo de ensaio que quis fazer de algo comum e humano como o beijo, principalmente o beijo com sentimento.

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Também não descuro os anos de aprendizagem, na área das Artes Plásticas, passados com o grande Mestre da Pintura, conhecido como o pai do Neorrealismo em Portugal, Isolino Vaz e com a Pintora Susana Olga e os conhecimentos de Português, Latim e Grego adquiridos desde a infância, com a minha mãe, a Professora Maria José Gil Alexandre. Tudo ajuda na formação das ideias, na produção da criatividade e na elaboração de contos, romances, poemas, ensaios e fábulas. Até na criação de um simples quadro a óleo existe um distinto olhar sobre o mundo e uma perspetiva diferente de o observar.

Mas porque refiro eu, nesta introdução, este tipo de historial pessoal? Apenas é só porque o tempo acumulado no exercício da profissão de jornalista e investigador, a longa viagem de estudos académicos e universitários, a convivência com mestres, criativos e gente das letras e a consequente aprendizagem adquirida, permitiram, por fim, a deteção da falta de sistematização ensaística do beijo, enquadrado enquanto ato sociológico relevante, nas diferentes civilizações da história e da atualidade. É este olhar diferente que me proponho a deixar aqui registado. Porém, conforme já deixei subentendido, nem o tema acaba com as conclusões deste ensaio, nem o beijo se esgota numas dezenas de páginas sobre ele. Mas é um início, um instrumento de trabalho, um princípio, enfim. Depois dos pressupostos apresentados, que por si só justificam a presente escolha, importa sublinhar alguns aspetos relevantes sobre o beijo. Para além de se tratar, por um lado, de um laço do foro privado, entre duas pessoas, ele é, por outro, uma manifestação de cariz público, se bem que com uma relevância absolutamente diferente do anterior. Assim sendo o beijo acontece quer se cumprimente alguém ao chegar a um determinado lugar, quer nas despedidas, quer ainda nos atos de afeto, simpatia, carinho e, como não podia deixar de ser, de amor.

Poderíamos apelidar o beijo de ser o reóstato perfeito do relacionamento humano. Assim, a sua falta assinala com frequência um estado deteriorado de uma relação específica, no caso dos amantes, um historial clínico depressivo, na convivência social ou o estado de uma relação afetiva dependendo da intensidade deste. A deteção destes factos pode ajudar os envolvidos a efetuarem reavaliações e a procurarem corrigir essa falta procedendo ao seu resgate. No plano íntimo ele funciona como uma dança, quando mais se pratica, melhor é a execução e o prazer que dele se extrai.

Porém, nem tudo é positivo, uma pessoa doente pode transmitir através de um beijo, constipações, gripes, sarampo, rubéola, mononucleose e herpes, embora esses problemas não sejam culpa diretamente do beijo, mas sim, do estado clínico de um dos seus participantes.

No que se refere à sua origem, o beijo tem um passado algo obscuro. Não há certezas quando começou a ser praticado, porque se iniciou esta prática, nem mesmo onde é que esta possa ter a sua origem. Os primeiros registos encontrados, onde se faz prova do seu uso têm, porém, cerca de quatro milénios e meio. Com efeito, são de 2.550 a.C. os primeiros registos de beijos, talhados na pedra, pelas paredes dos templos de Khajuraho, na Índia.

Na Igreja Católica, o beijo pode ser um sinal de reverência, ao se beijar, por exemplo, o anel do Papa ou de membros da alta hierarquia eclesiástica. Já os romanos da Antiguidade tinham 3 palavras para beijo, “basium”, “osculum” e “suavium”, se o primeiro se dava entre conhecidos, o segundo era apenas partilhado entre os amigos íntimos e o terceiro destinava-se em exclusivo para os amantes. Aliás, o beijo tinha um papel nas lides do poder romano, com efeito, somente os nobres mais distintos podiam beijar o imperador nos lábios, os restantes tinham de se contentar com um beijo nas mãos e os súbditos apenas tinham direito a beijar o seu soberano nos pés. Efetivamente a partilha de beijos entre guerreiros, quer na Grécia, terra onde o beijo tinha um papel fundamental, quer em Roma, era comum no regresso das campanhas. Consta, também, que na Suméria, a antiga Mesopotâmia, os beijos serviam como prendas aos deuses.

Já na Rússia Czarina o beijo era uma verdadeira demonstração de poder porque, um beijo do Czar, traduzia uma das mais prestigiadas honras imperiais. O beijo era tão importante que, por exemplo, em França, no decorrer do século XV, os nobres tinham o privilégio de poderem beijar todas as mulheres que quisessem. Porém, na Itália medieval, um homem cavalheiro que beijasse uma dama em público era imediatamente obrigado a contrair o matrimónio, o assunto era tão sério que o costume se espalhou a uma grande parte do povo. Porém, na Escócia medieval era costume o padre beijar os lábios da noiva no final da cerimónia de casamento para haver felicidade conjugal.

Durante o copo de água, e ainda em prole da felicidade, a noiva devia beijar na boca todos os homens presentes, trocando cada beijo por uma quantia em dinheiro.

No caso português, e já no Brasil, D. João VI introduziu a cerimônia do beija-mão. Assim, em determinados dias, o acesso ao Paço Real era conferido a todos os que desejassem apresentar alguma demanda. Nessa ocasião, em sinal de respeito, tanto os nobres, como o povo, e até os escravos, tinham que lhe beijar a mão direita antes de fazerem o seu pedido. Esse costume foi mantido por D. Pedro I e por D. Pedro II. Porém, a troca de beijos entre portugueses e índias, no Brasil, era mal visto por estas, que achavam o ato nojento, quer por estarem habituadas a cheirar o corpo do parceiro, em busca das feromonas do sexo oposto, em vez de usarem os beijos, quer porque contraíam uma parafernália de maleitas vindas do continente europeu por via dessa troca.

Podemos encontrar o beijo representado e apresentado nas diferentes formas de arte, seja na pintura onde o génio da pintura Gustav Klimt deu cartas, como escultura, com Rodin, na literatura com imensos autores de diferentes épocas, na sétima arte e nas redes sociais. Pelo que investiguei o beijo propaga-se cada vez mais pelo mundo e até já tem um dia próprio. O Dia Internacional do Beijo a 13 de abril de cada ano. O ato de beijar em público é generalizado no mundo ocidental e nos territórios ocidentalizados dos diferentes continentes, mas cerca de dez por cento da humanidade simplesmente não usa o beijo e cerca de vinte e cinco por cento só o faz na esfera privada e íntima. O oriente é a zona do globo onde a prática pública do beijo apenas se encontra nas grandes urbes e mesmo aí, vê-se quase exclusivamente entre casais jovens ou em grupos onde a presença de pessoas de mais idade não se verifica.

Porém, o mais comum, hoje em dia, na cultura ocidental é o beijo ser considerado um gesto de afeição. Entre amigos, é utilizado como cumprimento ou despedida e entre amantes e apaixonados beija-se como prova da paixão, de agrado ou de dedicação. Resta-me desejar uma boa leitura deste ensaio jornalístico e literário, onde se apresentam, numa visão possivelmente esclarecedora, 435 beijos, esperando que este livro possa contribuir para um melhor entendimento cultural e sociológico e uma mais apurada compreensão das afinidades e das consequências desse fenómeno espetacular a que chamamos beijo. Mas passemos ao conteúdo...

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Fico curioso por saber a tua opinião, contudo, escrever sobre os beijos, amiga Berta, é falar de sentimentos, de intimidade, de partilha entre humanos, independentemente do sexo ou da idade, apenas tendo em conta as emoções que os promovem. Fica mais um deles para este adeus, do teu eterno amigo,

Gil Saraiva

 

 

 

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