gilcartoon n.º 1060 - Miga, a Formiga: Série "Dah!" - Bocas Foleiras: A Lista de CR7
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Olá Berta,
Hoje, por estes dias que vimos atravessando, existem quatro tipos de notícias. As primeiras, que nos chateiam porque somos impotentes para lhes pôr um fim, são as que se referem à invasão da Rússia à Ucrânia.
O país não deixou de ser solidário, amiga Berta, nem de estar do lado dos mais fracos, de apoiar os oprimidos e detestar os opressores, nada disso, o país está é farto de notícias miseráveis que exploram a guerra até ao tutano, uma guerra a que apenas podemos assistir de sofá.
Ouvimos dizer que a Europa está unida. O que une estes povos, contudo, minha querida, pouco tem a ver com solidariedade e muito deve à necessidade de manutenção dos níveis de vida de cada um dos países em si mesmos. É cínico? Muito. Mas é verdade. Tudo o resto é espetáculo mediático. No entanto, para as pessoas, a coisa tem elevados padrões solidários e é disso que todos os governos se aproveitam, embora ninguém o assuma publicamente, porque, no mínimo, seria egoísmo.
O segundo tema destes tempos quentes são as alterações climáticas, a seca, os fogos, o calor extremo. A comunicação social pela-se por colocar um bom bosque a arder na sua magnificência. Se aparecerem umas casas a arder e umas velhotas a chorar então, Berta, a cereja é colocada no topo do bolo. Até parece que lhes agrada a desgraça dos outros.
E nós, o povo, genuinamente solidário, engolimos todas as notícias sem sequer nos apercebermos que são exploradas até ao tutano, em prole de audiências ou de maiores tiragens de jornais nos pasquins deste nosso mundo.
O terceiro assunto envolve política. Este é, aliás, um tema, minha querida Berta, que dura todo o ano e que é algo de que todos estamos fartos, mas que afeta o nosso dia-a-dia. Sejam as tomadas de posição dos diferentes partidos políticos, sejam os atos dos dirigentes de outros países ou dos nossos, a comunicação social raramente informa sobre o que de bom acontece no mundo, mas vende facilmente a informação do que correu errado ou foi corrompido ou que possa vir a acabar de forma menos boa.
O quarto grande assunto estival é o desporto, nesta altura com imenso destaque para o futebol, com o mercado das transferências aberto e os clubes a formarem as equipas que apresentarão já em agosto próximo, minha amiga. Mas tudo sempre muito manipulado, cheirando a desgraça alheia, como se o povo a quem a comunicação social se dirige não estivesse já farto de desgraça em todo o lado.
Pois é Berta, a matemática de hoje é usada para estudar o que nos move e comove e nos faz consumir qualquer porcaria que nos queiram impingir. Claro que tem de vir devidamente embrulhada. Nós, infelizmente, aderimos ao processo calculado em computadores caros que acedem ao nosso modo de vida sem pedirem licença.
Um conjunto de coisas, mais ou menos abstratas para o cidadão comum, como matemática, estatísticas, rankings, algoritmos, padrões, comportamentos, psicologia emocional, probabilidades, perfis, e mais uma parafernália de ferramentas são interligadas e trabalhadas por forma a conseguirem, em última análise, influenciar o nosso comportamento, sem que nós mesmos demos conta de que estamos a ser manipulados por um produto ou algoritmo, traduzido em uma qualquer aplicação, publicidade, produto ou apresentação.
Ás vezes penso no que diriam as grandes mentes da história da humanidade, que viveram antes da revolução industrial se pudessem comentar o nosso quotidiano e atualidade. Tenho a certeza que de Platão a Camões e até a outros pensadores bem mais recentes, seriamos apelidados de idiotas ou de algo muito parecido com isso. Por isso, minha querida Berta, o meu conselho, antes de me despedir, é: antes de fazermos algo ou comprarmos algo, pensarmos se realmente isso ou aquilo nos interessam realmente ou se nos estamos apenas a deixar levar… fica com um beijo,
Gil Saraiva
Olá Berta,
Este é um regresso ainda tímido de férias. Enviar-te-ei uma ou outra carta durante o mês de setembro, mas efetivamente estava mesmo a precisar desta paragem criativa. Como diz o povo, e bem, eu estava a precisar de recarregar baterias. O tema de hoje é sobre Cristiano Ronaldo.
Um matemático bastante premiado e igualmente excêntrico da prestigiada Universidade de Oxford, no Reino Unido, afirma ter provado matematicamente que CR7 é o melhor jogador de futebol de todos os tempos. Ora, como diz o povo, mais uma vez, se está provado é porque deve ser, mesmo se o cientista em causa tem ar de derivar do cruzamento de Albert Einstein com a cantora Lady Gaga.
Ora, minha querida amiga Berta, a fórmula criada para um algoritmo por Tom Crawfort (que me lembra, não sei porquê, Lara Croft no filme Tomb Rider) prova que Cristiano Ronaldo é o melhor jogador de sempre, enquanto Messi e Pelé são os seus companheiros de pódio. Destaco que o matemático da Universidade de Oxford, no Reino Unido, criou esta maravilha da matemática para determinar quem é o melhor jogador de futebol de sempre e pôr um ponto final numa eterna discussão sobre o tema. Segundo o próprio professor surreal não restam dúvidas, se as houvesse, que Cristiano Ronaldo é o melhor de todos os tempos, quer se goste ou não do nosso herói.
Consultando o pódio, que acompanha a ilustração desta carta, podemos constatar que depois do nosso jogador internacional estão, obviamente, Lionel Messi, e o brasileiro Pelé. Porém, para surpresa certa do povo argentino, fora do pódio fica Diego Maradona, o que significa que, para este povo da América do Sul, a matemática deve ser uma batata e que eles optam por escolhas mais divinas ou coca-dependentes, como parece efetivamente ser o caso concreto e sem grandes dúvidas temáticas.
Segundo as “Notícias ZAP” do portal nacional da aeiou.pt, amiga Berta, o estudo foi encomendado pelo LiveScore, um dos líderes entre os fornecedores mundiais de informações desportivas em tempo real. O próprio LiveScore confirma que foram analisadas dezenas dos jogadores de futebol mais importantes da história, desde o início da modalidade, confirma igualmente que a escolha dos critérios foi criteriosamente avaliada tendo gerado sete parâmetros de dados fundamentais.
Desta avaliação resultou que os principais elementos que elevaram a fasquia para Cristiano Ronaldo foram os seus títulos nos clubes, os golos internacionais e recordes individuais, tendo o atleta criado, com estas escolhas de avaliação uma pequena, mas determinante vantagem sobre todos os seus adversários mais próximos. Segundo o avaliador, querida amiga, para melhor entendimento dos leitores, a lista dos dez melhores jogadores de sempre foi apresentada em percentagem, onde 100% é a maior pontuação possível.
Tom Crawfort, o invulgar professor e teórico matemático da Universidade de Oxford, revela na sua entrevista, minha querida Berta, que adora aplicar a matemática em temas que possam suscitar o interesse das pessoas e que para isso escolhe temas de interesse de cariz popular ou generalizado pelas redes sociais. Afirma mesmo que, nos últimos anos, tem sido muito divertido gerar respostas matemáticas para estas temáticas e que o futebol não podia ficar de fora das suas escolhas evidentes.
Numa entrevista ao “Soccerex”, Tom Crawford explicou que, embora Cristiano Ronaldo tenha ficado no topo do seu algoritmo, é claro que as estatísticas de todos os outros jogadores foram absolutamente incríveis, e que está certo que o debate vai continuar. Na sequência da mesma entrevista o diretor de marketing do LiveScore, Ric Leask, afirmou que:
“Pela primeira vez, queríamos aplicar a ciência da matemática para nos ajudar a resolver a questão eterna, e tem sido fascinante ver o professor Tom Crawford falar sobre os números em nome de milhões de fãs em todo o mundo.” Tendo ainda afirmado que “O índice é muito mais do que uma pontuação; para nós, ajuda a encerrar um debate que se arrasta há gerações. Em maio, apoiamos o nosso homem ao revelar Cristiano Ronaldo como o nosso embaixador mundial da marca e agora sabemos com certeza que temos a matemática do nosso lado.”
De notar ainda, querida Berta, que os sete parâmetros adotados como critérios e tidos em conta foram:
1- Golos por Clubes,
2- Títulos por Clubes,
3- Golos por Seleções,
4 - Títulos por Seleções,
5 - Bolas de Ouro,
6- Recordes Individuais
7- Épocas Fator-Z — um nome atribuído ao impacto de um jogador nas competições nacionais e internacionais que, de forma significativa, o tornam superior, relevante e único, num determinado ano, quando comparado com os demais jogadores, num período temporal de cinco temporadas consecutivas.
A este último fator eu teria dado o nome de o “Ano de Génio”, mas isso sou eu que não sou matemático nem tatuado. Espero que a temática de hoje te tenha agradado, minha querida Berta, neste meu ainda tímido regresso a estas nossas cartas. Despeço-me com um beijo saudoso,
Gil Saraiva
Olá Berta,
O Sporting é Campeão da Primeira Liga de Futebol Profissional em Portugal. Como benfiquista que sou é com desportivismo que dou os parabéns aos verdes e brancos. Até ao momento trata-se de um campeonato ganho sem derrotas, sem espinhas e sem qualquer margem para dúvidas. Ganhou o melhor e, este ano, o melhor foi o Sporting Clube de Portugal. Cabe aos leões a glória de invadir o Marquês.
Não é fácil passar dezanove anos sem levantar o caneco. Nem mesmo é simples de assimilar que nos últimos cinquenta anos que o Sporting apenas por seis vezes tenha conseguido chegar ao topo. Nada melhor do que, depois de ter acabado de se tornar Campeão Europeu de Futsal, o clube de Alvalade veja o ano coroado com a glória de se tornar número um no futebol profissional português. Não há como não dar os parabéns, reforço e enfatizo, ao Sporting Clube de Portugal pelo feito.
A obra de arte ganha foros de ironia e escárnio quando se sabe que o treinador foi um ex-jogador do Benfica, um tal de Ruben Amorim, que conduziu com mestria os leões novamente ao estatuto de reis da selva, dividindo a glória com uma equipa de miúdos nos quais depositou confiança e que conseguiram envergonhar Luís Filipe Vieira, Jorge Jesus e meter num saco sem fundo os cem milhões que este ano a SAD benfiquista gastou em jogadores.
Já eu, minha querida amiga Berta, que não queria de novo o Jorge Jesus no Benfica, sinto que foi feita justiça este ano. Custa assumir, é um facto, mas não deixa de ser a verdade, independentemente da tristeza que me invade a alma e o coração.
Resta-me o consolo de não ter sido o Futebol Clube do Porto a ganhar. Esse é, por força dos factos, o grande e verdadeiro rival do Benfica. Espero, como sempre se espera nos três grandes, que para o ano tudo seja diferente. Mas hoje não é dia de carpir seja o que for. Há um novo campeão nacional que merece festejar à grande e ao som da Portuguesa.
Resta-me deixar uma palavra ao Governo e em particular à DGS. Isto de vir para a imprensa dizer aos sportinguistas para terem contenção na celebração da vitória do campeonato, aliás, acompanhada por um apelo idêntico do Presidente da República, é uma forma idiota de fugir às responsabilidades. Há que tempos que o Estado sabe que este dia estava para chegar. Se querem contenção que criem os mecanismos policiais de segurança de forma a coordenarem e controlarem, da melhor maneira possível, os festejos e que não atirem para cima de quem não celebra à 20 anos o ónus da incompetência. Mais uma vez: PARABÉNS SPORTING! Despede-se com um sorriso amarelo, querida Berta, este teu amigo,
Gil Saraiva
Olá Berta,
Vem aí o arranque da primeira grande cruzada desportiva do país para uma projeção e afirmação internacional em 2021. Estou a falar da Liga das Nações com os próximos jogos a acontecerem em setembro. Fernando Santos, o selecionador nacional já divulgou os convocados. Sinceramente, minha querida Berta, eu espero que o treinador se mantenha como um homem de fé aos comandos dos lusos cruzados.
Contudo, e acima de tudo, conto que continue bem afastado dos vendilhões do templo das previsões. Estou a falar de gente como os astrólogos, os cartomantes, os videntes e os outros nigromantes, que pululam no seio da nossa comunicação social. Gente sem conhecimentos ou escrúpulos, que apenas cumprem o papel de denegrir as ciências ocultas. Se falo disto agora é porque ainda não me esqueci das previsões dessa gentinha oportunista, no final do ano passado, sobre a maravilha de ano que Portugal iria ter em 2020, um ano que foi, sem margem para discussões, o pior ano da democracia portuguesa ou até o pior desde a implantação da República em Portugal.
Volto à Seleção Portuguesa de Futebol e ao treinador, Fernando Santos, que anunciou ontem, na Cidade do Futebol, a lista de convocados para os jogos da Seleção Nacional diante da Croácia e da Suécia, a contar para a Liga das Nações, prova que Portugal já ganhou em 2019.
O Selecionador tem de preparar os convocados para 2 embates. A equipa da Lusitânia enfrenta a Croácia no dia 5 de setembro, às 19h45, no Estádio do Dragão, naquele que será o primeiro jogo durante a pandemia e passados 3 dias será a vez de competir com a Suécia, em Solna, também às 19h45.
Verificou-se, amiga Berta, a chamada de alguns novos elementos ao plantel, conforme poderás comprovar na lista que apresento de seguida. Porém, pessoalmente, gostaria de dar as boas-vindas a Trincão, de quem espero grandes coisas nesta caminhada que se avizinha.
CONVOCADOS:
Guarda-redes: Anthony Lopes, Rui Patrício e Rui Silva.
Defesas: João Cancelo, Domingos Duarte, Nélson Semedo, José Fonte, Pepe, Rúben Dias, Mário Rui e Raphael Guerreiro.
Médios: Danilo Pereira, Rúben Neves, André Gomes, Bruno Fernandes, João Moutinho, Renato Sanches e Sérgio Oliveira.
Avançados: André Silva, Bernardo Silva, Cristiano Ronaldo, Diogo Jota, Gonçalo Guedes, João Félix e Trincão.
São estes os novos cruzados da Ordem Templária da Grande Bola, chamados para os próximos 2 jogos. Os que ainda não foram batizados pelo Grão-Mestre Fernando Santos, sê-lo-ão nos próximos dias e passarão a conhecer o Profeta.
Santos, o Supremo Líder do Esférico Luso, irá, uma vez mais, lançar os seus acólitos na demanda da Santa Taça Futebolística das Nações, imbuído da sua inabalável fé nos céus e nos seus bravos cruzados. O caminho pode ser árduo, mas nunca vi, em toda a minha existência, alguém com tamanho acreditar nesta que, não sendo uma guerra santa, nem tendo os adversários como inimigos, é uma luta pelo brio e glória nacional. É isto, e a passagem deste testemunho às tropas, que faz de Fernando Santos o nosso mais bem-sucedido Marechal da Redondinha.
Espero, sinceramente, que a RTP 1 cumpra o serviço público para a qual se mantém como televisão pública nacional e que transmita ambos os jogos. É com estes votos que deixo um beijo amigo de despedida,
Gil Saraiva
Olá Berta,
O tema da violência policial, aqui há uns anos abordado em Portugal, por causa do espancamento abusivo e injustificado de um adepto de futebol, que pacificamente transitava na rua, perto de uma zona onde tinham acabado de acontecer diversos distúrbios sociais ligados a um jogo, já fez correr alguma tinta no país. Porém a coisa agrava-se quando juntamos a isto a palavra racismo.
O Renascer do Racismo com o Populismo de Direita
A ascensão de André Ventura nos meandros da política pode tornar este afastado e quase esquecido episódio numa prática, assustadoramente corrente, num abrir e fechar de olhos.
Com efeito, amiga Berta, os discursos de Ventura apontam para o desejo de transformação das nossas forças de segurança e não só, numa polícia de intocáveis, ameaçando a população civil com prisão, se ousarem, quiçá, insultar polícias ou magistrados.
O rastilho foi recentemente aceso com o caso do homem de raça negra que clemente dizia: “não consigo respirar”. Um homem que morreu pelo joelho de um polícia, que não abrandou, por mais de 8 minutos a pressão intencional, que exercia sobre o pescoço da vítima. Foi assim que morreu George Floyd, um óbito registado por telemóvel para o mundo ver, se poder indignar e, finalmente, condenar publicamente. A situação decorreu nos Estados Unidos da América, o país da alegada liberdade, e tem gerado protestos de revolta à escala mundial.
Para acicatar ainda mais os ânimos o Presidente Americano, um tal de Donald Trump, ordena à polícia que desmobilize uma manifestação pacífica perto da Casa Branca, a fim de atravessar a rua e, usando uma igreja como fachada, vir mostrar a bíblia, enquanto promete retaliação repressiva aos manifestantes revoltosos que considera terroristas.
Uns graus de latitude mais abaixo, a situação piora quando, também neste passado mês de maio, se descobre o macabro caso de um jovem de 30 anos, abatido pela polícia mexicana por resistir, imagine-se, ao uso de máscara na via pública. O facto foi ocultado por uns dias graças a uma tentativa de suborno, com pagamento de cerca de 8 mil euros à família, sem recursos, da vítima, mas acabou por ser denunciado e exposto na praça pública.
O infeliz sujeito chamava-se Giovanni López, a sua detenção foi filmada pelo irmão da vítima, que só o voltaria a ver, já morto, no hospital da cidade onde foi declarado o óbito. A tentativa de suborno foi imaginada e conduzida pelo perfeito da cidade que agora se encontra a ser, também ele, investigado. A indignação disparou com o galardoado, com o Óscar de melhor realização de 2018, Guillermo del Toro, a demonstrar publicamente a revolta perante o sucedido na sua terra natal. Estes acontecimentos obrigaram o Governador do Estado de Jalisco a vir a público prometer que os culpados serão punidos, a meu ver, minha amiga, tarde de mais, uma vez que a indignação já invadiu as ruas.
A tempestade perfeita parece formar-se quando, mais uns graus de latitude abaixo do México, mas precisamente na mesma altura, no maior país da América Latina, o Presidente da República do Brasil, que responde pelo inconcebível nome de Jair Bolsonaro, vem afirmar publicamente, e perante a televisão, que os grupos de populares que se manifestam contra ele, e contra o seu Governo, são não apenas marginais como também terroristas. Tudo a acontecer num país onde 9 em cada 10 dos mortos causados pela polícia brasileira no Rio de Janeiro são negros ou mestiços.
Numa altura em que muitos observadores internacionais apontam para a possibilidade crescente de o Brasil descambar numa guerra civil, entre os apoiantes do Presidente e os que o condenam, tudo parece cozinhado para uma monstruosa crise, sem precedentes, no admirável novo mundo.
Por enquanto, os reflexos desta violência irracional em Portugal, não nos remetem nem para a gravidade dos acontecimentos vindos das Américas, nem apontam ainda qualquer possibilidade de que isso possa transpirar para esta terra de costumes pacíficos, onde apenas o ex-comentador benfiquista da CmTV, o alegadamente mentecapto André Ventura, tenta gerar alguma exaltação de ânimos. Mesmo assim, seria interessante tentar saber se, após este último empate do Benfica em casa, frente ao Tondela, a posterior vandalização das casas de Bruno Lages, Pizzi e Rafa têm ou não a ver com o papel inflamatório do ex-comentador televisivo e atual deputado do Chega. Contudo, importa relembrar que, desde que este fulano apareceu a divulgar as suas ideias e baboseiras na praça pública, pelo menos a partir do verão de 2018, os relatos têm vindo a ganhar gravidade e frequência. Coincidência ou não, o inflamador não se livra da sombra que a ele se colou.
Quem é que já se esqueceu do raid levado a cabo pela polícia de Alfragide à Cova da Moura, que terminou com a detenção de um grupo de indivíduos de raça negra, que foram posteriormente sovados no interior da dita esquadra, e cujo caso ainda continua aberto e em julgamento? Ou da senhora também de raça negra que, por causa de um bilhete de autocarro, se viu terrivelmente maltratada e sovada pela polícia na Amadora, cujas notícias fizeram furor no início deste ano?
Ainda há também o vídeo de outro jovem de raça negra, maniatado pela polícia e a ser obrigado a respirar o fumo de escape de um automóvel ou o outro individuo da mesma raça, no final de janeiro, filmado por duas turistas a ser detido, enquanto um polícia proferia “tens um ar suspeito”, à noite na baixa de Lisboa, perante a suplica do fulano alegando nada ter feito. No entanto, não escapou a uma revista pública efetuada abusivamente por 4 polícias, que depois o levaram preso, sem nada ter sido aparentemente encontrado.
Uma coisa é certa, eu, querida Berta, sou dos que não acredita em coincidências. Não é difícil gerar descontentamento à boleia da pandemia, do aumento do desemprego e da chegada anunciada da pior recessão das últimas décadas a Portugal. Se queremos manter o equilíbrio pacífico e ponderado que nos carateriza maioritariamente enquanto povo temos, urgentemente, de pôr um ponto final nas carreiras públicas daqueles que, usando de um populismo demagogo, tentam criar o conflito e o confronto. Basta olhar as sondagens para ver que a mediocridade medra facilmente e isso é realmente uma grande merda.
Será mera coincidência que, com tanta ocorrência, nos últimos 10 anos, não exista um único caso de condenação policial por atitudes racistas, pese embora as variadíssimas queixas da Amnistia Internacional e do SOS Racismo sobre os vários e frequentes casos em Portugal?
Já me sinto melhor depois de desabafar. Este teu amigo despede-se com um beijo de saudades,
Gil Saraiva
Olá Berta,
Este domingo fica marcado pelo abandono do jogo por parte de Marega, jogador avançado do Futebol Clube do Porto, de raça negra que, segundo alega, foi insultado pelos adeptos do Vitória de Guimarães, no estádio deste clube, com observações racistas nas quais se incluem a utilização de palavras como “preto”, “macaco”, “chimpanzé”, para além dos sons da selva, produzidos em coro, a tentar imitar os símios no seu ambiente natural.
A coisa durou desde a fase de aquecimento para o jogo até ao momento em que Marega abandonou o relvado, não sem antes elevar os dedos do meio de ambas as mãos para a zona da bancada de onde provinham os insultos. Como resultado, voaram cadeiras para dentro de campo, tendo o atleta usado uma delas para se proteger, colocando-a na cabeça, o que lhe valeu um cartão amarelo.
Mais tarde, no Instagram, o jogador publicou a seguinte mensagem: “Gostaria apenas de dizer a esses idiotas que vêm ao estádio fazer gritos racistas: vá-se foder”. Bem esclarecedora do significado dos dedos ao alto anteriormente erguidos ainda em campo. No mesmo comentário ainda agradeceu com ironia a forma como o árbitro do encontro foi solidário com os insultos que lhe foram proferidos “…E também agradeço aos árbitros por não me defenderem e por terem me dado um cartão amarelo porque defendo minha cor da pele. Espero nunca mais encontrá-lo em um campo de futebol! VOCÊ É UMA VERGONHA!!!!”
O apoio a Marega veio rapidamente da Presidência da República, do Governo, através do Primeiro Ministro e da maioria dos partidos com assento parlamentar. Também o universo do futebol nacional se mostrou solidário com o jogador, incluindo o próprio Vitória de Guimarães. Os apoios ao futebolista espalharam-se rapidamente na sociedade civil e ficaram bem espelhados nas redes sociais. Todo o mundo tentando deixar claro que o racismo é algo residual na sociedade portuguesa.
Eu considero que Marega tem toda a razão para se sentir ofendido, não apenas pela claque que o insultou, mas também pela arbitragem, que falhou redondamente no que concerne à atuação e aplicação do que são as normas defendidas e definidas pela FIFA para este tipo de comportamentos.
Só não concordo com a resposta de Marega. As duas mãos ao alto, de dedos em riste e o que escreveu no Instagram, não são, nem podem nunca ser, a resposta adequada à exigência de respeito, por parte do atleta. Há que deixar a justiça desportiva ou mesmo a nacional fazerem o seu trabalho e não responder ao mesmo nível, sob pena de se perder a razão. E se agora a claque colocar uma ação por ter sido mandada para o “pirilau” pelo jogador?
Ora bem, abandonando o desporto e voltando às nossas quadras populares sujeitas a mote, o teu desafio às minhas capacidades poéticas, achei graça ao facto de teres escolhido “Jogar pelo Seguro” logo hoje que falei de futebol. Aqui vai a minha quadra do dia.
Série: Quadras Populares Sujeitas a Tema - 20) Jogar pelo Seguro.
Jogar pelo Seguro
Se amor ou paixão houver
Nesse homem que te prendeu,
Vê primeiro o que ele quer,
Vê primeiro se ele é só teu…
Gil Saraiva
Com isto me despeço, esperando que tenhas tido um excelente fim-de-semana, recebe um beijo deste teu amigo do peito,
Gil Saraiva
Olá Berta,
Hoje vou-te confessar uma coisa. Acho que Portugal, genericamente, enquanto país, é um assassino calculista. Deves estar a interrogar-te: “—Que raio de conversa é esta?”. Contudo a coisa é simples. Desde que se realizou o sorteio da UEFA para apurar os grupos da primeira fase do Euro 2020 e se ficou a saber que estávamos no chamado Grupo da Morte, juntamente com os 2 últimos campeões mundiais, a Alemanha e a França, que eu tenho cá o palpite que ambos vão morrer nas mãos, aliás, nos pés, da nossa seleção.
Daqui a 6 meses e meio, quando jogarmos o primeiro jogo do Euro, a 16 de junho, e depois a 20 e a 26, vamos passar a ser conhecidos como os tomba-gigantes. Pelos comentadores e analistas que ouvi nos últimos 2 dias, as nossas hipóteses de sobrevivência no grup,o são tão remotas como a deputada do Livre ser beatificada pelo Papa.
Ora, eu acho precisamente o inverso. E na devida altura, tiraremos a prova dos 9. Cá para mim, vamos mesmo ser sanguinários, a lembrar a letra dos “Vampiros” de Zeca Afonso: “No céu cinzento, sobre o astro mudo, batendo as asas na noite calada, vêm em bandos com pés de veludo, chupar o sangue fresco da manada…” para terminarmos no refrão: “Eles comem tudo, eles comem tudo. Eles comem tudo e não deixam nada. Eles comem tudo, eles comem tudo. Eles comem tudo e não deixam nada.”.
Pois é Berta, até os comemos. Veremos brevemente quem tem razão. Se eu, se os especialistas do nosso burgo, que traçam a tragédia Lusa nos écrans das televisões, antes de algum drama acontecer.
Pode até ser que o nosso seja o Grupo da Morte, mas nele, o carrasco frio e insensível chama-se Portugal. Temos uma série de jogadores em franca ascensão e vamos ter um Cristiano Ronaldo no máximo da sua forma. Vamos vencer, como fizemos em Aljubarrota e o Santo Condestável chamar-se-á Ronaldo. Duvido que o Papa Francisco o beatifique, tal como duvidava do mesmo, relativamente à deputada do Livre, mas acho que a imprensa o vai glorificar.
Aliás, como aconteceu com Jesus no Flamengo, que além de ter Deus como assessor, tinha a ganha de vencer e prevalecer, por muito que os arautos da desgraça e dos oráculos o condenassem ao fracasso. Em menos de 24 horas, talvez sob a graça de um Espírito Santo, chamado torcida do Mengão, o homem ganhou, como por milagre, um milagre chamado trabalho e acreditar, a “Taça dos Libertadores” e o “Brasileirão”, para espanto dos comuns mortais.
Todos o aconselharam a não aceitar o desafio e o homem foi, como quem enfrenta o Adamastor no Cabo das Tormentas. Foi, viu e venceu, porque é essa a fibra do ser Luso. Agora bruxas e adivinhos profetizam-lhe a nova desgraça no Mundial de Clubes, conta um tal de Liverpool, veremos se, relembrando Camilo Castelo Branco, se tratará da “Queda de um Anjo” ou se estamos perante um novo Vasco da Gama nos Lusíadas do futebol mundial.
O mesmo se irá passar com um tal de Fernando Santos, que leva uma legião de 23 anjos, para enfrentar as hordas selvagens de franceses e alemães. O sabor da vitória ganha proporções de rara iguaria quando o desafio é mais difícil, mas, como eu costumo dizer, minha querida amiga Berta, o impossível apenas demora mais tempo.
Despeço-me com um beijo e saudades, este teu amigo,
Gil Saraiva
Olá Berta,
Deves estar, como eu, satisfeita com o nascimento e ascensão aos céus de mais um herói nacional, desta vez não aqui no nosso pequeno burgo, mas pelas paisagens imensas das terras de Vera Cruz.
Jesus é louvado pela imensidão de gente rubro negra que parece ter invadido o Brasil. Para onde quer que ele vá, será seguido por muitos e muitos anos por essa massa gigantesca de fãs que lhe reconhecem a audácia de um verdadeiro “Mister”, e que só não o naturalizaram já, porque a pronúncia do mesmo dificulta a confusão.
O Brasil é hoje terra de um povo libertado depois de 38 de um Flamengo sem ganhar a Taça dos Libertadores. Nem mesmo o pulmão amazónico, a definhar a olhos vistos, parece calar o pulmão recém-nascido de uma gente imensa, de milhões e mais milhões, que canta bem alto a palavra vitória, enaltecendo com rubor as faces pálidas de um homem da Amadora, que quis a sorte chamar-se Jesus.
Jorge Jesus vai voltar ao velho continente com o “Brasileirão” ganho e a Taça dos Libertadores debaixo do braço. Volta, porque para ser eternizado não pode manter-se no posto e fazer menos do que acabou de alcançar. Volta, porque a demanda disparou na Europa. Já se fala que o querem em Inglaterra e há quem diga que ele será o próximo treinador do Barcelona. Volta, porque quer ser lembrado eternamente.
Volta, para pena minha, que preferia vê-lo a representar a nossa bandeira fora do país. Eu admiro o Jesus que conseguiu vingar no Brasil, aplaudo e incentivo esse Jesus, porém, sou dos que continuam a achar que ele não devia, jamais, regressar ao Benfica. Há os que me recordam que ele ganhou 3 campeonatos pelo clube, mas eu sou dos que pensa que ele perdeu 3 campeonatos pelo Benfica e mais a final de uma Taça UEFA.
Contudo, este meu raciocínio não tira qualquer mérito ao treinador. Apenas não me agrada ver um iletrado a liderar a minha equipa, o que muito provavelmente tem a ver com o facto de eu me considerar um intelectual. Manias de um Gil, minha querida Berta, preocupado não apenas com o conteúdo, mas também com a forma, de quem lidera o seu clube de coração.
Se o homem for realmente para o Barcelona vou torcer por ele com todas as minhas forças, exatamente como o fiz no Brasil. A simplicidade do treinador faz escola, tem o seu mérito e não lhe deveria ser pedido, nem por mim, que vire Camões ou que tenha o dom da oratória e a cultura geral de um Lobo Antunes. Todavia, eu sou assim, prefiro o herói fora de portas. Talvez o defeito seja meu, não digo que não, mas o que importa é que a saga de Jorge Jesus se mantenha viva, levando consigo o nome de Portugal. Afinal, ninguém lhe pede uma pós-graduação em gramática para que seja um treinador de nível 4, cujo sucesso anda agora perto do 10.
Regressando aos feitos conseguidos pelo herói no Brasil, penso que se passarão muitos anos até que um outro português o consiga repetir naquelas paragens. E, mesmo assim, jamais será igual, porque Jesus o fez primeiro que todos com a garra de um puro Lusitano, nos últimos minutos virando uma desvantagem, na reviravolta da glória de um jogador, um tal de Gabigol. É assim que se escreve história.
Desejo que Jesus continue o seu galope, de crina prateada ao vento, em gestos gritados para dentro de um campo de flores sem tempo. Desejo-lhe felicidades e vitórias, desejo-lhe boa sorte.
Despeço-me, minha querida Berta, saudoso, este amigo que não te esquece,
Gil Saraiva
Olá Berta,
Perguntar-te se estás bem parece-me desnecessário visto que ainda ontem conversámos. Conto que continues fina e alegre como sempre te conheci. Não sei se tens acompanhado as notícias do nosso país irmão. Irmão, digo eu, porque para alguns brasileiros somos mais um primo afastado, quase desconhecido, que interessa manter longe da restante família. Mas esses são a exceção, pelo menos eu prefiro pensar assim.
Ontem, um tal de Jesus, adotado pela enorme massa adepta do Flamengo, conseguiu cumprir mais um jogo vitorioso frente a um Bota-Fogo, constituído principalmente por caceteiros profissionais. Porém, o Mister continua, serenamente, passo a passo, a fazer a sua caminhada em direção à consagração. Uma tarefa impressionante, tendo em conta que a média de sobrevivência de um treinador pelas terras do samba é de 4 meses, mais coisa menos coisa.
Quando Jorge Jesus chegou ao Brasil, para treinar o Mengão, este estava a 8 pontos de distância do primeiro lugar e a Taça dos Libertadores era uma miragem muito ao fundo de um negro túnel sem ponta de visibilidade.
Hoje, a 7 jogos do final do Brasileirão, o Flamengo, tem 8 pontos de vantagem sobre o segundo classificado, o Palmeiras, Jesus, que já bateu o recorde de pontos no campeonato, continua a sua escalada em ascensão a caminho do título. Em pouco mais 3 meses e 3 semanas, o treinador recuperou 16 pontos e está já apurado para a final da competição favorita de todos os brasileiros, a Taça dos Libertadores, disputada entre os melhores clubes dos diferentes países da América do Sul, que muitos consideram uma espécie de Liga dos Campeões do continente sul americano.
Eu, que nunca fui fã de Jorge Jesus, desde que ele saiu do Sporting de Braga, vejo-me agora a torcer pelo homónimo do Cristo Rei, com ganas de adepto fervoroso. Ai-ai, as voltas que a vida dá, minha querida amiga. Com a minha idade já devia ter aprendido a ficar calado porque nem sempre se pode dizer “desta água não beberei” com certezas absolutas.
Outra notícia que me espantou foi a da libertação de Lula da Silva, o ex-Presidente do Brasil. Aconteceu hoje. A ordem foi dada e cumprida no próprio dia. Embora muita gente considere o homem um corrupto, que fez e que aconteceu, eu, que acompanhei o caso com a máxima atenção, continuo a pensar que o julgamento foi político e não criminal. As provas apresentadas contra Lula nunca saíram da esfera do circunstancial e, cá para o meu sentido de justiça, ou se prova sem dúvidas a culpa de alguém ou essa pessoa não pode ser culpada com o que parece ser.
É claro que, hoje em dia, depois do juiz que o condenou, um tal de Moro, ter ido parar ao governo de Bolsonaro, já existem muitos mais a pensar como eu. Todavia, mantenho todas as reservas que sempre tive, ou seja, se algures, num qualquer processo judicial, se provar inequivocamente que o sujeito é culpado, sem margem para dúvidas, então que se prenda o homem e se deite fora a chave pelo tempo que demorar a pena proferida na sentença. Porém, primeiro a prova e depois a pena. Nada mais simples.
Por falar nisso ainda te hei de mandar a minha opinião sobre a prisão dos governantes na Catalunha e sobre um tal de Presidente dos Estados Unidos da América. Contudo, não será hoje que já vou longo nos desabafos de um vagabundo cheio de supostas alegações. Recebe um beijo saudoso deste que não te esquece,
Gil Saraiva
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