Carta à Berta: Série: a Arte de Bem Comer em Campo de Ourique. 4) "Snack-Bar O Bitoque"
Olá Berta,
Continuando a saga dos restaurantes de Campo de Ourique hoje vou-te falar, minha querida amiga, naquele que, dizendo-se um snack-bar, é para mim o melhor exemplo do que é comer bom e barato, ou seja, a genuína e verdadeira tasca de Campo de Ourique, quiçá uma das últimas de Portugal. Estou a falar do restaurante “O Bitoque”.
Uma pérola da cozinha tradicional portuguesa, um tesouro único no bairro, escondido, bem à vista de toda a gente, mas perfeitamente conhecido pelos residentes mais sábios. Não estou a falar dos novos, mas dos que, com 10 ou mais anos de bairro, conhecem bem as suas preciosidades e onde comer bem, sem perder couro e cabelo, para o alcançar com a qualidade desejada.
O bom, velho, estilo das tascas nacionais que se aprimoraram, no contexto do país, a partir dos anos 60 do passado século e que o requintaram até quase meados dos anos 90, tem aqui toda a sua mais ilustre representação. A decoração é alegre e saloia, desdenhando a necessidade da existência dos designers deste mundo. A televisão funciona, da abertura ao fecho, no tradicional canto do espaço principal, atafulhado, sem nunca se tornar claustrofóbico ou asfixiante. Qual joia da coroa, um maciço balcão corrido, de ponta a ponta, no espaço principal com, pelo menos 8 lugares sentados, forrados a lona azul, carimba a tasca.
No ar sente-se um leve odor a comida que, sem que este se torne enjoativo, aguça o paladar. Podemos começar pelas sopas, onde sempre é possível contar com um caldo verde, à moda antiga, uma deliciosa sopa alentejana, ou, porque não, a aprazível e caseira sopa de feijão verde. De realçar que todo o menu varia consoante os dias da semana, sendo que os pratos principais têm dia fixo para nos deliciar, engalanados pelo seu valor.
Nas carnes, os destaques são tantos que só vou mencionar alguns, pois encontramos desde o cozido à portuguesa, das quintas-feiras, até à dobrada à moda do Porto, passando pelo arroz de pato no forno, a carne de porco à alentejana, os escalopes de peru grelhados, as favas tradicionais, os rojões ou o bitoque à casa. Em todos eles, sem exceção, a sensação de regresso à aldeia é inevitável.
Os peixes variam conforme a oferta existente aquando das compras, efetuadas antecipadamente, pelo raiar do dia. É fácil encontrar um bacalhau à lagareiro, peixe espada grelhado, filetes de pescada fritos, perca, robalo ou dourada grelhada e, até mesmo, um delicioso arroz de gambas com ameijoa.
Na janela vitrine, que dá para a rua, é possível ver claramente os queijos da Serra da Estrela, os enchidos, as sobremesas e toalhetes de papel, escritos à mão, a anunciar ao mundo, a boa ameijoa, o bom berbigão, ou até os caracóis, se estivermos na época dos ditos.
Muitas destas iguarias obrigam ao forte aplauso das nossas papilas gustativas. Tudo isto faz de “O Bitoque” o quarto restaurante desta minha seleção na restauração do bairro.
Série: a Arte de Bem Comer em Campo de Ourique.
4) Snack-bar “O Bitoque”:
A verdadeira tasca portuguesa de Campo de Ourique.
Contudo, a dimensão é pequena, suportando um máximo de 24 lugares sentados, já contando com os 8 do balcão. Também dá pena que, um espaço assim, não se mantenha aberto pelo menos até à meia-noite, mas o que importa é a realidade existente e não os meus desejos enquanto cliente ávido por mais. O importante é que se come bem, à portuguesa e com muito mais prazer do que seria de esperar num espaço tão acatitado.
Tipo: Cozinha Tradicional Portuguesa
Aberto: Todos os dias das 08 às 22 horas
Fecha: Domingo
Preço: Restaurante: Económico
Classificação: 5 Estrelas
Convém dar ainda realce aos petiscos, aos pequenos-almoços e aos lanches pela tarde fora. As tapas existentes em outras casas, aqui tornam-se realmente petiscos no sentido mais rústico do termo. Podemos ver um jogo de futebol na televisão, com um prato de ameijoas ou de berbigão pela frente, umas fatias de queijo e presunto, variadíssimas sandes bem tradicionais, 100 ou 200 gramas de camarão cozido e beber, por exemplo, um Cabriz do Dão, cuja garrafa apenas custa 8 euros.
Enfim, a oferta é múltipla e diversificadamente apelativa. A simpatia e acolhimento luso está bem patente no pessoal, com quilómetros de experiência nas pernas e nos braços, sempre disponível, sempre simpático e sempre atento. Vigilante aos sinais dos tempos n’ “O Bitoque” a existência de “wifi” é uma realidade e os canais desportivos ajudam a fazer conversa na sala, com os clientes mais alegres e conversadores.
Sente-se, todavia, a falta de algum espaço interior e a ausência gritante de uma esplanada. O bar é completo e até é normal conseguir encontrar um medronho, de boa qualidade, para matar a saudade das tascas das nossas aldeias.
“O Bitoque” pode passar despercebido na Rua Ferreira Borges, número 59, em Campo de Ourique, onde assenta praça, mas apenas para quem atravessa a via de carro e não conhece o local porque, para os conhecedores, ele está perfeitamente localizado e é não só referência como também ponto de encontro habitual. Ainda para mais porque, o serviço de “take-away”, permite levar para casa as inúmeras iguarias aqui confecionadas, sejam elas refeições ou petiscos. Nem é preciso lá ir encomendar, basta ligar para o 21 39 65 636 e passar, na hora marcada, a recolher a encomenda efetuada, e, claro, pagar a conta.
Como depois de pagar é hora de sair, assim eu me despeço de ti, minha querida Berta, ciente de que te agradou, por certo, esta casa bem portuguesa onde a palavra tasca é, sem margem para quaisquer dúvidas, um verdadeiro elogio isto bem ao contrário de algumas modernices que, tendo tasca no nome, mais não são do que pretensiosos sugadores da carteira dos clientes. Recebe um beijo de saudade, deste teu eterno amigo,
Gil Saraiva.