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Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

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Carta à Berta nº. 491: Ensino à Distância - Regresso Escolar

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Olá Berta,

Oficialmente as aulas não presenciais começam hoje desde o primeiro ao décimo segundo ano. Aulas através da televisão e da internet. Todo este ensino oficial é, no meu entender, uma grande tempestade de areia, literalmente direcionada para a comunidade como um todo. Na realidade apenas, e com sorte, 10 ou 20% dos alunos vão tirar partido desta vaga de fumo que, não oficialmente, não passa disso mesmo e nada mais do que isso.

Mas o que quero eu dizer com isto? Nada que não seja óbvio: os bons alunos que, simultaneamente, têm um genuíno interesse em aprender e que, ao mesmo tempo, têm acesso aos meios tecnológicos, vão sair-se muito bem. Porém, para todos os restantes cada semana de ensino irá resumir-se a uma, duas, talvez três horas, de real aprendizagem.

Em resumo, tudo o resto será perdido. Com efeitos menos devastadores, o ensino vai passar uma fase semelhante (para muito pior) ao que aconteceu no ano da revolução de abril de 1974 e que teve consequências graves durante os anos seguintes.

Uma geração inteira de miúdos perdeu, nessa altura, por completo o equilíbrio da aprendizagem e só mesmo os mais resilientes se safaram. Ora, ser resiliente é sinal de teimosia, mas nem sempre significa inteligência ou conhecimento, assim, será preciso a sua conjugação com a do acesso aos meios, ou seja, computador e televisão.

Se atualmente a situação se repetir, se apenas os resilientes voltaram a triunfar, desta vez com a agravante de que precisam ter acesso à televisão e á internet, pois a resiliência e a inteligência não serão os únicos fatores de sucesso, a situação promete ser ainda mais complicada do que a ocorreu entre 1974 e 1980.

Não penses, amiga Berta, que o poder não tem conhecimento disto. Claro que tem. Todos os jovens que não tenham pais que estejam atentos aos seus estudos, todos a quem faltar a força e a vontade de lutar, aprender e estudar, e ainda, todos aqueles a quem faltarem os meios, vão ficar pelo caminho, independentemente das boas intenções do Estado, da democracia e do Governo em si. Se não aprendermos com os erros do passado, tudo será igual.

Agora, se o Ministério da Educação transformar os anos de 2020 e 2021 em anos zero e conseguir retomar o que vinha a fazer em 2019 (e estou a falar do ano letivo 18/19), apenas dando a possibilidade aos resilientes, aqueles que reuniram todas as condições necessárias para seguirem em frente, fazendo os outros todos repetir a aprendizagem podem salvar-se estas gerações abrangidas, deste coxear letivo que não sendo assim os perseguirá para o resto das suas vidas, apenas com o registo de dois anos perdidos, mas nem por isso totalmente inutilizados.

Mas isto é apenas a opinião (a minha) de quem já passou por isso entre 1974 e 1980. Posso ter visto mal. É tudo, minha querida Berta, despede-se este teu amigo de todas as ocasiões, saudosamente, com um beijo de até amanhã,

Gil Saraiva

 

 

 

Carta à Berta nº. 58: A Greve em França e os "Black Blocs"

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Olá Berta,

Espero que por esse Algarve, para onde te mudaste, o frio seja menor do que por aqui em Lisboa. Nem quero pensar como estará o norte do país, e muito menos as terras altas ou até o Alentejo, durante as noites e madrugadas. Para mim é frio a mais e ponto final. Prefiro a chuva, não sou fã do vento, e, minha querida, adoro o Sol.

Hoje estou aqui para te falar da Revolução Francesa, não a que acabou com a monarquia no país, mas a que não mais se calou, daí para cá, no país da liberdade, da igualdade e da fraternidade.

Já tivemos de tudo em terras de Napoleão, as últimas grandes ocorrências, após os horrendos ataques terroristas, foram, quer o aparecimento das manifestações dos famosos “Coletes Amarelos”, quer esta última, que hoje ocorreu, derivada de uma greve geral que colocou quase um milhão de pessoas na rua, até mais, segundo os sindicatos, e um pouco menos segundo o Estado.

Macron está no centro de toda a polémica. O homem pode dar graças aos céus de a guilhotina estar agora apenas exposta em museus e de já não ser um objeto utilitário para afastar os líderes do poder. É que os franceses não brincam quando se manifestam, para desespero do setor do turismo francês, que tenta a todo o custo inverter o afastamento dos turistas para países periféricos e insignificantes como Portugal.

A greve no setor público, hoje iniciada, vai continuar até à próxima segunda-feira e as 90 detenções efetuadas até ao momento, prometem aumentar significativamente nos próximos dias. Aliás, se somarmos o número de manifestantes presos só desde o aparecimento dos “Coletes Amarelos”, facilmente se conclui que o Governo já deve ter construído, no mínimo dos mínimos, 2 novas prisões para albergar os tumultuosos agitadores.

Em causa, desta vez, estão as novas medidas introduzidas por Emmanuel Macron, sobre as pensões de reforma em França. É que para os franceses não basta o “quem dá e tira, ao inferno vai parar”, eles fazem questão de trazer o caos, as trevas e o próprio inferno até às portas do infeliz governante, que passa a vida a ver-se envolvido nestes tumultos agitadíssimos, que em nada contribuem para a estabilidade nacional segundo a opinião do próprio Estado.

Fica provado que este Emmanuel, no masculino, não goza da popularidade da sua homófona feminina, a Emmanuelle dos filmes nos idos de 1974. A popularidade pode até ser semelhante, mas em sentido totalmente oposto.

Combóis, autocarros, metro, aeroportos, escolas, tribunais e os mais variados serviços públicos estão a ser severamente afetados. Por todo o lado há carros e contentores do lixo a arder, mobiliário urbano e montras partidas, veículos capotados, num quadro que Dante adoraria por certo retratar.

O Governo francês, está a unificar 42 regimes de pensões, num único sistema de pontos, que põe termo a uma imensidade de direitos laborais, há muito instituídos em França. Os sindicatos em revolta já anunciaram a continuação da greve até segunda-feira, com um pequeno detalhe, é que acrescentaram um “pelo menos” o que significa obviamente, caso não haja um recuo evidente do Governo, da existência de um “pelo mais”, ou seja, da continuidade da greve, que, sendo uma greve geral, pode continuar a parar o país.

Cada vez mais grave é, também, a proliferação dos chamados “Black Blocs”, bandos de indivíduos totalmente mascarados e vestidos de preto, que geram a destruição por onde passam. Ao contrário dos seus primos, os “Coletes Amarelos”, que apenas se manifestavam evitando, na sua grande maioria a violência, estes meninos, que ao coro nada ficam a dever, adoram deixar a sua marca destruidora bem registada por onde passam.

Pobre do polícia que seja apanhado por um bando, o hospital será certamente a sua melhor esperança. A coisa é de tal forma grave que o gás lacrimogénio começou a ser usado logo no início das manifestações, por imperiosa necessidade das forças da ordem.

É por estas e por outras, minha querida Berta, que eu adoro os brandos costumes portugueses. Passos Coelho meteu-nos o dedo no ânus durante 4 longos anos e Centeno, ao bloquear a eficácia do SNS, o Serviço Nacional de Saúde, impediu-nos de tratar a violação por sodomia convenientemente, todavia, mesmo assim, ainda agora aguardamos em harmonia a reposição geral das coisas e o regresso à normalidade. Mas isso somos nós. Podemos ser latinos como os franceses, mas o sangue na guelra não faz parte do nosso ADN.

Fica com um beijo deste teu amigo em mais esta despedida, como sempre ao teu dispor,

Gil Saraiva

Carta à Berta nº. 39: A População Portuguesa – Perspetivas

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Olá minha querida Berta,

Acabei de reparar que esta já é a vigésima carta que te escrevo. Sabes o que isso significa? Quer dizer que te foste embora há já duas dezenas de dias. Não ligues aos arrufos deste que sente a tua falta. O importante é que estejas bem e feliz.

A novidade de hoje é a divulgação dos dados do INE, Instituto Nacional de Estatística, relativos a 2018, no que à evolução da população diz respeito. A conclusão continua desfavorável uma vez que a população existente continua a decrescer. As estatísticas do organismo são claras, Portugal perdeu mais 14 mil habitantes, face a 2017.

Não sou muito daqueles que gosta de jogar com os números para dizer barbaridades, uma vez que estes podem ser usados e interpretados de forma a ajustarem-se áquilo que defendemos. Porém, por estar curioso, resolvi comparar os dados dos últimos 20 anos. Estava com interesse em saber realmente o que se passou com a população desde os últimos 2 anos do século passado até 2018. Afinal, 20 anos é um quinto de século. Uma boa amostragem para podermos avaliar tendências. Fiquei satisfeito por saber que, arredondando as contas na casa dos milhares de pessoas, temos mais 58 mil residentes em 2018 (face a 1999). Infelizmente a minha satisfação ficou por aqui, todos os outros números são desastrosos seja qual for a perspetiva.

Atualmente, dos zero aos 24 anos, tendo o país mais 58 mil habitantes do que há 20 anos, perdemos 705 mil crianças e jovens. Uma verdadeira tragédia geracional. Passámos de 3 milhões e 74 mil jovens para 2 milhões 508 mil jovens abaixo dos 25 anos de idade, ou seja, em apenas 20 anos, desapareceram 22,4 porcento das crianças e jovens do país, em linha consonante com o que aconteceu entre 74 e 99..

Se este número se vier a repetir nos próximos 20 anos, chegaremos a 2038 com apenas 1 milhão 377 mil crianças e jovens até aos 24 anos, ou seja, em idade escolar. O que implicaria uma redução superior a 43 porcento desta faixa populacional. Agora se extrapolarmos isto para um igual período de tempo até 2078, a população escolar dos zero aos 24 anos existente em Portugal seria de apenas 459 mil indivíduos dos 0 aos 24 anos e estaríamos à beira da extinção enquanto povo.

Mas a coisa não melhora quando olhamos para a terceira idade, ou seja, para a população com 65 ou mais anos. Em 20 anos, até 2018 esta faixa etária aumentou em 601 mil idosos, qualquer coisa como mais 27 porcento de idosos do que em 1999. Isto aponta, se a tendência não se alterar no próximo ciclo de 20 anos, para mais um milhão e 202 mil seniores, um aumento de 52 porcento face a 1999, passando a constituir esta faixa etária um terço da população nacional em vez de um quinto que representava em 1999, ou seja, se nada for feito em 2078 os habitantes em Portugal seniores serão mais de 2 terços da atual população, atingindo o número absurdo de 6 milhões 912 mil.

Esta barbaridade absoluta colocaria a população ativa entre os 25 e os 64 anos com apenas 2,45 milhões de pessoas, tudo isto tendo em consideração que a população se mantem na casa dos 10 milhões de residentes, como nos últimos 20 anos, ou seja, o mesmo seria dizer que cada pessoa a trabalhar teria de suportar, com os seus impostos e com o seu vencimento 1 jovem a estudar e 3 pensionistas reformados. Algo absolutamente impraticável.

Pois é Berta, e este é o cenário favorável em que a população envelhece, mas se mantém estável em termos globais, porque, se a dada altura começar a decrescer face à constante diminuição de população jovem, então tudo se precipitaria não para daqui a 60 anos, mas para daqui a 30.

Não penses, minha amiga, que entre o 25 de abril de 1974 e 1998 a situação foi diferente, a única diferença foi que crescemos nesses anos quase 2 milhões em população por força do regresso dos emigrantes e graças aos retornados das ex-colónias. Mas nem isso mascarou o cenário horrível que tem assolado Portugal. Em 74 quase 50 porcento da população estava em idade escolar, eram perto de 4 milhões de crianças e jovens até aos 24 anos para 8 milhões e picos de população. Agora são 2,5 milhões na casa até aos 24 anos para mais de 10,275 milhões de habitantes, ou seja, perdemos 50% da nossa juventude em 44 anos.

É prioritário que o Estado tome medidas efetivas imediatamente, é impossível que eu seja o único a olhar para estes números. Aliás isto requer como nunca, a união esmagadora dos partidos com acento parlamentar numa política concertada de combate ao envelhecimento sem a contrapartida de um aumento gigantesco da natalidade. A gravidade dos números aponta para que sejam tomadas medidas ontem, porque amanhã poderá já ser demasiado tarde para reverter a situação.

Deixo-te um beijo saudoso, deste teu grande amigo que não te esquece,

Gil Saraiva

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