Carta à Berta: Parada's Garden: The Return Of The Yodas Concil - Part I /III
Olá Berta,
Este domingo passado fui obrigado a sair do casulo onde tenho estado confinado desde que o ano teve início, pois tive de ir à farmácia por falta de um comprimido de toma diária e obrigatória. Foi esta saída que me levou a escrever a carta de hoje a qual intitulei de:
“Parada’s Garden – The Return Of The Yodas Council - Part I/III”
O confinamento foi devido primeiro por um problema de saúde e depois por eu fazer parte de 2 ou 3 dos chamados grupos de risco. Em 5 meses e pouco esta foi a quarta ou quinta vez que tive de sair de casa.
À exceção da minha saída voluntária, para ir à reabertura do restaurante Verde Gaio, também ele localizado na minha rua, a Francisco Metrass, todas as outras foram por obrigações ligadas com o meu estado de saúde. Idas ao médico, consultas de controle e farmácia. Enfim, querida Berta, saí apenas e quase para o absolutamente necessário e imperativo.
Claro que a ida ao Verde Gaio, a 19 de maio, foi exclusivamente um imperativo da minha cabeça de confinado. Mas não deixou de ser um imperativo. Já fui até ao momento, testado, por 2 vezes, à Covid-19, e continuo tão negativo como antes da pandemia. Embora esta negatividade seja uma daquelas em que o sinal de menos é algo de positivo, não estava preparado para o cenário a que assisti ontem nas ruas do bairro. Tive a noite para pensar no assunto e mesmo assim não consegui descobrir o que poderia aconselhar à minha vizinhança.
Acompanhado pela música de um ciclista, muito conhecido de todos os residentes, que se passeia de bicicleta pelo bairro, em circuitos previamente determinados por um raciocínio que desconheço, engalanado com a bandeira do Benfica e com um rádio e gravador quase no máximo, a pimpar por onde passa, pude conferir o comportamento dos meus irmãos de bairro, nesse dia solarengo, de 7 de junho. Embora o ser domingo tivesse ajudado, a quantidade de gente que vi na rua, não me pareceu conjugada com a existência de um Estado de Calamidade.
Os cafés e as pastelarias, criaram verdadeiros salões de baile dentro dos seus espaços, sendo os únicos locais onde me apercebi haver realmente algumas medidas ligadas ao momento e às restrições. “O Meu Café”, o “Trigo da Aldeia” e o “Az de Comer” são 3 bons exemplos disso.
Quanto ao Jardim da Parada o desrespeito pela pandemia não tem descrição razoável que se possa fazer (eu dei uma volta maior do que o que realmente precisava para ver como as coisas corriam). A Hamburgueria da Parada esticou-se jardim fora, qual polvo que alarga os seus tentáculos gulosos, em vez de apenas reduzir o número de mesas. Os bancos, todos com as fitas vermelhas e brancas de proibição de uso, estavam salpicados de idosos a descansar as pernas e a ver o ambiente. O uso de máscara pareceu-me ter sido esquecido, porque deu para contar com as mãos, quantas pessoas as estavam a usar.
Contudo, o que mais me afligiu, minha amiga, embora não faça ideia como é que este espaço esteve no resto do domingo, foi ver a quantidade de séniores a encher, por completo, as 4 mesas de jogo do jardim, fixas ao chão, como sempre, a dizer que dali não vão a lugar nenhum, rodeadas de mais duas (ou mais) dezenas de gente de risco a assistir em pé, bem perto dos 16 jogadores sentados, ao decorrer das partidas. Perfeitamente indescritível.
Este perigoso, aflitivo, dramático e irresponsável ajuntamento de séniores, mais parecia saído da Saga da Guerra das Estrelas, onde o episódio anunciaria em título “Parada’s Garden – The Return Of The Yodas Council - Part I/III”, em português seria algo como: “Jardim da Parada – O Regresso do Concílio dos Yodas - Parte I/III”.
Regressei a casa a pensar que assim, dificilmente, os números de infetados poderão vir a baixar em Lisboa. Se o que vi for realmente uma amostra do que se passa no resto da zona da Grande Lisboa e Vale do Tejo, então, sem dúvida, estão explicados os números e o aumento dos casos registados. Todavia, como sou fulano positivo, acalento ainda a esperança de que tudo isto tenha sido apenas um desabafo domingueiro e que esta segunda-feira todos voltem à normalidade cuidadosa que os tempos exigem.
Despeço-me com um beijo, este teu amigo do peito, com quem sempre podes contar,
Gil Saraiva