Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente
correto.
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Fiquei muito contente em saber que apoias a minha forma de ver a educação dos mais novos. Tristemente para mim, quando escrevi estas confissões, nem todos os leitores concordaram com o que eu afirmei. Para muitos a lamparina aplicada a uma criança, já é, por si só, um ato de covarde violência. Não conseguem distinguir, nem encontrar a noção de meio termo, que te expliquei na carta anterior. São opiniões que temos de respeitar numa sociedade civilizada, embora discordemos tanto delas, como essas pessoas discordam das nossas. Adiante…
Conforme é natural as nossas confissões, se as formos fazer todas, não cabem, mesmo que queiramos, num mero capítulo de um livro qualquer. Todavia, existem factos que nos chamam mais a atenção do que outros. Depois existem as relutâncias que nutrimos quanto a esta ou aquela situação ou organização. É assim contigo, comigo e com todas as pessoas. Nisto somos todos iguais. O que parece variar são os objetos da nossa atenção.
Eu, por exemplo, tenho um problema com fardas. Não sei se foi por causa do meu coma de 6 meses em 1982, causado por culpa do serviço militar, então obrigatório, se não me falha a memória, se por uma outra razão qualquer, que possa estar escondida ou mesmo profundamente enterrada no meu subconsciente. Mas passemos às Confissões. Assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte XIV
“Uma outra confissão é a minha séria aversão à autoridade. Seja ela criada para manter a ordem pública, seja a mais elementar segurança privada de uma qualquer instituição ou empresa. Consigo juntar até os militares ao mesmo role. A tendência natural da humanidade para abusar dos pequenos poderes é de tal forma gritante que, em vez de me sentir seguro e protegido, perante a presença de uma qualquer autoridade, me sinto, na maioria das vezes, intimidado, receoso, ameaçado, inseguro e de uma forma geral incomodado na sua presença.
Reconheço, contudo, que o defeito possa ser meu. Compreendo inclusivamente a necessidade da existência das forças de manutenção da ordem pública. Mas, a impunidade dos verdadeiros bandidos, deixa-me sempre naquele circuito fechado de não saber se essas autoridades existem para intimidar os pacíficos ou para agir sobre os violentos. Parece sempre que não é apenas a paz, a segurança e a manutenção da ordem pública que os faz agir. Provavelmente este raciocínio não passa de uma paranoia minha.
Já nem falo da justiça dos tribunais que, no caso nacional, parece atuar, de forma gritante, ao serviço de poderes e forças ocultas, de interesses que ninguém conhece muito bem e que quem conhece é somente porque faz parte da mesma teia. Dessa invisível malha que aperta uns para poder garantir que não se fala dos outros, daqueles a quem eu chamo de: os protegidos.”
Minha querida Berta, como me espalhei nos considerandos iniciais fui obrigado a ser mais curto nas confissões. Contudo, não te preocupes, pois amanhã continuo o raciocínio de hoje com toda a certeza. Despeço-me com um beijo amigo,
A propósito da minha última carta, em que te falei da descendência, convém fazer um certo aparte sobre o que eu acho ser a educação de crianças e adolescentes. O tema, nesta época em que a violência doméstica está na ordem do dia, tem de ser abordado numa perspetiva sã, em que é imperativo distinguir o que é violência no lar, daquilo que é educação de menores.
Até os filhos fazerem 18 anos de idade os progenitores são responsáveis pelos atos praticados por estes, na quase totalidade dos casos. A lei abre algumas exceções que nem importa, minha amiga, estar aqui a referir. A atenção dos pais é essencial para que os normais parâmetros de civilidade não sejam ultrapassados.
Contudo, dar uma sapatada, com força medida e não desmedida, numa criança que faz, muitas vezes propositadamente, uma asneira repetida ou que se comporta inconvenientemente em público, não é violência doméstica é criação de limites e barreiras. Aliás, na maioria das vezes, basta que se suba e agrave o tom de voz para que a criança arrepie caminho. Agir assim é saudável, forma caráter nos infantes e dá-lhes as diretrizes base para melhor se conseguirem inserir num futuro, que nunca é muito longínquo, sem grandes custos na sociedade e comunidade adulta. Educar, não é perversão, é amor. Assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte XIII
“Dizia eu que fico feliz por ter tido filhos educados, que viveram as infâncias respetivas sem muitas das costumeiras birras infantis, e que acabaram por vingar e se tornar jovens adultos que, acima de tudo, sabem o que querem. Tais factos não podiam ser mais verdadeiros, nem mais importantes, por muito que se conjeture.
Não gosto nada de crianças malcriadas. Custa-me muito a aceitá-las, a baterem o pé e serem tratadas por você pela mamã, que os repreende com o mesmo ar com que ralha com o gato persa, que não lhe apeteceu usar a caixa de areia. Uma lamparina, distribuída na devida altura, ilumina mentes e educa. Ah! Contudo, não precisa deixar marca para surtir efeito. O melhor de tudo é que se trata de um ato de amor e não de violência doméstica gratuita e abusiva.
Inversamente, já é violência civil eu ter que assistir ao desaforo de cada vez ser mais fácil de se encontrarem crianças grosseironas, sem o mínimo polimento e com completa falta de regras ou normas de conduta. Fazem uso de birras, bate-pé e artimanhas pouco convincentes, para escaparem impunes e vitoriosas dos seus próprios disparates. Porém, nesta nossa sociedade, do oito e do oitenta, parece que um castigo bem dado e merecido numa criança passou, indevidamente, a ser um horroroso crime de violência doméstica.
Ora bem, eu sei que crimes dessa natureza existem, não tenho a menor dúvida, e os que o são deviam e devem ter pesadas consequências, mas, por favor, sem qualquer confusão com os atos de mera educação.”
Recebe um beijo amigo, querida Berta, deste fiel vagabundo feliz, que se despede com um sorriso de até amanhã, se não for antes, seja ao telefone ou numa qualquer rede social,
Cá estou eu para dar continuidade às minhas confissões, sem preocupações que não sejam as de tentar não me esquecer de detalhes que possam ser importantes. Assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte XII
“Porquê? Perguntarás tu, meu caro leitor, sem teres como vislumbrar uma razão lógica. Porque não contar friamente os factos ocorridos que levaram ao divórcio? Porque fazê-lo apenas serviria para minha satisfação egoísta e pessoal e não para um melhor crescimento e amadurecimento na adolescência de ambos os meus filhos. Era com a mãe que os 2 iriam viver, teria de ser com ela com quem melhor se teriam de relacionar, já lhes chegava a amargura da rotura e do afastamento face ao pai, que sempre fora presente. Já era trauma suficiente.
Falar da situação, gerar incómodos e possíveis atritos, para meu único benefício, nunca me pareceu de bom tom. Aliás, até corria o risco, depois de tantas vezes escutarem as queixas e a versão da mãe, de nem sequer acreditarem em mim. Não era algo que me tirasse o sono, mas, na realidade, era um cenário que poderia muito bem ter ocorrido. Bastava que lhes passasse pela cabeça que eu estava a tentar arranjar desculpas, para o que eles pensavam ter acontecido e cuja versão tomavam como verdadeira. Eu vivo com um compromisso fixo comigo mesmo na cabeça, que é, nunca ir contra a minha própria consciência, mesmo saindo-me mal disso.
Contudo, fico contente porque acompanhei intensamente a infância de ambos. Acabaram os 2 por vingar na vida e seguirem os seus caminhos de adultos preparados e com opções definidas e bem vincadas. Não se pode pedir mais, principalmente vivendo a muitos quilómetros de distância daquele que foi o meu lar.
Além de ter estado sempre presente, quando solicitado, fosse porque me queriam contar algo, fosse porque precisavam deste ou daquele bem, sempre puderam contar comigo. Nem mesmo quando vivi durante um ano e meio na rua, como um verdadeiro vagabundo, lhes dei a conhecer esse facto e a minha então precária situação, pelo contrário, mantinha o meu apoio, nem que para isso ficasse reduzido a uma sopa de feijão por dia. Feitios. Fazer o quê? Era feliz assim e eu prezo muito a minha felicidade, meu caro leitor.
Foi essa a razão que, nos termos do divórcio, renunciei à vivenda de 3 pisos, ao carro, à muito valiosa coleção de arte (na altura segurada em um milhão de contos), ao recheio da casa, etc., fazendo apenas exceção de parte dos meus livros e alguns dos meus discos de vinil, para além da minha roupa. O porquê também é simples e cristalino. Os meus filhos iam viver ali, já bastava perderem a presença do pai.”
Com isto me despeço até à minha próxima carta de confissões. Não te preocupes, querida Berta, que não considero que esteja a expor demasiadamente a minha vida privada. Não tenho o que esconder. Não te posso é deixar de referir que o que te conto não passa, infelizmente, da minha visão dos factos. Certamente haverá versões bem mais tenebrosas do que a minha. Recebe um beijo de até mais, este sempre teu amigo,
Depois de me abrir nestas pequenas narrativas, sobre a minha ascendência, não vejo problema em passar à descendência. Tudo isto faz parte das Confissões de um Português em Português. Problemático seria referir-me à vida e intimidade de terceiros, sem o seu devido conhecimento e consentimento.
Contudo, tal como fiz até aqui, se reparares bem, apenas falo de mim relativamente a sentimentos e pensamentos e, o que digo sobre os outros intervenientes, é meramente explicado na minha perspetiva, alegadamente correta, do que racionalmente constato como verdadeiro.
Não me considero nem vítima, nem herói deste filme que constitui a minha vida. Julgo, isso sim, enquanto não me pesar a consciência, que serei uma pessoa feliz e de bem com a vida. Tenho, como ser humano, defeitos e qualidades. Não me acho pior, nem melhor que terceiros, mas estou convicto de que sou único e diferente enquanto individuo.
Herdei alguns dos defeitos menos bonitos do meu pai. Por exemplo, quanto corto uma relação com alguém, seja a que nível for, do mero conhecimento informal, à amizade ou à família, é para sempre e não há maneira, forma ou jeito de poder voltar atrás. Com efeito, nem mesmo se esse corte me dilacere a alma e embargue o coração. Se foi um ato consciente está resolvido e arquivado. Passemos ao capítulo:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte XI
“Infelizmente por força do meu próprio divórcio, o primeiro, ao fim de 17 anos de casamento, passei a acompanhar a educação dos meus filhos (a partir dos nove anos de idade de um e dos catorze anos da outra), à distância. Sei também, com uma grande certeza que isso influenciou negativamente a vida deles… não há soluções fáceis, nem mesmo coelhos a saltarem sorridentes de chapéus, na vida de cada um de nós, antes houvesse...
Afinal, quando se diz, num caso deste tipo, que a solução foi fácil é porque, logo à partida, o problema nem sequer existia e, portanto, esse casamento não passava de uma folha de papel registada.
Infelizmente, para mim, foi precisamente o inverso, ou seja, tratou-se de uma situação imensamente complicada, embora tenha sempre evitado demonstrá-la quer à pessoa de quem me separei, quer principalmente aos meus filhos. A estes, já lhes bastava a crua realidade de perderem a presença do pai.
Também nunca lhes expliquei porque é que a mãe se quis separar de mim, nem as palavras absolutamente cruéis e injustas que me disse, quando me pediu o divórcio. Efetivamente, para ser franco, nem quando a mãe de ambos, que ficou com a custódia deles, distorceu toda a história da separação eu lhes quis mostrar o meu lado da razão.”
Ficamos por aqui e seguiremos o nosso curso na próxima carta, minha amiga. Recebe um beijo de até amanhã, com os mimos e rococós do costume, deste teu amigo sempre presente, embora distante,
Não foi ontem que terminei as minhas Confissões em Português, aliás, ainda vou a meio. Se é para me conheceres devidamente, acho justo dar-te todas as explicações possíveis. Pelo menos aquelas de que me lembro. Assim, continuando:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte X
“Entretanto casei, tive um casal de crianças para perpetuarem os genes dos progenitores, e só depois de divorciado é que consegui compreender os meus próprios pais. Efetivamente poderia ter entendido muito mais cedo. Mas, dos meus dezoito anos em diante, estive sempre distante deles. O contacto era feito por telefone, em aniversários, festividades e coisas desse género, sem grande proximidade ou relevância no que se refere a relações de mais intimidade geracional e familiar.
Não fosse essa minha opção de pré-adulto e em vez de ter sido aos quarenta poderia ter vislumbrado a realidade aos dezoito ou dezanove. Fiquei com algum remorso, mas já era tarde para esse tipo de sentimentos. Contudo, não penses com isso que eu gostava pouco dos meus pais. Nada disso. Adorava-os, tive foi a noção errada que o sentimento deles por mim não era tão forte como o meu por eles. Tolices de puto.
Mas não fiques com pena, não tive uma infância infeliz, nem nunca me senti um coitadinho. Aliás, abomino coitadinhos. Porém, cada um tem o direito a ter as suas opções de vida. No meu caso acho que a minha infância foi normal, a passagem pela adolescência maravilhosa e o casamento cinco estrelas até os feitios de ambos mudarem tanto que deixaram de ser compatíveis. O que foi pena. Ainda hoje me lembro com saudade de uma cara de mimo deliciosa que ela fazia quando me queria pedir algo que sabia que eu discordaria normalmente. Acabava sempre por ganhar. Quando nos separamos, resolvi lembrar apenas as coisas boas e arquivar em palavras e poemas as más e também as maravilhosas. Assim evitava sentir rancores e, do lado inverso, saudades. Fiz exatamente o mesmo com as outras relações de amor e de união que fui tendo ao longo da vida. Em última análise acho que foi a melhor opção.
Desde o episódio com os meus pais que passei a tentar, e ainda tento, mesmo que às vezes não seja assim tão fácil, não fazer julgamentos precipitadamente seja do que for. É uma questão de bom senso. Temos obrigação de aprender com os nossos próprios erros e de evitar repeti-los a não ser que a repetição seja, por qualquer outro motivo, intencional.”
Esta é uma boa altura para me despedir desta carta e de ti, minha querida amiga. Fica bem e recebe um beijo de até amanhã deste teu grande amigo,
Hoje é dia de abandonar a minha teoria do Universo e da Humanidade para falar um pouco mais de mim. Afinal, mesmo que faças uma ideia, não me parece mal explicar-te quem sou e porque sou como sou. Não só é honesto, como acho que a franqueza é uma qualidade e não um defeito. Voltamos, pois, a estas Confissões em Português, sem mais delongas:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte IX
“Depois deste intervalo, de mais página menos página, está na altura de regressarmos aos temas em aberto. Ora, uma vez que se trata de deixar registadas algumas confissões, e que é sobre elas que se desenrola agora a ação, importa repor a conversa nos carris que lhe são devidos.
Concentro-me imediatamente na educação. Eu sou o último filho de pais que, quando me tiveram, já tinham mais idade para avós do que para progenitores diretos. Não é que com isso me tenham educado mal. Nada disso. Mas a atenção que eu deveria ter exigido, em circunstâncias normais, acabou por não ser a que efetivamente recebi, face aos condicionalismos da sua idade mais avançada, dos compromissos já assumidos na educação dos quatro filhos anteriores, das agendas sobrelotadas, pelo esforço de não deixarem que nada faltasse em casa, dos meus progenitores. Enfim, eles fizeram o que puderam, e como se costuma dizer, a mais não são obrigados.
Mas foi preciso chegar à idade adulta, e mesmo assim só depois de eu próprio ter atingido os quarenta anos de idade, para entender plenamente que não tinha sido um filho menos querido ou menos amado, apenas existira uma imensa falta de tempo, para que a atenção que me fora dispensada tivesse sido igual à que tinha existido com os outros. Mimalhices de filho mais novo dirás tu. Poderia ser, se não me tivesse afetado tanto em termos de feitio, mas pronto, finalmente perdoei o que pensei ser lógico perdoar e relevei o que não tinha qualquer hipótese de ser de outra maneira face às circunstâncias.
De qualquer forma fiquei muito bem comigo mesmo, por saber que, apesar de não ter sido um filho planeado, mas sim fruto de uma celebração, nunca existiu um gostar menos, fosse porque motivo fosse, apenas e só, para meu azar, menos disponibilidade por força dos contextos da própria vida. Foi um dia muito feliz para mim esse em que enxerguei a minha realidade. E fiquei a ganhar no final. Sou o único dos cinco que sabe o dia em que foi concebido. No meu caso dia 31 de janeiro, dia de anos de namoro de meus pais. Posso não ter sido planeado, mas fui de certeza fruto de muito amor. Isso ninguém me tira.”
Com esta Confissão em Português me despeço, querida amiga, desejando-te um dia feliz, pelo menos do que falta dele. Deixo um beijo de saudade, com o carinho e amizade do costume, deste teu amigo,
Espero que a minha conversa com o leitor das Memórias de Haragano, enviada ontem, não tenha sido chata em demasia para ti. Afinal, a busca de confiança mútua é sempre algo que se deve louvar seja lá em que tipo de enquadramento nos encontremos numa dada altura. Aquilo de que eu tenho a certeza é que para desabafar com o leitor, da mesma forma como o faço contigo, ou algo aproximado a isso, é necessária uma relação de mútuo acreditar. Apenas isso, algo bem simples se devidamente executado e aceite por ambas as partes. Agora, está na hora de regressarmos às Confissões, assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte VIII
“Sobre os <<afinismos>>, de que falei anteriormente, as explicações virão sem a maçada de uma teoria quântica, pois trata-se somente de uma filosofia de minha autoria, que não justifica apenas uma maneira de pensar, mas também todo o comportamento sociológico, político e ético da humanidade. Aliás, até julgo que ela, a minha querida filosofia, pode ajudar a explicar o complexo funcionamento do universo.
Não é, porém, nenhuma teoria da relatividade, nem mesmo sei se, o que digo e afirmo de forma convicta, poderá, algum dia, ser matematicamente comprovável, mas se queres saber também pouco me importa. Acho mais fácil acreditar nas minhas teorias do que na existência da proclamada e não devidamente comprovada, energia negra que, segundo matemáticos e físicos, compõe noventa e tal por cento da imensidão universal, se combinada com a igualmente misteriosa matéria negra, apenas porque é necessário para eles que as contas que fazem batam certo, por mais absurdas que as suas explicações possam parecer. Não o digo para minimizar a classe, mas, para mim, os astrónomos, os astrofísicos e os outros estudiosos do nosso cosmos estão para o momento atual como os astrólogos estavam para a antiguidade.
O <<Afinismo>> resume-se num princípio simples. Tudo no universo interage entre si, sendo que a proximidade torna essa interação mais evidente, ou seja, uma qualquer partícula não pode fazer uso das suas qualidades próprias se não tiver, à sua volta, outras partículas com quem interagir. Por outras palavras o Universo é interativo, participativo e existe por agir em conjunto, pela conjugação intricada de todos os seus componentes mais elementares. Caso contrário estaria condenado à extinção e ao caos.
Ora, quando se transporta este princípio para o campo da existência e da relação humana, é fácil concluir que, enquanto ser social que somos, precisamos de interagir com os outros. Com base nas afinidades mútuas constituímos o nosso ciclo de relações e proximidades e defendemo-lo com unhas e dentes se preciso for. Sejam as relações familiares, sejam as de amizade ou as de amor, todas elas existem pelos pontos em comum que partilhamos com quem nos é mais próximo ou chegado. Do lado inverso, reagimos negativamente perante aqueles que não partilham das nossas afinidades. Trata-se de um sistema perfeito, que funciona qual relógio suíço e que, quando é necessário, faz os ajustes devidos para que tudo assim continue.
É nesta dicotomia que vivemos toda a nossa existência. Mesmo quando alguém que estava no nosso grupo de relacionamento, ligações próximas e relações, descobre que se enganou nas escolhas, nas preferências, em suma, nas afinidades ou quando isso mesmo acontece connosco. Esses momentos, que acontecem com alguma periodicidade a todos nós, são afinal e apenas o acertar do tal relógio suíço que para continuar certo precisa dos devidos ajustes, de manutenção e de revisão atenta.
No campo das relações humanas é fácil de encontrar uma multiplicidade de <<afinismos>>. Podemos vê-los no amor, nas amizades, na partilha da preferência clubística, nas opções de caráter político e social, nos gostos, nos programas e nos filmes de que gostamos, no bairro onde vivemos, na coletividade ou associação a que pertencemos, até nas coisas mais simples que fazemos ou naquilo que comemos. O <<Afinismo>> governa totalmente o nosso campo sensitivo e emocional, bem como o nosso relacionamento social e toda a nossa existência racional. Todas as escolhas da nossa vida, todas as vivências, raciocínios, pensamentos e proximidades têm por base essa coisa fácil de entender a que eu chamo de <<Afinismo>>.”
Minha querida amiga Berta, fico com a esperança que tenhas gostado da minha teoria universal. Por hoje despeço-me satisfeito com o facto de te a ter transmitido. Recebe um beijo deste teu grande amigo, sempre ao dispor,
Espero que esta carta tenha a sorte de te encontrar fina e de bem contigo própria. Sabes, fazem-me falta as nossas caminhadas pelas ruas, em que a nossa amizade e cumplicidade se sentia perfeitamente no calor das conversas, É isso que tenho estado a tentar fazer com o leitor das Confissões. Preciso de cumplicidade para me sentir à vontade para poder dialogar ou, neste caso, monologar. Não tem sido, por certo, um <<Sermão de Santo António aos Peixes>>, mas que tem de haver companheirismo solidário parece-me algo bem evidente. Assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte VII
“Estou a tentar criar laços entre nós. Afinidades que nos tornem mais próximos e te levem mais facilmente a simpatizar comigo. A ideia pode parecer complicada, numa análise superficial, mas entende-se perfeitamente depois de devidamente explicada.
Porque é que procuro uma melhor relação de proximidade contigo, caro leitor? É simples, muito do que te direi nos próximos capítulos começa a tornar-se mais do que algo de sério, talvez alguma coisa parecida com partilha de pensamentos e sentimentos. Ora, nada é mais íntimo do que aquilo que cada um de nós pensa e sente e isso, para ser partilhado exige, pelo menos, uma certa atmosfera de cumplicidade entre nós os 2. Leitor e escritor.
Em resumo estou a tentar pôr-te à vontade e ao mesmo tempo a tornar-te simpatizante e cúmplice das minhas causas. É, aliás, esse grau de intimidade, que espero sinceramente que se esteja a desenvolver entre nós, pois que me permitirá, mais à frente, revelar algumas coisas possivelmente chocantes ou outras apenas fora da caixa que te levarão a entender porque é que a minha vida tem esta desagradável componente de cinismo experiente ou ironia latente ou ainda, simplesmente, esse algo que te faz pensar que eu sou doido varrido e que não passo de um Haragano, um vagabundo ermita, meio selvagem e indomável neste mundo que se quer politicamente correto.
Assim sendo, peço o devido desconto pela forma simplista, descoordenada, aparentemente sem propósito, como se estão a desenvolver estes dois primeiros capítulos. Mas preciso que fiques com a noção que eu sou gente de bem, um daqueles para quem <<todas as pessoas são basicamente boas à partida e até prova em contrário>>. Ora isto, pese embora algum <<brejeirismo>> nestes preâmbulos, faz de mim uma pessoa alegre, feliz e realizada.
Aliás, sou tão feliz que, fazendo um parêntesis ainda mais dilatado, posso mesmo afirmar que sou a pessoa mais feliz que conheço. Porém, acredita que estou convicto que o humano é, na sua essência de ente solidário, amigo do seu amigo, enquanto membro participativo e atuante da nossa evoluída sociedade.
Contudo, e porque sou genuinamente assim, não abandonarei o humor nos próximos desenvolvimentos, nem irei deixar cair este tom menos sério com que até aqui tenho encarado toda esta preleção. Posso é adiantar, para não te deixar demasiadamente em suspense, que falarei de <<afinismos>> e de capacidades ou talentos não muito visíveis no nosso dia a dia. Mas pronto, lá chegarei. Contudo, e porque já me conheces um pouco melhor, pode ser que, em vez disso, mude de ideias, aguçando a ironia e a sátira ou até, em momentos que se justifiquem, lhe junte mesmo alguma boa dose de sarcasmo.”
Pronto, querida Berta, agora que já disse ao leitor aquilo que lhe queria explicar, ou seja, que pode esperar tudo de mim e o seu contrário, já me posso despedir de ti, com o beijo sorridente e maroto do costume. Despede-se este eterno amigo,
Fico satisfeito por teres achado graça à adivinha de ontem. Afinal, mesmo no teu caso que já conhecias as quadras, a explicação do tipo de ambiente em que devem ser declamadas fez-te sorrir de novo. Todavia, escusas de agradecer porque, a haver alguém que tenha de agradecer, sou por certo eu.
Quanto às minhas Confissões, que te têm agradado, aqui segue mais um pouquinho, mais curto do que o costume para não interromper pensamentos ou explicações a meio, pois acho que fica horrível. Assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte VI
“Alguns riem-se logo outros ficam sem saber muito bem o que dizer. E é nesse momento que se repete devagar a adivinha deixando que os ouvintes, que já sabem a resposta, visualizem cada verso. Desta vez no verso final já não se faz pausa. Pronto, está criado um momento agradável, deu-se nas vistas, não se ofendeu ninguém e por uns instantes fomos o verdadeiro foco de atenção. Agora só têm que se manter ativamente participantes na conversa para continuarem a ter audiência. Simples, não?
Este tipo de desbloqueador de conversa, como se dizia antigamente no programa <<Pão com Manteiga>>, costuma surtir excelentes efeitos. Tenho outro do género que termina com uma jogada de golfe e que fala de pau e bolas, mas é quiçá um pouco mais grosseiro. Vou ficar só pelo primeiro.
Por esta altura tu, que me lês, deves estar a pensar que este livro é muito brejeiro (peço desculpa do uso e do tratamento mais íntimo, por tu, mas é mais afável e fácil de criarmos uma relação de proximidade). De que estavas à espera? Por acaso julgavas que isto era uma coisa mais séria? E agora que já começaste, meu simpático leitor, achas que um livro deste género não teria qualquer hipótese num concurso literário sério. Só que o facto de tu me estares a ler não faz do livro candidato a qualquer concurso, quanto mais literário. Mas eu tenho uma explicação que julgo justificar estes primeiros capítulos, se tiveres a paciência de a leres.”
Não me vou adiantar mais no capítulo, por hoje, pois quero que leias a próxima parte seguida e numa só carta, pelo menos a parte que se segue. Não ficas zangada, minha querida amiga? Espero que não.
As minhas Confissões em Português não são muito longas, até porque não sou pessoa de escrever capítulos intermináveis. Está série que agora te escrevo não ultrapassa sequer a dezena e meia de cartas.
Despeço-me com o usual, que de banal nada tem, beijo diário, com votos de um restante dia bem brilhante para ti, fica-te com as saudades deste teu amigo,
Ontem terminei a minha carta com uma referência ao produto intestinal do ser humano, fiquei a pensar em como a asneira, minha amiga, pode muitas vezes ser um método eficaz para desanuviar o ambiente. Por isso as memórias de hoje continuam pela mesma temática. Embora já tenhas visto um videoclipe meu apresentando o que vou descrever em seguida, desta vez apresento-te os motivos e a explicação da sua criação. Assim:
Memórias de Haragano: Confissões em Português – Parte V
“Vou agora falar nas atrevidas incursões dos intestinos no nosso quotidiano ou, como dizem os brasileiros, cotidiano, palavra que até me agrada mais por poupar letras. Aproveito a ocasião para relatar como é que eu sempre faço, naquelas alturas em que, na minha vida, tive uma companheira, para abordar a temática do peido, da bufa, do pum, do traque, do flato ou flatulência, do vento ou da ventosidade, do petardo, ou até da bomba atómica, que acabamos, mais cedo ou mais tarde, por largar na frente daquela com quem partilhamos o dia-a-dia.
A malandrice também tem um excelente papel para entabular uma conversação que parece ter dificuldade em arrancar. Deixo uma dica para os que me leem conseguirem desbloquear o ambiente e fazer rir alguns convivas numa festa onde, com uma certa descrição, lhes interesse ser mais visível. Começam por anunciar que têm uma adivinha para o grupo tentar encontrar a solução. Sempre a falar com um ar sério e compenetrado. Depois informam que se trata de uma adivinha em verso, como eram algumas das tradicionais adivinhas de salão.
E principiam (com um ar sereno, mas com um quê de sorridente):
<<QUEM É ELA...?>>
Senhora do seu nariz...
Rainha do mundo inteiro...
Dos governos a raiz,
Pelos povos paradeiro...
Cor de castanha dourada,
Macia, suave ao tato,
No formato variada,
Moldável, foto, retrato,
Imagem da criação!...
Serena, fruto fecundo,
Espalhada pelo mundo,
Em qualquer parte, no chão
Ou num parque, pela rua,
Tão completamente nua
Sem tabus ou sem receio
Descansando no passeio!
Amiga de toda a gente...
Ecologia em pessoa...
Ela é tão simplesmente?
(Chegando à questão fazem a pausa interrogativa de espera, como que a aguardar que alguém apresente a solução… após as tentativas falhadas dos convivas, que tentam a todo o custo encontrar uma resposta que rime com pessoa, concluem com um sorriso agora mais aberto):
<<- Merda pura e da boa!>>”
Não há, cara Berta, melhor forma do que esta para dar por finda uma carta. Despeço-me saudoso, com a amizade bem destacada e um até amanhã rico em saudades, com um beijo bem repimpado,