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Alegadamente

Este blog inclui os meus 4 blogs anteriores: alegadamente - Carta à Berta / plectro - Desabafos de um Vagabundo / gilcartoon - Miga, a Formiga / estro - A Minha Poesia. Para evitar problemas o conteúdo é apenas alegadamente correto.

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Carta à Berta: Século XXI - No Limiar da Pobreza

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Olá Berta,

Ontem, no Facebook, no grupo Bairro de Campo de Ourique, um membro colocou a seguinte frase numa publicação:Um País com 2,2 milhões de pessoas na pobreza isto numa população de cerca 9,8 milhões dá que pensar? Como isto é possível?”

Caso a publicação fosse apenas e só uma questão de opinião eu teria deixado passar a publicação sem dizer nada. O facto de ser eu o administrador do grupo não me leva a censurar nada do que os outros elementos pensam. Porém, o caso muda de figura em certas publicações que contém dados adulterados ou falsos, noutras que fazem apenas publicidade, naquelas que atentam contra os valores fundamentais da humanidade ou nas que fazem propaganda direta de partidos políticos em nome dos mesmos. Nesses casos, mediante a gravidade ou apago o “post” ou faço o comentário que considero devido.

No caso concreto argumentei em vários comentários o conteúdo adulterado da publicação. Para conseguir tal objetivo fui à procura dos factos. É que os dados apresentados não representam nada sem a devida fundamentação. Pelo que consegui analisar, a população do país, não estava correta, segundo o INE a população residente é de 10.295.909 habitantes, ou seja, aqueles dados apresentavam um erro de meio milhão de pessoas.

Em segundo lugar, esclareci que o estudo mais recente sobre pobreza em Portugal era da PORDATA que apontava 16,2 % da população em risco de pobreza (uma vez que esse estudo publicado já este ano se referia a 2019), ou seja, 1.667.937 pessoas. Mas referi também que a PORDATA diferencia o risco de pobreza da pobreza efetiva, ainda assim.

Mais há a dizer e aproveitando a ocasião reforço que desde 1994 a população em risco de pobreza tem vindo a diminuir todos os anos, em Portugal. Em 1994 eram 2.368.059, ou seja, daí para cá (e até 2019, data do último estudo) os habitantes em risco de pobreza diminuíram em 700.123 pessoas. Contudo, é provável que a pandemia tenha, pela primeira vez em 28 anos, causado um forte aumento do risco de pobreza, invertendo o ciclo, todavia, e até saírem os dados do CENSUS de 2021, tudo o que se possa afirmar perentoriamente sobre os números atuais é, no mínimo, prematuro.

Acresce ainda dizer, que de acordo com os dados dos estudos sobre a economia paralela em Portugal, ela abrange mais de um terço das pessoas referenciadas como estando no limiar da pobreza, ou seja, cruzando os estudos podemos concluir que, dos 1.667.937 habitantes em risco de pobreza, cerca de 700.000 vive da economia paralela, o que significa que tem rendimentos que não apresenta às finanças. E não pense que são apenas biscateiros por conta própria, só para dar uma ideia a economia paralela em Portugal em 2019 dava para financiar mais 5 orçamentos atuais da saúde, por ano.

Tal informação, tendo em conta o último estudo, feito em 2013, do Observatório de Economia e Gestão de Fraude, ultrapassa os 45 mil milhões de euros anualmente. Vale tanto como 5 bazucas europeias por ano.

Em conclusão, cruzados os dados, cerca de 9% da população do país encontra-se efetivamente nos valores de rendimento que a colocam no limiar da pobreza, o que significa que ganham menos de 6.500 euros por ano. Porém, apesar de tudo, a pandemia pode e deve ter provocado aumentos significativos nestes números, mas ainda é cedo para sequer fazer previsões das verdadeiras consequências.

Assim sendo, podemos dizer que é realmente triste a realidade de ambas as situações. Por um lado, a economia paralela a minar a riqueza do país e por outro 16,2% de uma população em risco de pobreza. Mas, embora sirva pouco de compensação, piores que nós, só na Europa, ainda temos: Sérvia, Macedónia do Norte, Montenegro, Turquia, Luxemburgo, Grécia, Croácia, Bulgária, Estónia, Lituânia, Letónia, Roménia, Reino Unido, Itália e Espanha, todos eles com níveis de risco de pobreza mais elevados que o nosso em termos percentuais. Acresce ainda que a taxa média do limiar da pobreza na Europa é de 17%, ou seja, 0,8 acima da de Portugal, tendo em conta dados oficiais de 2018.

Ora, todos estes números se devem agravar em 2021, o que não é bom para a vergonha europeia nem para a nacional, mas a seu tempo teremos elementos para analisar o caso. Resta-me recordar que não é na Europa que a situação se apresenta pior face ao resto do mundo. Com efeito, mais grave ainda é o limiar da pobreza na América do Sul onde a taxa se situa nos 33% ou nos Estados Unidos onde o problema é ainda mais significativo atingindo 43% da população.

Não vou referir os dados da Asia, Oceânia ou de África, mas posso confirmar que são muito piores que os europeus e que a Rússia também não é exemplo. Em resumo, a vergonha é mesmo mundial, minha querida Berta, e toda a gente, com responsabilidades políticas, parece assobiar para o ar, sem querer lidar com a gravidade do assunto.

No meu modesto entender a “pandemia do risco mundial de pobreza” é realmente o flagelo mais grave que no presente atinge a humanidade, seguido de perto pelo problema absurdo da falta de medidas efetivas contra as alterações climáticas no globo e tendo no terceiro lugar deste triste pódio a atual pandemia de Covid-19. Termino esta carta, depois de mais um desabafo, fazendo votos que neste século as prioridades consigam mudar. O mundo é de todos e para todos e isto devia ser uma premissa absoluta. Despeço-me com um beijo saudoso,

Gil Saraiva

 

 

 

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